Título: Taxe alimentos prejudiciais e subsidie os bons
Autor:
Fonte: O Globo, 05/08/2011, Opinião, p. 6

O que será preciso para mudar os hábitos alimentares dos americanos? A necessidade é indiscutível uma vez que doenças cardíacas, diabetes e câncer são em grande parte causados pela Dieta Padrão Americana. Embora especialistas recomendem cada vez mais uma dieta rica em vegetais e pobre em produtos animais e alimentos industrializados, a nossa é o oposto disso. Quase não há desacordo de que mudar isso melhoraria nossa saúde e pouparia dezenas de milhões de vidas. Uma dieta sã poderia poupar centenas de bilhões de dólares em gastos com assistência médica.

Ainda assim, a indústria alimentícia parece incapaz de oferecer alimentos mais saudáveis. Sua missão não é a saúde pública, mas o lucro. Assim, eles continuarão fazendo o de sempre, até que o mercado ou outra força mude as coisas. A ¿outra força¿ deveria ser o governo federal, em seu papel de agente do bem comum, estabelecendo um ousado padrão nacional. Em vez de subsidiar a produção de alimentos prejudiciais à saúde, deveríamos virar a mesa e criar impostos sobre refrigerantes, batatas fritas, guloseimas e aperitivos hiperprocessados. A renda resultante seria destinada a um programa que estimulasse a alimentação sadia dos americanos, ao tornar comida saudável mais barata e amplamente disponível.

O americano médio consome 170 litros de refrigerantes por ano e isso não inclui bebidas adoçadas sem gás, o que acrescenta 64 litros por pessoa por ano. Bebidas açucaradas poderiam pagar imposto de 2 centavos de dólar por onça (28,7 gramas), de modo que um pacote com seis Pepsis custaria mais US$1,44 do que hoje. Uma taxação na batata frita poderia ser de 50 centavos por porção; 25 centavos a mais por guloseimas como sonho. Refrigerantes dietéticos não seriam taxados.

Simples assim: o imposto reduziria o consumo de alimentos prejudiciais e geraria bilhões de dólares por ano. O dinheiro seria usado para subsidiar a compra de alimentos como verduras, legumes, grãos, legumes desidratados e frutas. Poderíamos vender esses alimentos a preços menores ¿ digamos 50 centavos de dólar a onça (28,7 gramas) ¿ e em todo lugar, de lojas de conveniência a centros comunitários.

O programa, obviamente, preocuparia a indústria de alimentos. Também poderia desagradar aos que teriam que pagar mais por refrigerantes e batatas fritas e que sustentam que isso violaria seu direito de comer o que bem entendem. Mas saúde pública é responsabilidade do governo e nossa dieta está no mesmo nível de outras responsabilidades públicas, como tratamento da água e transporte de massa.

Alguns defensores dos pobres dizem que essa taxação seria injusta porque pessoas de baixa renda teriam de gastar uma percentagem maior de seu dinheiro em alimentação e teriam mais dificuldade em comprar refrigerante ou junk food. Mas, uma vez que os pobres têm mais dificuldade para comprar alimentos frescos de alta qualidade, subsidiá-los seria benéfico para eles.

Fritas e Coca-Cola são um lanche comum. Mas, como a taxa de diabete continua em alta ¿ um terço dos americanos tem a doença ou está pré-diabético, a maioria com o tipo 2, associado a maus hábitos alimentares ¿ e como nossos gastos médicos estão prestes a se tornar um caso insolúvel, a questão é tão urgente para a saúde das pessoas como para a saúde econômica.

Pelo menos 30 cidades e estados estudam taxar refrigerantes e bebidas que contêm açúcar ¿ um alvo lógico: das 278 calorias adicionais que os americanos consumiram por dia, em média, entre 1977 e 2001, refrigerantes e outras bebidas, como Red Bull e Gatorade, responderam por mais de 40%.

¿Impostos têm a vantagem de aparecer no preço do produto na prateleira, que é onde os consumidores tomam suas decisões¿, diz Lisa Powell, da Universidade de Illinois. Segundo especialistas, impostos começam a fazer diferença a partir de um centavo de dólar por onça (28,7 gramas), quando três coisas muito boas devem acontecer: o consumo de bebidas açucaradas deve cair; da mesma forma a incidência de doenças e, em consequência, os gastos públicos com a saúde; e dinheiro seria levantado para outros usos.

Atualmente, em vez de taxar refrigerantes e outros alimentos prejudiciais, nós os subsidiamos! Subsídios diretos para fazendeiros para culturas como milho (usado, por exemplo, para fazer o ubíquo xarope de milho, com alto teor de frutose) e soja (óleo vegetal) mantêm os preços de alimentos e bebidas artificialmente baixos. Há subsídios indiretos, porque os preços de junk food não refletem os custos de reparar nossa saúde e o ambiente.

Os esforços para mudar a dieta nacional falharam porque campanhas educacionais não são páreo para o dinheiro investido em marketing para vender os produtos que são piores para nós. Somente a indústria de fast-food gastou mais de US$4 bilhões em marketing em 2009. O Departamento (ministério) de Agricultura está pedindo cerca de um terço de um ponto percentual disso para 2012: US$13 milhões. Como resultado, o percentual de adultos obesos mais do que dobrou nos últimos 30 anos; o percentual de crianças obesas triplicou. Comemos perto de 10% mais produtos animais do que fazíamos há uma geração ou duas atrás, e embora possa haver vantagem em comer pelo menos alguns produtos de origem animal, nós poderíamos talvez viver com um consumo reduzido de cheeseburger triplo com bacon.

Custos médicos associados à obesidade devem alcançar US$344 bilhões em 2018 ¿ com 60% deles recaindo sobre o governo federal. Para atacar esse problema, existe um precedente: o caso do fumo. O histórico acordo de 1998 com os estados, no qual as fabricantes de cigarros concordaram em limitar suas ações de marketing e financiar esforços contra o fumo, ficou longe da perfeição. Mas os resultados são impressionantes: mais da metade dos americanos que fumavam deixou de fazê-lo e a taxa de fumantes recuou aos níveis dos anos 60.

Um estudo de Y. Claire Wang, professora da Columbia Mailman School of Public Health, antecipou que uma taxa de um centavo por 28,7 gramas sobre refrigerantes no estado de Nova York pouparia US$3 bilhões em gastos médicos ao longo de uma década, evitaria algo como 37 mil novos casos de diabete e levantaria US$1 bilhão por ano. Se dotada em escala nacional, geraria uma renda de US$13 bilhões anuais, com uma queda do consumo de 24%. Uma alta de 20% no preço dos refrigerantes poderia resultar numa queda de 20% no consumo, o que na próxima década evitaria que 1,5 milhão de americanos fiquem obesos e prevenir 400 mil novos casos de diabete, com uma economia de US$30 bilhões.

MARK BITTMAN é especialista em alimentos e escreve no ¿New York Times¿