Título: O Enem não avalia mais a escola
Autor: Suwwan, Leila
Fonte: O Globo, 13/09/2011, O País, p. 11

Modelo atual virou apenas prova de seleção para faculdades, diz educadora

Defensora de um amplo debate sobre o currículo do ensino médio no Brasil, a socióloga Maria Helena Guimarães, presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais do Ministério da Educação entre 1995 e 2002, lamenta que o Enem não sirva mais como ferramenta para avaliar e orientar transformações no período considerado pela educadora como o mais complicado de todo o currículo escolar. Em entrevista ao GLOBO, por telefone, a especialista afirma que o Enem virou um vestibular centralizado e que seus resultados não servem mais para avaliar a qualidade das escolas ou do ensino.

Marcia Abos marcia.abos@sp.oglobo.com.br

O GLOBO: Qual sua avaliação deste ano do Enem?

MARIA HELENA GUIMARÃES DE CASTRO: É um resultado esperado. A diferença entre a pontuação de escolas públicas e particulares não surpreende. A queda de desempenho de algumas particulares é reflexo da nova metodologia, que permite comparação anual. Sempre haverá muita oscilação de um ano para o outro porque muda o perfil dos alunos. É importante lembrar que o Enem não é mais capaz de avaliar a escola. O modelo atual é uma prova de seleção para as faculdades. O Enem está orientando o ensino médio de forma errada, muito mais ligada ao que as universidades esperam, e não ao que queremos fazer para garantir um perfil de aluno com formação geral de qualidade. O equivocado é o uso que está sendo feito do Enem, não a metodologia.

Caiu o prestígio do Enem?

MARIA HELENA: Ao contrário. O Enem não está perdendo prestígio porque se transformou numa seleção nacional para o ensino superior público. As faculdades particulares já tinham aderido desde o início. Agora, praticamente todas as federais usam o Enem. Isso tem um apelo muito grande. A finalidade do novo Enem é selecionar alunos para universidades, não é avaliar escolas. Não considero adequado o uso dos resultados, seja para comparar o desempenho de uma escola com outra, seja para certificar alunos.

É errado usar o Enem como ferramenta de marketing, como muitas particulares fazem?

MARIA HELENA: Sim. A escola que seleciona os melhores alunos para fazer o Enem só quer um bom resultado para fazer propaganda. Mas volto ao ponto inicial: qual o sentido de comparar resultados de uma escola que teve 75% de participação de alunos no Enem com outra que teve 25%? Não dá. Fica claro por que o Enem não serve para avaliar escolas ou a qualidade do ensino médio.

Qual a alternativa ao Enem?

MARIA HELENA: O Enem hoje é um vestibular centralizado, só isso. Ele está dificultando um debate sério sobre o currículo do ensino médio. A matriz de referência do Enem está completamente distorcida.