Título: Dilma não vê a crise como gripe, mas uma pneumonia, afirma sindicalista
Autor: Neder, Vinicius
Fonte: O Globo, 05/08/2011, Economia, p. 23

Mantega diz que pode haver consequências, mas que país estaria preparado

BRASÍLIA. A agitação nos mercados financeiros globais elevou a tensão do governo com os rumos da economia internacional. A própria presidente Dilma Rousseff reconheceu ontem que a situação é crítica, como uma pneumonia crônica, em reunião com representantes das centrais sindicais. Após o encontro, do qual participou, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ponderou que a queda das bolsas deverá ser breve. Ele admitiu que o Brasil não está imune, mas defendeu que o país nunca esteve tão bem preparado para enfrentar uma crise.

Segundo relato do deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), o Paulinho da Força Sindical, que participou da reunião com a presidente sobre a nova política industrial, Brasil Maior, Dilma teria dito que "a situação agora não é mais de uma gripe, mas de pneumonia".

Enquanto Dilma conversava com os sindicalistas e expunha sua preocupação, a Bovespa marchava em forte queda, que chegou a ultrapassar 6%, acompanhando o movimento das principais praças financeiras internacionais. Mantega creditou o resultado ao enfraquecimento das economias dos EUA e da Europa, mas afirmou esperar que o quadro cesse em breve.

Porém, o ministro salientou que o Brasil nunca esteve tão preparado para enfrentar turbulências como agora. Segundo ele, as reservas internacionais elevadas (quase US$350 bilhões) e os instrumentos usados pela equipe econômica para contornar a crise de 2008 dão mais segurança ao país:

- Temos de ficar alertas, olhando as consequências. Mesmo o Brasil estando preparado, pode haver queda na bolsa, queda de crédito, queda de comércio, mas o Brasil enfrentará com o mínimo de danos para a economia do país.

Reunião no Peru para discutir crise global

Ele também afirmou que não acredita numa apreciação muito rápida do dólar (o chamado overshooting), após a cotação da moeda americana estar há um longo período em queda. Segundo ele, o fato de o dólar estar subindo - chegando a R$1,581 ontem - "é natural" em função das turbulências no mercado financeiro.

- É a fuga para a segurança. Mas hoje eu pergunto onde está a segurança. Não acredito em overshooting, mas em flutuação relativa do câmbio - disse o ministro.

Mantega embarcou ontem para o Peru para participar de uma reunião de ministros da economia da América do Sul. Segundo ele, os países vão discutir os riscos da crise internacional e mecanismos conjuntos de defesa caso haja uma fuga de capitais da região. Também serão debatidas medidas para proteger os mercados locais da invasão de produtos importados.

O presidente do Banco Central (BC), Alexandre Tombini, também afirmou ontem que, caso haja um grande choque internacional, o Brasil está pronto para usar suas reservas internacionais, atualmente em quase US$350 bilhões, para garantir a oferta de crédito na economia doméstica, especialmente financiamento aos exportadores. A medida foi adotada no momento mais agudo da crise financeira de 2008.

- Num agravamento da crise, podemos utilizar as reservas de forma a prover recursos em reais para que a economia continue funcionando, por um lado. E, por outro, em havendo um choque internacional, temos a liquidez em dólar para, por exemplo, financiar o comércio exterior nesse período mais complexo - afirmou Tombini, durante entrevista ao programa "Bom Dia Ministro", da Radiobrás.

Ele disse também que a autoridade monetária está pronta para tomar medidas para conter uma valorização muito excessiva do real, como efeito do aumento do fluxo de capitais para o Brasil. Com as economias ricas desacelerando, o país torna-se cada vez mais atraente aos investidores internacionais, pressionando a cotação do dólar, já em seus níveis mais baixos em 12 anos.

Tombini diz que não hesitará em esfriar a economia

O presidente do BC disse que as turbulências podem travar o crescimento global - que "não terá uma evolução tão vibrante como se supunha no início do ano". Isso tiraria a pressão adicional sobre o preço das commodities, apesar da demanda dos emergentes (China, Índia e o próprio Brasil). Segundo ele, só o simples fato de as cotações permanecerem nos atuais níveis já teria efeito benéfico sobre o combate à inflação:

- Não vemos inflação de commodities como vimos ocorrer no segundo semestre de 2010. Isso nos ajuda no combate à inflação neste ano.

Mas, reconheceu Tombini, a perda de fôlego das cotações internacionais de produtos básicos é ruim porque diminuem as oportunidades para o comércio exterior brasileiro.

O presidente do BC afirmou ainda que apesar de moderado, o crédito ainda cresce de forma "forte" e o mercado de trabalho continua aquecido. Tombini disse que não hesitará em tomar novas medidas para esfriar o ritmo da economia nacional.