Título: Proibição em área de sombra
Autor: Gerbase, Fabíola
Fonte: O Globo, 05/08/2011, Rio, p. 14
Apesar do aumento das `saidinhas¿, lei que veta o uso de celular em bancos não é cumprida
UMA CLIENTE fala ao celular numa agência bancária do Catete: o uso do aparelho está proibido por lei desde abril
CELULARES SÃO usados por clientes dentro de agências no Centro (à esquerda) e em Botafogo
fabiola.gerbase@oglobo.com.br
Em vigor há exatos quatro meses, a lei estadual que proíbe o uso de celulares dentro de bancos não pegou. Em 16 de 20 agências bancárias visitadas pelo GLOBO em Copacabana, Centro, Botafogo, Flamengo e Catete, foi possível observar clientes falando ao telefone sem serem incomodados, às vezes ao lado de avisos advertindo sobre a restrição. A lei pretende evitar a troca de informações entre assaltantes que praticam as chamadas ¿saidinhas¿ de banco, quando o cliente é roubado depois de sacar o dinheiro. Mas a incidência do crime no estado, em vez de cair, tem subido. Numa comparação entre os trimestres de abril a junho de 2010 com 2011, o registro de ¿saidinhas¿ passou de 400 para 532, um aumento de 33%, segundo dados do Instituto de Segurança Pública (ISP).
Nem sempre cartazes exibidos
A lei 5.939/2011, de autoria do deputado estadual Domingos Brazão, estende aos bancários a proibição do uso de celulares, radiotransmissores e equipamentos similares. Ela determina que funcionários e vigilantes fiquem responsáveis por coibir o uso dos aparelhos e que a proibição seja anunciada em cartazes. Mas, em dois bancos visitados, o mau exemplo vinha dos próprios funcionários. Numa agência na Rua Santa Clara, em Copacabana, uma representante da área de seguros sacou o celular para conversar. A mesma situação foi observada com uma gerente numa agência da Rua Voluntários da Pátria, em Botafogo.
Em cinco dos 20 bancos visitados, não havia sequer cartazes alertando sobre a proibição, como manda a lei.
A vista grossa ao celular é maior nas áreas que abrigam os caixas eletrônicos. Nas quatro agências em que houve restrição ao uso do celular, o pedido para interromper a ligação aconteceu na área dos caixas principais. Ao mesmo tempo, o caso mais flagrante de displicência dos funcionários na tarefa de coibir os telefonemas ocorreu nessa área: um cliente falava ao celular enquanto era atendido por um caixa numa agência em Botafogo.
Até vigilante foi visto falando ao celular. A conversa, ocorrida numa agência na Rua Siqueira Campos, em Copacabana, foi explicada como uma comunicação com outra área do banco.
Para o advogado Ricardo Carvalho, usuário de agências no Centro, é importante ter funcionários específicos para coibir o uso de celulares:
¿ Vi há pouco uma moça deixando o caixa com dinheiro e procurando um canto para esconder as notas. Essa lei pode ajudar muito, se for mais difundida. O problema é que os vigias têm muito a observar no banco.
O acúmulo de funções para os vigilantes previsto na lei é o maior obstáculo para que ela tenha resultados, na opinião do presidente do Sindicato das Empresas de Segurança Privada do Estado do, Frederico Crim Câmara:
¿ Os vigias não podem ficar percorrendo o banco para ver se há alguém falando ao celular. Agências grandes chegam a ter 300 pessoas. Se é para impedir as ligações, a única maneira é fazer os bancos orientarem os clientes a deixar o aparelho na entrada e pegá-lo na saída. No atual contexto, os vigias só podem proibir ligações se forem orientados. E a Febraban (Federação Brasileira de Bancos) não passou essa recomendação aos bancos do estado.
A Febraban, por meio de nota, informou que é favorável à lei e que orienta os bancos a esclarecerem seus clientes sobre a importância de não usar o celular nas agências. A federação lembrou, no entanto, que, se um cliente insiste em fazer ligações, as instituições não têm poder de polícia para proibir ou apreender o celular.
Mesmo quando há orientação para coibir os telefonemas, nem sempre está claro como o controle deve ser feito. Um vigilante de uma agência na Avenida Presidente Vargas, no Centro, chamava atenção de quem usasse o celular na área que fica depois da porta giratória, mas liberava a conversa para quem estava na área dos caixas eletrônicos. Perguntado sobre a diferença de conduta, ele ficou confuso:
¿ Acho que só tem problema lá dentro, depois da porta.
O autor da lei lamenta que não haja mais apoio à legislação e cobra fiscalização da Secretaria estadual de Segurança Pública:
¿ A secretaria deveria ajudar a cobrar o cumprimento da lei. Os bancos e o sindicato alegam que os vigilantes não querem essa tarefa. Mas, se há um assalto, eles não têm que agir?
Sobre o descumprimento da lei, a secretaria se limitou a comentar que a vigilância nos bancos não é atribuição da segurança estadual. Sanções aos bancos que não exibem cartazes sobre a proibição ou não coíbem as ligações, segundo Domingos Brazão, dependem da regulamentação da lei.