Título: Serviços não dão trégua
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 20/08/2011, Economia, p. 29

IPCA-15 sobe para 0,27% e, em 12 meses, bate 7,10%, a maior taxa desde 2005

Aesperada trégua na inflação, em resposta à crise nos EUA e na Europa, pode não trazer alívio nos preços dos serviços ofertados às famílias brasileiras. Uma pressão que, mais uma vez, apareceu no Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo-15 (IPCA-15) - que chega em agosto com variação de 0,27%, ficando acima das expectativas do mercado. O índice medido pelo IBGE divulgado ontem é uma prévia da taxa oficial de inflação. Neste mês, os preços da refeição em restaurante, fortemente influenciados pelos serviços, tiveram a maior contribuição para a taxa de agosto, respondendo por 15% do índice.

A inflação de serviços está, portanto, no centro do debate da política monetária. Subiram de patamar, juntamente com a renda dos brasileiros, os valores cobrados em salões de beleza, estacionamentos, oficinas, academias, médicos... Preços que vão e dificilmente voltam - ao contrário do que se observa nos alimentos que podem ficar mais baratos em resposta à safra, demanda mundial ou consumo. Neste mês, a inflação de serviços ficou em 0,46% - quase o dobro da inflação geral. Em 12 meses, encareceram 8,85%, e isso sem considerar os preços da alimentação fora de casa, que também embute serviços. No índice cheio, a inflação acumulada no período está em 7,10%, a maior desde junho de 2005.

- Apesar da desaceleração da economia, os serviços, cerca de 25% da inflação, continuam com preços em alta. Isso se dá por causa do aumento de renda dos brasileiros que permitiu a entrada de milhões de pessoas na classe média. A crise externa poderia aliviar os preços dos serviços, porém, com a perspectiva do reajuste do salário mínimo em janeiro (superior a 13%) o governo dá mais fôlego às altas - disse Luis Otávio Leal, economista do ABC Brasil, que acrescenta - Some-se a isso o fato de sindicatos que reivindicam aumentos acima de 10%.

Analista prevê até dois dígitos de alta

Segundo Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, os serviços vão continuar a ser um grande risco e, no atual ritmo, entrarão na casa dos dois dígitos de alta em 2012.

- Trazer esse número para baixo será muito difícil e significará que o governo Dilma terá inflação sistematicamente acima da meta.

Com mais renda, os brasileiros gastam mais e têm acesso a novos serviços. A troca de médico ou de cabeleireiro pode ser adiada porque há mais renda disponível para o consumo - e a tolerância do consumidor tende a ser maior. Exemplos de negócios que, a despeito dos reajustes feitos, não viram o faturamento minguar são fáceis de encontrar. O Espaço Glecciano Luz, no Shopping Barra Point, reajustou a maioria dos preços em 20% no início de 2011. Segundo Glecciano, diretor do salão, o aumento se deve a investimentos em tecnologias. Uma das engenhocas responsável pelo aumento nos serviços foi a ondulação digital, máquina que, associada aos tratamentos, cria ondas nos cabelos.

- Tenho clientela que aguarda as inovações que trago da Europa e dos EUA. Os resultados são cada vez melhores e é natural que requeiram acréscimo nos preços - disse ele que, ainda assim, registou aumento de 15% no faturamento neste ano.

A inflação cheia em 12 meses, com repique de agosto, estourou mais ainda a meta do governo, subindo de 6,75% para 7,10%. O teto da meta está fixado em 6,5%. No ano, o índice acumula 4,48%.

- O resultado veio ligeiramente acima do esperado, em especial para alimentos. O cenário inflacionário não muda, e os preços devem continuar a pressionar neste ano - diz Paulo Padilha, economista da Fecomercio-RJ, acrescentando que os restaurantes tiveram aumento de custo nos últimos meses. - O segmento é bastante ligado ao mercado de trabalho, que, apesar de menos vigoroso, continua aquecido.

Houve outros movimentos de alta. O grupo alimentação e bebidas subiu 0,21% no IPCA-15, após queda de 0,39% em julho. Vários alimentos, em queda no mês anterior, ficaram mais caros em agosto. Caso do feijão carioca (de - 0,73% para 1,21%), do arroz (de -1,29% para 0,34%) e das carnes (de -1,50% para 0,52%). Segundo especialistas, os preços dos alimentos devem voltar a subir no segundo semestre. "Fim da sazonalidade benigna de alimentação deve assumir o posto de propulsor da inflação nos próximos meses", indicou relatório do Rosenberg Consultores Associados.

- Os alimentos devem manter movimento de alta, mais por questões pontuais. Ficaram mais caros alimentos com peso no orçamento das famílias. Mas a carne, por exemplo, já sinaliza uma desaceleração no mercado futuro, efeito da desaceleração global - acrescentou Padilha.

Outros itens exerceram pressão sobre o índice do mês, a exemplo do aluguel residencial, que, da variação de 0,46% de julho, passou para 1,06% em agosto. No caso dos combustíveis, o álcool subiu menos: 1,79% em julho para 1,54% em agosto. A gasolina apresentou queda bem menos significativa, indo de -1,49% para -0,17%.