Título: Vivo ou morto: US$1,7 milhão por Kadafi
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Fonte: O Globo, 25/08/2011, O Mundo, p. 32

Apesar de enfrentar resistência em Trípoli e mais duas cidades, conselho opositor promete eleições para abril

CORPOS DO lado de fora do complexo de Kadafi, em Trípoli: os combates voltaram à fortaleza do ditador num sinal de que a guerra não acabou

TRÍPOLI. Embora combates intensos ainda ocorram em Trípoli e no restante do país, o conselho rebelde mostra que tem pressa em iniciar a transição e anunciou ontem que as primeiras eleições livres da Líbia devem ocorrer em oito meses. As forças opositoras anunciaram ainda anistia para membros do círculo próximo ao ditador que capturarem ou matarem Muamar Kadafi, com um empresário líbio prometendo US$1,7 milhão por sua cabeça. Para os dois milhões de moradores de Trípoli que, em meio a combates e tiros permaneciam trancados em casa, a guerra ainda não acabou.

Os primeiros membros do conselho chegaram ontem à capital, e outros estão a caminho. Mas a resistência de tropas do ditador deve fazer com que a transferência da sede do governo rebelde só se complete na próxima semana, segundo jornalistas estrangeiros em Benghazi.

Mustafa Abdel Jalil, presidente do Conselho Nacional de Transição (CNT), disse esperar que as eleições legislativas e presidenciais ocorram em abril do próximo ano. Jalil afirmou que Kadafi deve ser julgado na Líbia, e não em corte internacional. Além disso, anunciou a anistia e a recompensa oferecida por um empresário de Benghazi - movimentos vistos como uma forma de provocar divisões internas no grupo do ditador.

- A era Kadafi acabou, mesmo que só termine realmente com a sua captura e condenação - disse Jalil. - Qualquer membro de seu círculo que matá-lo ou capturá-lo, receberá anistia ou perdão para qualquer crime que tenha cometido.

Opositores revistam hotel em busca de filho de ditador

Em uma nova mensagem de áudio, Kadafi afirmou ter andado incógnito pela capital, sem sentir que corresse perigo. Ele ainda conclamou a população:

- Todos devem estar em Trípoli. Homens jovens, homens das tribos e mulheres devem varrer Trípoli dos traidores.

Para os EUA, Kadafi ainda está na Líbia. Alguns rebeldes consideram que poderia estar mesmo em Trípoli, na área de al-Hadhba al-Khadra, onde ainda há combates. Mesmo sua fortaleza, tomada na terça-feira, ontem se viu sob fogo pesado, tanto de atiradores do alto de telhados pró-Kadafi, como de forças leais ao ditador que estariam entrincheiradas no seu centro.

Os combates também eram fortes no Hotel Corinthia, onde rebeldes buscavam Saadi - outro filho de Kadafi dado como preso no domingo, mas que ontem trocava e-mails com a rede CNN dizendo que tentava negociar um cessar-fogo com rebeldes. Já no Hotel Rixos, um grupo de mais de 30 jornalistas estrangeiros conseguiu deixar o local, após dias confinados. Os correspondentes saíram depois de uma negociação da Cruz Vermelha com dois soldados deixados para trás.

- Quando conseguimos sair, descobrimos que estávamos num pedaço de 200 metros quadrados de Trípoli onde dois atiradores acreditavam que a batalha por Trípoli continuava, enquanto o mundo havia visto a cidade cair - contou Mathew Price, correspondente da BBC.

Por outro lado, quatro jornalistas italianos foram sequestrados na região de Zawiya, a caminho de Trípoli. Segundo o Ministério do Exterior da Itália, eles teriam sido capturados por tropas de Kadafi. A batalha se estendeu às áreas de Abu Salim e al-Zuwara, onde os rebeldes conquistaram uma base militar. Segundo o porta-voz rebelde, o CNT já controlaria de 90% a 95% do país.

Estrangeiros liderariam caçada a líderes do regime

Enquanto forças leais ao ditador ainda combatem em enclaves no país, seu chanceler dava o regime por encerrado. Abdul Ati al-Obeidi disse à TV britânica Channel 4 News que o ditador teria esgotado todas as suas opções, inclusive a de negociar uma saída segura do país. Momentos depois, o coronel Khalifa Mohammed Ali, sub-chefe da inteligência líbia, anunciou apoio aos opositores - assim como o ministro da Saúde, Mohammed Hijazi.

Rumores dizem que o CNT tenta negociar em Sirta e Sabha - cidades que apoiam o ditador. A primeira já estaria em grande parte cercada. Já segunda tem importância estratégica: se Kadafi e sua família conseguirem alcançá-la, poderiam fugir para o Chade ou o Níger.

Enquanto isso, crescem as versões de que forças estrangeiras ajudaram os rebeldes. Segundo a CNN, forças especiais de Reino Unido, França, Jordânia e Qatar teriam ajudado com logística e inteligência. Já o "Evening Star" afirmou que britânicos, franceses e americanos teriam fornecido treinamento.

Equipes árabes teriam atuado em terra. No ataque ao complexo, por exemplo, estariam homens dos Emirados Árabes Unidos e do Qatar - estes teriam sido os primeiros a chegar à residência de Kadafi. Seriam homens do Golfo Pérsico, agora, que estariam liderando a caça aos líderes do regime.