Título: Guardando dinheiro
Autor: Beck, Martha
Fonte: O Globo, 30/08/2011, Economia, p. 23

Governo anuncia aumento do superávit primário em R$10 bilhões, a 3,2% do PIB

Às vésperas da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), que vai decidir sobre os juros básicos da economia, o governo anunciou ontem que vai economizar R$10 bilhões a mais este ano para evitar pressões inflacionárias adicionais e, com isso, abrir caminho para que o Banco Central (BC) reduza os juros mais rapidamente. Segundo o ministro da Fazenda, Guido Mantega, o esforço para o pagamento de juros da dívida pública - o chamado superávit primário, a sobra entre as receitas e despesas antes do pagamento de juros - passará dos atuais R$117,9 bilhões para R$127,9 bilhões, ficando em torno de 3,2% do Produto Interno Bruto (PIB, soma de bens e serviços produzidos no país). A meta fixada pelo governo é de 2,9% do PIB. O ministro disse que a economia será possível graças ao crescimento da arrecadação de impostos e contribuições:

- O aumento (do superávit primário) se dá para impedir o aumento de gastos correntes e para abrir mais espaço para os investimentos subirem no país. Além disso, também viabiliza, a médio e longo prazos, a redução da taxa de juros. Quando o BC entender que é possível (reduzir a taxa).

A presidente Dilma Rousseff já deixou claro para sua equipe que o crescimento econômico deve ser prioridade, especialmente num momento em que o cenário internacional está se deteriorando, com risco maior de recessão na Europa e nos Estados Unidos. Segundo assessores, Dilma está convencida de que a forma mais eficiente de garantir o PIB agora é por meio da redução dos juros, e não de mais estímulos fiscais.

- O Banco Central estará em condições de agir com política monetária mais expansionista, caso haja agravamento da crise - explicou Mantega, ao anunciar o aumento da meta de primário.

Mantega: nada a ver com o Copom

O ministro vem defendendo publicamente que haja uma mudança na forma como as políticas monetária e fiscal são usadas no Brasil. Segundo ele, a política monetária tem um forte poder de estimular a economia, com a vantagem de não representar perdas para os cofres públicos com desonerações:

- Prefiro que sejam monetários os estímulos para a economia.

Mantega negou que o anúncio próximo ao Copom seja uma forma de pressionar o comitê a reduzir os juros, hoje em 12,5% ao ano, imediatamente:

- Não tem nada a ver se o Copom vai ser amanhã (hoje) ou não. Queremos criar proteção para que o Brasil continue com sua trajetória de desenvolvimento e geração de emprego.

Ao ser perguntado se considerava que o aumento da meta seria levado em conta na reunião que começa hoje, o ministro respondeu:

- O Banco Central leva em conta aquilo que achar importante. Não sou eu que vou dizer o que ele deve levar em consideração. Não vejo necessidade de estímulo monetário (para o Brasil) agora, mas o mundo não vive situação de normalidade. Temos de estar atentos e vigilantes.

Para Mantega, os países ricos não estão tomando as medidas necessárias para resolver seus problemas e o atual quadro de desaceleração dessas economias pode se transformar numa recessão.

- Por mais que os países emergentes estejam preparados, não somos imunes às consequências desse cenário recessivo. Acredito que essa situação vai se arrastar por algum tempo e nós vamos ter mais volatilidade - disse o ministro.

Segundo Mantega, o governo não quer que a economia brasileira sofra um "mergulho" como o ocorrido no fim de 2008 devido à crise. Apesar de os dados do PIB no segundo trimestre, que serão divulgados na sexta-feira, e que devem apontar desaceleração no ritmo de crescimento, o ministro ainda espera uma expansão entre 4% e 4,5% em 2011, atingindo nos próximos anos entre 5% e 5,5%.

Gastos sociais não serão afetados

O ministro disse ainda que o aumento em R$10 bilhões da meta de superávit primário não vai comprometer gastos com programas sociais ou investimentos. O governo vem conseguindo aumentar sua arrecadação - principalmente em função de receitas extraordinárias - e, por isso, explicou, é preciso evitar que esses recursos deixem margem para novas despesas.

Entre os projetos cuja aprovação no Congresso o governo teme está a PEC 300, que cria um piso nacional para policiais civis e militares e para bombeiros. Seu impacto é estimado em R$30 bilhões. Já o reajuste do salário mínimo em 2012 terá um impacto esperado de R$20 bilhões.

Perguntado sobre o fato de o governo aumentar o superávit primário num ano em que as receitas estão crescendo, Mantega respondeu:

- Estamos tendo um desempenho fiscal bom. Estamos produzindo esse resultado, ele não caiu do céu.

Entre janeiro e julho, a economia de recursos para o pagamento de juros da dívida pública somou R$92 bilhões, quase 72% da nova meta, de R$127, 9 bilhões. Mesmo assim, Mantega assegurou que o governo continuará trabalhando pelo cumprimento da meta cheia este ano e em 2012. Isso significa não abater investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Este ano, por exemplo, o abatimento possível é de R$32 bilhões.