Título: Poeira mortal
Autor: Baima, Cesar
Fonte: O Globo, 27/07/2011, Ciência, p. 32

Estudo avaliará qualidade do ar no Rio e SP após redução no teor de enxofre do diesel

Ela é praticamente invisível, mas responde por boa parte dos problemas respiratórios sofri dos pela população de grandes cidades. Saída das chaminés de fábricas e usinas, dos escapamentos de carros movidos a gasolina e álcool e, principalmente, de ônibus e caminhões a diesel, uma poeira mortal, também conhecida como material particulado, invade os pulmões, levando com ela compostos tóxicos que causam lesões no organismo.

Entre 2004 e 2005, um grupo liderado por José Marcos Godoy, professor do Departamento de Química da Pontifícia Universidade Católica do Rio (PUC-Rio), realizou o primeiro levantamento que buscou identificar as fontes desta poeira. No mês que vem, Godoy volta a campo para repetir a experiência, que também será feita em São Paulo, a cargo do Instituto de Física da USP. Financiado pela Petrobras, o projeto visa verificar se houve alguma melhoria desde que a empresa passou a fornecer diesel com 50 partes por milhão (ppm) de enxofre para a frota de ônibus da cidade, no início de 2009. Até então, o combustível utilizado tinha dez vezes mais enxofre, um dos grandes vilões da poluição por material particulado.

Análise feita em dez pontos do Rio

No levantamento original, realizado em dez pontos do Rio e publicado em 2009 no periódico científico "Atmospheric Environment", Godoy constatou que a queima de óleo combustível, notadamente o diesel, respondeu por entre 30% e 40% do material particulado em sua chamada fração fina, isto é, com um perfil aerodinâmico menor que 2,5 micras (milésimo de milímetro). Devido ao tamanho reduzido, estas partículas podem atingir os alvéolos pulmonares, permanecendo por mais tempo no corpo e causando muitos problemas. Na mesma fração fina, as partículas em suspensão vindas do solo representaram entre 30% e 50% do total; enquanto as vindas do tráfego de veículos leves movidos a gasolina e álcool ficaram entre 20% e 30%; e o aerossol marinho (maresia), em menos de 5%.

- Nossa grande preocupação é o enxofre, um dos componentes principais dos chamados compostos aerossóis secundários, ou sulfatos - conta Godoy. - Eles respondem por boa parte da fração fina do material particulado e atingem diretamente o pulmão. Além disso, a relação entre os sulfatos e as doenças respiratórias já foram bem estabelecidas na literatura científica.

Antes de medir a poeira no ar do Rio e de São Paulo, o novo projeto vai identificar a "assinatura" do diesel brasileiro. Isso porque o primeiro levantamento calculou as proporções separando as partículas com base em marcadores químicos registrados em estudos internacionais.

- Estamos recomeçando praticamente do zero - diz o professor da PUC-Rio. - Nossos motores, combustíveis e condições climáticas são diferentes e os marcadores que usamos no outro estudo podem não ser necessariamente os mais corretos. Então, primeiro temos que identificar quais são os melhores marcadores para o caso do Brasil.

Apesar da preocupação, o Rio não sofre tanto com o problema da poluição por material particulado como São Paulo e outras cidades. Graças à proximidade com o oceano, a circulação atmosférica é maior, ajudando na dispersão da poeira. A recomendação da Organização Mundial de Saúde (OMS) é de que a concentração de partículas finas não passe de 10 microgramas por metro cúbico na média anual, com um máximo diário de 25 microgramas. Já para as partículas com menos de dez micra de diâmetro, ela é de 50 microgramas, com máximas episódicas de 150 microgramas. Instituído pela Prefeitura no ano passado, o programa Monitor-Ar Rio conta com quatro estações fixas e uma móvel que constantemente avaliam a qualidade do ar da cidade nesta fração maior, tendo registrado uma máxima de 40 microgramas em Copacabana ontem.

- À luz da nossa legislação e da recomendação atual da OMS, podemos dizer que é uma boa qualidade do ar, mas reduzir esses valores é sempre melhor - defende Godoy, destacando que a OMS em breve deverá diminuir os limites para as partículas de dez micra de 50 para 20 microgramas na média anual e de 150 para 50 nas máximas diárias.

Previsto para durar dois anos e meio, o novo estudo terá seu modelo apresentado durante a 2ª Conferência da Associação Brasileira de Pesquisa em Aerossol, que acontece no campus da PUC-Rio a partir da semana que vem. Segundo Godoy, a ideia é aproveitar a presença de especialistas nacionais e internacionais no assunto para montar um time de consultores que deverá retornar ao Rio daqui a um ano para avaliar sua condução.

- Achamos que é importante ter uma validação externa do que estamos realizando - diz.