Título: INSS tenta maquiar números
Autor: Cristino, Vânia
Fonte: Correio Braziliense, 20/08/2009, Economia, p. 20

Ministério da Previdência altera relatório de arrecadação e despesa do Instituto Nacional do Seguro Social na tentativa de camuflar desequilíbrio

Estamos separando a apresentação para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal¿ José Pimentel, ministro da Previdência

Na tentativa de manipular informações e esconder o déficit da Previdência Social, o ministro José Pimentel mudou completamente a forma de divulgação mensal do resultado do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Com isso, no relatório liberado ontem, as folhas iniciais passaram a ser ocupadas com números desagregados da despesa e da arrecadação das contribuições urbanas e da receita e gastos com benefícios rurais.

Nessa nova metodologia, o déficit mensal (diferença entre o total de contribuições ao sistema e a despesa com o pagamento de benefícios), que antes era divulgado com destaque nas primeiras páginas da nota, foi transferido para a página 17 e, mesmo assim, sem os percentuais de comparação com os meses anteriores. O mesmo procedimento foi adotado para a apresentação do resultado do déficit acumulado no ano.

A desculpa de Pimentel para as mudanças foi que a Previdência está cumprindo a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Essa legislação, aprovada ainda no governo Fernando Henrique Cardoso contra a vontade do PT, partido do ministro, determina transparência das contas públicas. E , para o ministro, é transparência o que Previdência está fazendo ao separar as informações entre a arrecadação urbana e rural e seus pagamentos, dificultando a análise do desequilíbrio. ¿Estamos separando a apresentação para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal¿, reforçou. Na nova forma de divulgação dos dados, a Previdência só retroage até 2003, data do início do governo Lula.

Na divulgação anterior, as informações sobre a Previdência urbana e rural vinham sendo segregadas. Com as alterações, o destaque que Pimentel tenta dar é para a Previdência urbana, praticamente equilibrada pelas contribuições pagas pelas empresas e segurados. No entanto, é na previdência rural que se concentra o déficit, coberto todo mês pelo Tesouro Nacional, devido não somente à forma diferente de contribuição (na Previdência o recolhimento é calculado sobre a produção rural), mas à pouca capacidade contributiva do público objeto do benefício.

O déficit da Previdência , no entanto, é o agregado (rural e urbano). É dessa forma que ele é apurado e informado aos outros órgãos do governo, como os ministérios do Planejamento e da Fazenda e o Banco Central. Na nova forma de divulgação, a Previdência Social também omitiu os dados pelo conceito nominal (sem a correção da inflação), que é como os números são contabilizados nas contas públicas. O déficit do ano passado, por exemplo, foi de R$ 36,2 bilhões (no conceito nominal). É esse o número que deverá ser comparado com o deste ano, quando a Previdência Social deverá fechar o ano com déficit de R$ 40,7 bilhões.

O déficit da Previdência Social acumulado no período de janeiro a julho alcançou R$ 24,69 bilhões, 13,3% a mais do que o verificado em igual período do ano passado. Especificamente no mês de julho, as contas do INSS ficaram no vermelho em R$ 3,09 bilhões, um aumento de 35,5% em relação a julho de 2008, quando o Tesouro precisou colocar R$ 2,28 bilhões para cobrir o pagamento das aposentadorias e pensões.

O número R$ 24,69 bilhões Déficit acumulado entre janeiro e julho, 13,3% a mais que o verificado em igual período de 2008

Leia íntegra do relatório das contas da Previdência Social

Impasse no reajuste

Ficou para a próxima segunda-feira a reunião do governo com os aposentados para discutir o percentual de reajuste para os benefícios pagos acima do salário mínimo. O governo acenou que aceita dar um reajuste maior que a inflação, desde que os segurados concordem em abrir mão de vantagens que teriam com os projetos que tratam do pagamento de benefícios previdenciários em tramitação no Congresso Nacional. Em um desses projetos está prevista a recomposição do valor das aposentadorias pelo valor equivalente ao número de salários mínimos na época da concessão. Essa mudança custaria R$ 78 bilhões ao ano e, na prática, inviabilizaria a Previdência.

Outro risco para as contas públicas é o fim do fator previdenciário ¿ uma fórmula de cálculo da aposentadoria que embute uma diminuição do valor do benefício para quem se aposentar cedo. Se o fator for extinto, pode implicar um aumento da despesa do INSS de 6,89% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2008 para 12,50% do PIB em 2050. O aumento de despesas não para por aí. Tem ainda o impacto da derrubada do veto presidencial ao projeto que pretende estender para as aposentadorias e pensões mais elevadas o mesmo percentual de reajuste do salário mínimo em 2006, que foi da ordem de 16%. Só isso resultaria uma despesa imediata de R$ 38,2 bilhões. (VC)