Título: Que os juros comecem a cair
Autor: Lins, Letícia; Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 31/08/2011, Economia, p. 23

Presidente Dilma diz que governo abriu caminho para redução da taxa básica. BC anuncia decisão hoje

Às vésperas do anúncio da decisão do Banco Central (BC) para os juros básicos da economia (a Selic), a presidente Dilma Rousseff defendeu ontem o corte da taxa. Segundo ela, o país está criando condições para a redução, que, afirmou, é necessária para o crescimento do país. Atualmente em 12,5% ao ano, a Selic está no topo do ranking das maiores taxas reais do mundo. A reunião do Comitê de Política Monetária do BC (Copom) começou ontem e termina hoje, com o anúncio da decisão, e os analistas são unânimes ao prever que a taxa será mantida, diante da preocupação com a inflação, que, acumulada em 12 meses, já chega a 7%. A expectativa é de corte na próxima reunião, nos dias 18 e 19 de outubro, mas, por outro lado, economistas veem a atual diretoria do BC mais suscetível a pressões políticas.

- A melhor resposta à crise é o crescimento do país, mas também precisamos melhorar as condições nas quais nós crescemos. Se tem uma coisa que o Brasil quer é que haja diminuição de impostos. Não posso dizer quando vamos ter isso, mas abrimos o caminho para ter isso e queremos ter juros que sejam cadentes, que comecem a cair - disse Dilma, em viagem a Pernambuco.

Dilma afirmou que a economia suplementar de R$10 bilhões anunciada na última segunda-feira pelo governo abre caminho para isso. Ela garantiu que a redução nos gastos não vai afetar as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) nem os programas sociais:

- Esses R$10 bilhões preferimos utilizar para abrir um novo caminho, além do caminho de aumentar o investimento, é um caminho que achamos que é muito importante: queremos que, a partir deste momento, comecemos a ter no horizonte a possibilidade de redução de juros no Brasil - disse em entrevista a rádios de Pernambuco.

"Dilma é condutora da política econômica"

Na avaliação de Antonio Correa de Lacerda, professor da PUC São Paulo, Dilma é, "a cada dia, a condutora da política econômica do país". E dá o recado de que sua diretriz é austeridade fiscal com corte de juros.

- As opiniões de Dilma pesam, sim. Mas a integridade do BC está garantida - disse ele, acrescentando que o mercado já está reduzindo as projeções do juro real. - E isso também é resposta de um cenário mundial que indica que, com a queda das commodities em 10% nos últimos meses, a inflação deve ceder. Vamos importar desinflação dos países desenvolvidos.

Os contratos que projetam juros no mercado futuro incluem a possibilidade de queda já agora. Para Eduardo Velho, economista-chefe da Prosper Corretora, as apostas antecipam uma tendência de corte na taxa de juros no médio prazo em parte porque investidores apostam na pressão política sobre o BC.

- As falas no ministro da Fazenda e do presidente do BC não desmentem a tendência de cortes no médio prazo - concorda Inês Filipa, economista-chefe da Icap Brasil.

Alessandra Ribeiro, economista da Tendências Consultoria, afirma que o BC parece suscetível a pressões pela queda da Selic ainda neste ano. Para ela, a atual gestão do BC é menos dura no combate à inflação do que a anterior e entenderia que um pouco mais de inflação com mais crescimento não seria tão mau.

- Se o BC aceitar a pressão política, pode errar - pondera Alessandra, lembrando que uma perda de controle no combate à inflação pode exigir forte aumento dos juros no futuro.

Segundo Luis Otávio Leal, economista do ABC Brasil, uma redução de juros poderia ser uma decisão precipitada. Para ele, a crise não deve dar um freio na inflação, que continua elevada - especialmente a de serviços.

- Essa pressão de Dilma é normal. E aconteceu o mesmo no governo Lula. Por isso, o BC, com um corpo técnico altamente qualificado, vai ter capacidade de tirar essa pressão política e tomar a sua decisão - disse Leal, acrescentando que não há garantias de que a crise atual vai se agravar e que, assim, a inflação brasileira poderia cair. - Reajustes salariais vão fazer ainda mais pressão.

Segundo Dilma, para reagir à crise mundial, é preciso assegurar o mercado interno, que permite que o país conte com as próprias forças, afirmou. Ela defendeu medidas para proteger a indústria nacional:

- Estamos protegendo a indústria brasileira. Hoje temos que ver que o nosso mercado interno é um dos que mais crescem. Então, proteger a nossa indústria tornou-se uma questão importantíssima para o país.

Dilma voltou a citar as reservas internacionais como uma proteção contra a crise:

- Hoje temos muito mais dinheiro para enfrentar a crise. Temos US$350 bilhões de reserva. Naquela época (em 2008) tínhamos só US$220 bilhões. Temos crédito suficiente para, se houver qualquer problema internacional, a gente garanta recursos para as nossas empresas e não deixe faltar recursos para o país crescer.

Dilma desembarcou em Caruaru, a 130 quilômetros de Recife. Em seguida, viajou para Cupira, na região agreste do estado, de onde seguiu para Garanhuns, a 230 quilômetros da capital. Durante encontro com jornalistas locais, Dilma se atrapalhou sobre o nome da cidade a ser visitada, que chamou de "Curupira", nome de um personagem do folclore que tem os pés virados para trás.

- Nós vamos manter todos os investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento, o Minha Casa Minha Vida, as obras da Copa, as barragens de Curupira, o Bolsa Família, todos os programas sociais.

COLABOROU: Vinicius Neder