Título: Desaceleração brasileira e mundial foi principal razão para a queda da Selic
Autor: Valente, Gabriela; Beck, Martha
Fonte: O Globo, 02/09/2011, Economia, p. 24

Para o Banco Central, crise econômica global é mais séria do que parece

BRASÍLIA. O freio mais forte nas economias brasileira e mundial a partir de julho foi o fator decisivo para a surpreendente redução dos juros em 0,5 ponto percentual pelo Banco Central (BC) anteontem. O GLOBO apurou que a autoridade monetária abandonou a previsão oficial de que o Brasil crescerá 4% este ano e já trabalha com uma estimativa de 3,5%. Na avaliação do BC, a desaceleração da economia - que já ocorria por causa das medidas para conter o crescimento, tomadas a partir do fim do ano passado - foi potencializada pela crise global, que está derrubando à metade a previsão de expansão das principais nações.

O Comitê de Política Monetária (Copom) trabalhou terça e quarta-feira com uma série de dados produzidos por instituições financeiras e consultorias no exterior, além de governos estrangeiros, muitos deles trazidos pelo presidente do BC, Alexandre Tombini, da última reunião de autoridades nos EUA, na semana passada. E, na visão de integrantes da equipe econômica, os dados são mais catastróficos do que a incerteza que vem sendo ventilada no noticiário e repetida pelo mercado.

- Só o mercado brasileiro não está enxergando o que está acontecendo. Lá fora, tem gente que fala em recessão de quatro anos - disse uma fonte

- Embora o Copom tenha reduzido a Selic de 12,5% para 12%, a taxa de juros no Brasil ainda é elevadíssima. Ninguém pode dizer que o BC está sendo frouxo - disse outro integrante da equipe econômica.

Tombini sabia que decisão geraria críticas

Tombini sabia que a decisão traria uma enxurrada de críticas, mas, segundo interlocutores, não deixaria de tomar a decisão porque considera ter argumentos sólidos. O principal deles é a desaceleração da economia, que veio mais forte que o esperado. O Produto Interno Bruto (PIB) do segundo trimestre - que será divulgado hoje pelo IBGE - virá fraco, antecipando o do terceiro trimestre, que deverá ser pior.

- O que mudou nas variáveis que o BC observa foi o comportamento do PIB. Por isso, a redução pode ter vindo logo - disse um técnico.

Parte do mercado já trabalha com uma retração da atividade no terceiro trimestre. As previsões do Credit Suisse Brasil são que o crescimento do país no segundo trimestre ficou em 0,8% sobre o primeiro. A instituição projeta uma retração de 0,3% entre julho e setembro. Com isso, a previsão do PIB este ano foi derrubada de 3,8% para 2,9%.

O front externo contribui para a perda de fôlego. Pelos dados do BC, a projeção de expansão da economia dos EUA, que em abril era de 6% acumulados em 2011-2012, caiu para 3% a 3,5%, e a do Japão recuou de 3% para 1,7%. Na Europa, os países estão fora do prazo para resolução fiscal. E a China perde fôlego.

Integrantes do governo avaliam que até o IPCA - acima do teto da meta no acumulado em 12 meses - contribuiu para a decisão de baixar os juros. Na hora de defini-los, o BC olha para o comportamento da inflação em 12 meses, que hoje gira em 5,44%, abaixo dos 7% atuais. O centro da meta é de 4,5%.

No entanto, segundo o economista-chefe do Itaú e ex-diretor do BC Ilan Goldfajn, salvo um cenário de ruptura total, o IPCA deve continuar acima da meta de 4,5% no fim de 2012, ao contrário do que prevê o BC.

Com o movimento, começa a mudar a projeção de juros para 2011. Se o Focus divulgado esta semana previa Selic de 12,5% em dezembro, agora Bradesco e BES veem corte mínimo de 1,5 ponto percentual até dezembro.