Título: MST volta a invadir fazenda produtiva em SP
Autor: Barbosa, Adauri Antunes; Alencastro, Catarina
Fonte: O Globo, 23/08/2011, O País, p. 10
Famílias de sem-terra já começaram a chegar a Brasília, e amanhã movimentos farão marcha em todo o país
SÃO PAULO e BRASÍLIA. Cerca de 400 integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) invadiram ontem de manhã a Fazenda Santo Henrique, de 2,6 mil hectares, da Cutrale, uma das maiores produtoras de suco de laranja do mundo, no município de Iaras (SP), a 285 quilômetros da capital paulista. A mesma propriedade fora ocupada pelo MST em outubro de 2009.
Na ocupação de 2009, imagens gravadas de um helicóptero da Polícia Militar mostraram os sem-terra arrancando 15 mil pés de laranja com tratores; segundo os militantes, para plantar feijão e milho. A ocupação iniciada ontem, que faz parte da Jornada Nacional de Lutas dos sem-terra, reivindica a destinação da fazenda para a reforma agrária.
Incra disputa na Justiça posse de fazenda invadida
O Incra tem estudos que comprovam que a fazenda em Iaras é devoluta e disputa na Justiça a sua posse. Conforme o processo, que tramita na Justiça Federal de Ourinhos desde 2006, a área faz parte do Grupo Colonial Monção, um conjunto de fazendas comprado pela União em 1909 para projeto de colonização de mais de cem anos.
Ontem os sem-terra fizeram outras manifestações em Pernambuco, Mato Grosso do Sul e Tocantins. De acordo com o MST, a Via Campesina e outras entidades de trabalhadores rurais e urbanos, a mobilização da Jornada de Lutas tem o objetivo de pressionar o governo para atender emergencialmente mais de 180 mil famílias acampadas no país. Os movimentos pedem a revisão do modelo de concessão de crédito a pequenos agricultores e a agilização de políticas de concessão de terras.
Em Brasília, quatro mil famílias de pequenos agricultores e sem-terra começou ontem a se instalar para uma marcha, amanhã, por mais crédito e assentamentos da reforma agrária. No total, o movimento reunirá em 17 estados, segundo a Via Campesina, 50 mil famílias. Uma solução para o problema do endividamento da agricultura familiar está na pauta das reivindicações.
Líderes de diversos movimentos estão dialogando com o ministro da Secretaria Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, e esperam ser recebidos por Dilma Rousseff.
- Esperamos que esta ação possa sensibilizar o governo, que sejamos ouvidos e atendidos. Se isso não ocorrer, vamos avaliar novas pressões para lidar com o governo daqui para a frente. Queremos negociar, mas não adianta só negociar. Precisamos de uma solução. A corrupção instalada é a prova de que tem dinheiro (no governo), mas está indo para o lugar errado - disse Valdir Misnerovicz, integrante da Coordenação Nacional do MST.
Movimentos criticam modelo de crédito para camponeses
Segundo o Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA), o setor tem uma dívida de R$30 bilhões, sendo que os devedores de R$12 bilhões não têm como quitar o débito. O movimento defende uma negociação definitiva para resolver o problema, que impede que novos créditos sejam dados para o produtor continuar sua atividade. Já o Movimento Atingidos por Barragens e Hidrelétricas (MAB) afirma que o Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) exclui muitos produtores rurais necessitados.
- O modelo de crédito para os camponeses é inadequado. O Pronaf exclui grande parte dos agricultores e atende os bancos - disse Gilberto Cervinski, integrante do MAB.
Por outro lado, para resolver a questão do déficit de terra para quem não tem onde produzir, o MST calcula ser necessário R$1,5 bilhões por ano. Este ano o governo deverá investir, segundo o movimento, R$530 milhões na obtenção de terras para a reforma agrária. Como forma de pressão, o MST diz ter mantido a média de 250 ocupações por ano. Só em 2011, cem áreas já foram invadidas.
No próximo dia 24, os grupos de produtores rurais, junto com as centrais sindicais, farão um movimento para as reivindicações do campo e da cidade. Do lado urbano, entidades como CUT e Coordenação Nacional de Lutas (Conlutas) pedirão redução da jornada de trabalho e o investimento de 10% do PIB em educação. A mobilização não recebeu ajuda oficial do governo. Os camponeses que estão em Brasília vieram, segundo a Via Campesina, graças à contribuição de sindicatos e ONGs "amigas do MST".