Título: Caça às bruxas na Receita
Autor: Bancillon, Deco
Fonte: Correio Braziliense, 22/08/2009, Economia, p. 18

Em retaliação a Lina Vieira, Mantega exonera três técnicos do Fisco e indica que as demissões estão apenas no começo

Henrique Jorge, subscretário de Fiscalização, era homem de confiança da ex-comandante do órgão

Daniel Ferreira/CB/D.A Press - 18/5/09 Marcelo Lettieri, coordenador de Estudos, é suspeito de ter auxiliado Lina durante audiência no Senado

Está aberta a temporada de caça às bruxas na Receita Federal. Em um processo de realinhamento de forças que promete durar por mais um ou dois meses, três pessoas perderam seus cargos dentro do órgão. A exoneração deverá acontecer nos próximos dias. Os técnicos, todos ligados à ex-secretária Lina Vieira, já foram comunicados das demissões.

O aviso aos servidores foi dado pelo atual secretário, Otacílio Cartaxo, na noite de quinta-feira durante uma reunião marcada a toque de caixa: Henrique Jorge Freitas, subsecretário de Fiscalização; Marcelo Lettieri, coordenador-geral de Estudos; e Alberto Amadei, assessor especial do gabinete, foram alvos de críticas indiretas disparadas pelo Palácio do Planalto a partir do depoimento de Lina no Senado, na terça-feira. Os estrategistas do governo recomendaram as trocas como forma de dar estabilidade à administração Cartaxo.

O próximo passo será trocar os superintendentes do Fisco nos estados. ¿Algumas pessoas foram alertadas de que vão perder os cargos. As demissões vão continuar¿, disse um técnico da Receita. Cerca de 50 postos são considerados estratégicos. Durante os 11 meses em que esteve à frente da Receita, Lina Vieira remanejou quase todos, criando uma espécie de rede protetora fortemente identificada com sua filosofia de trabalho. Os ocupantes desses cargos estão agora sob ataque e deverão, gradativamente, ser substituídos.

Retaliação A saída dos três auditores-fiscais teria sido uma retaliação do ministro da Fazenda, Guido Mantega, à Lina Vieira. ¿Isso é o que deve ter pesado, porque eles não tinham nada que a acompanhar a audiência pública no Senado¿, disse uma fonte da Receita, referindo-se à suposta participação do trio na elaboração de parte do discurso da ex-secretária aos senadores. Uma funcionária administrativa da Receita disse que o clima está insustentável. ¿Todo dia tem uma bomba aqui. Um dia é o motorista, agora isso¿, reclamou.

O motorista de Lina Vieira na Receita Federal, Warley Soares, pediu demissão na segunda-feira passada. Funcionário de uma empresa terceirizada, o rapaz confirmou ter levado a ex-secretária várias vezes a ministérios e ao Palácio do Planalto. Amigos do ex-motorista disseram ao Correio que Warley está incomodado de ter virado o ¿centro das atenções¿. Em seu depoimento no Senado, Lina Vieira confirmou ter ido à Casa Civil a pedido da ministra Dilma Rousseff, de quem ouviu a recomendação para que ¿agilizasse¿ as investigações tributárias que envolvem as empresas da família Sarney. Dilma, no entanto, nega o ocorrido.

Procurada pelo Correio, a Receita Federal não confirmou que os três servidores tenham perdido o cargo. Henrique Jorge e Alberto Amadei teriam, conforme órgão, comparecido ao trabalho ontem. Marcelo Lettieri, segundo informou o Fisco, não cumpriu expediente e apresentou atestado médico.

R$ 36 bi para o BNDES

O Tesouro Nacional assinou ontem a liberação da última parcela do empréstimo feito ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), de R$ 36 bilhões, que tem sofrido com a falta de recursos para bancar projetos, sobretudo os da Petrobras, cujos planos de investimentos até 2013 estão estimados em R$ 330 bilhões. Durante toda sexta-feira, técnicos da área financeira da instituição e servidores do Ministério da Fazenda estiveram reunidos em Brasília a fim de dar a modelagem final da operação. Até julho, o Tesouro havia repassado R$ 64 bilhões em títulos públicos ao banco, mais de dois terço do aumento da dívida pública interna no período, de R$ 85 bilhões. Ao socorrer o BNDES e, indiretamente, a Petrobras, o governo quer garantir a execução de parte importante do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) em 2010, ano de eleições presidenciais. Quase 40% dos projetos contidos no programa de infraestrutura são tocados pela estatal. A petrolífera sofreu um baque no seu caixa com a escassez de crédito provocada pela crise internacional. O banco estatal repassará o dinheiro à Petrobras a taxas de juros menores que as dos bancos privados. A estratégia do governo é aumentar a fatia das instituições financeiras estatais no mercado de crédito e, com isso, forçar os conglomerados financeiros privados a reduzirem o spread (diferença entre o custo da captação e o dos empréstimos feitos a clientes) e aumentar a oferta de financiamentos, especialmente ao setor produtivo. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, disse que, se não aumentarem a participação nesse mercado, os bancos privados vão ¿comer poeira dos bancos públicos¿. (DB)

Fiscais chefiavam quadrilha

» A Procuradoria da República e a Polícia Federal desmontaram ontem uma quadrilha que agia no comércio exterior com a ajuda dos irmãos João Luiz e José Augusto Fregonazzi. Os dois são auditores fiscais da Receita Federal. Na operação foram feitas 18 das 19 prisões decretadas e cumpridos 40 mandados de busca e apreensão em Vitória, em diversos municípios capixabas e em São Paulo.Os dois irmãos auditores, ainda conforme as investigações, criaram cinco empresas em nome de laranjas. Mesmo sendo servidores, eles prestavam consultoria tributária e fiscal para empresas como a Target Importação, Exportação Ltda, com sede em São Paulo e filial em Vitória. Embora a investigação fosse em torno dos auditores e de empresas do comércio exterior, a polícia esbarrou em um esquema de combinação de preços entre empresas para uma licitação, pela qual a Prefeitura de Anchieta, no litoral sul capixaba, contrataria uma consultoria jurídica.