Título: Escritório de filho de ministro do TCU defende ONG suspeita
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Fonte: O Globo, 12/08/2011, O País, p. 3

Relatório da PF afirma que advogados tiveram acesso prévio à acusação

BRASÍLIA. O escritório do advogado Tiago Cedraz, filho do ministro do Tribunal de Contas da União (TCU) Aroldo Cedraz, atua em dezenas de processos no órgão de controle. Embora Tiago não figure como representante nos casos em tramitação, a empresa tem outros profissionais escalados para defender os interesses de clientes em casos envolvendo irregularidades em contas de diversas pastas, além do Ministério do Turismo.

No relatório da Operação Voucher, que levou à prisão de 36 pessoas ligadas ao Turismo, a Polícia Federal sustenta que o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável (Ibrasi), acusado de desviar verbas de um convênio, contratou o escritório Cedraz e Tourinho Dantas, de Tiago, para se resguardar de uma decisão "prejudicial" e teve acesso privilegiado a dados de investigação do TCU. Os advogados teriam acessado o relatório técnico do tribunal antes de serem citados para apresentar a defesa.

Em conversas gravadas, segundo a PF, o sócio de Tiago, Romildo Olgo Peixoto Júnior, relatou ao diretor-executivo da ONG, Luiz Gustavo Machado: "Bom , quanto ao tribunal, sabemos tudo o que está se passando".

Atuação em 30 casos no TCU

Além dos processos do Ibrasi, Romildo e outros três advogados do escritório - Diego Ricardo Marques, Marcos Araújo Cavalcanti e Thiago Groszewiks Brito - atuam em cerca de 30 casos, segundo o sistema eletrônico de informações do TCU, referentes a verbas dos ministérios do Trabalho e Integração Nacional, além de órgãos como a Fundação Nacional da Saúde (Funasa) e o Comitê Olímpico Brasileiro (COB). Num deles, sobre o Turismo, representam a empresa Clip e Cliping Comunicação em processo para apurar supostas irregularidades em licitações.

Há casos em que Aroldo Cedraz já figurou como relator do processo, como na análise de contas de convênio do Ministério do Trabalho. O TCU sustenta, contudo, que o ministro se declarou impedido, após o início da atuação dos advogados do escritório. Segundo a assessoria de imprensa do órgão, ele tem se retirado de todas as situações semelhantes e não participa das votações em plenário. O órgão de controle informa seguir o Código do Processo Civil, que prevê o afastamento do responsável pelo julgamento quando há possibilidade de conflito de interesse.

Anteontem, o plenário do tribunal suspendeu convênio de R$5,5 milhões do Ministério do Turismo com o Ibrasi em processo no qual atua o escritório de Tiago. Na sessão, Cedraz não se declarou impedido em voz alta e publicamente, como é de praxe entre os ministros. Ontem, o TCU informou que, na sessão, ele comunicou o impedimento a um auxiliar.

O escritório divulgou nota ontem, informando que exerceu a defesa e o contraditório do Ibrasi, observando a "melhor técnica e o mais absoluto compromisso profissional". O contrato assinado com a entidade foi anexado ao texto divulgado à imprensa, mas não aparecem a assinatura e o nome do signatário pela banca de advogados. Sobre a atuação em outros processos, o escritório não se pronunciou até o fechamento desta edição.

Na nota, o escritório informou que, embora "sem inibição legal", Tiago não representa empresas no TCU. A respeito do Ibrasi, negou acesso antecipado a informações. A banca alegou que solicitou vista e cópia do processo em 13 de maio, e protocolou cópia escrita do pedido quatro dias depois. A manifestação dos analistas do TCU foi juntada ao processo no dia 23 de maio de 2011. "Observando as datas acima e levando em consideração que já corria o prazo para defesa do cliente, nada mais normal e corriqueiro que no dia 27 de maio de 2011 os advogados já tivessem ciência dos apontamentos", afirma o comunicado.

O escritório Cedraz e Tourinho Dantas ressaltou que não é investigado pela PF, assim como Romildo. E criticou a atuação dos investigadores. "O escritório, neste ato, repudia, com veemência, o juízo de valor colocado na decisão da autoridade judiciária e no relatório subscrito pela autoridade policial. Tais imputações mostram-se absolutamente carentes de qualquer comprovação documental, tomando por base interpretações de trechos avulsos de conversas de algumas pessoas investigadas (...) Tal prática, já banalizada no país, será combatida pelo escritório com as medidas administrativas, cíveis e penais em face daqueles que subscrevem a decisão e o relatório", acrescenta.