Título: Falta de higiene coloca pacientes em risco
Autor: Benevides, Carolina
Fonte: O Globo, 19/09/2011, O País, p. 3

Em Pernambuco e no Piauí, sujeira em hospitais aumenta número de casos de infecções

TERESINA e RECIFE. O bancário aposentado Antônio Carlos Lustosa, de 70 anos, foi internado num hospital de Teresina, em abril deste ano, com sintomas de dengue. A doença evoluiu para uma pneumonia e, após a internação, Lustosa sofreu um infarto com quadro de edema pulmonar. No terceiro dia, entrou em coma e foi internado na UTI com apenas 10% de chances de sobreviver, garantiam os médicos. Mas o bancário aposentado se recuperou e, sete dias depois, deixou a UTI. Sua filha, Zenaide Lustosa, conta que o pai passou a receber visitas e iniciou a fisioterapia.

- Seu estado era de melhora. Ele requeria cuidados, mas partindo para a recuperação - recorda Zenaide.

Ela conta que, repentinamente, o quadro de saúde de Lustosa se agravou por causa de uma infecção generalizada provocada por uma bactéria.

- A causa de sua morte foi provocada por infecção hospitalar. Naquele momento, o sofrimento é tão grande que não se pensa em responsabilizar o hospital - diz Zenaide, que testemunhou a unidade onde o pai estava internado sendo invadida pela água da chuva durante uma enchente, chegando próxima à UTI.

Zenaide recorda que a infecção generalizada atingiu de forma tão forte seu pai, que os medicamentos ministrados não davam mais resultado. Os casos de morte por infecção hospitalar nos hospitais do Piauí, quase sempre lotados, são cada vez mais comuns. De acordo com a diretora de Vigilância à Atenção Básica de Saúde do Piauí, Telma Evangelista, a Secretaria estadual de Saúde não tem uma comissão para centralizar as ocorrências. Cada hospital possui seu próprio grupo para cuidar da doença.

- A taxa de infecção ainda é muito alta, nem sempre os cuidados para se ter uma situação asséptica necessária para um hospital são tomadas. Além disso, há um uso indiscriminado de antibióticos que faz com que as pessoas não adquiram resistência aos micro-organismos. Isso é um fator importante que contribui para as infecções.

Já em Pernambuco, a Secretaria estadual de Saúde contabilizou 146 casos de infecção hospitalar provocada pela bactéria Klebsiella pneumoniae (KPC), entre outubro de 2010 e julho de 2011, período em que foram registradas 41 mortes possivelmente relacionadas ao micro-organismo. No entanto, só dois óbitos tiveram confirmação oficial de terem sido provocados pela KPC. O surto da infecção atingiu 29 hospitais da região metropolitana de Recife, segundo a coordenadora estadual de Controle da Infecção Hospitalar, Marilene da Silveira Barros.

-- Os outros 39 pacientes estavam em situação muito grave, tinham outras infecções e não podemos precisar se as mortes deles foram provocadas pela KPC.

Em 2007, outro surto de infecção, dessa vez provocado pela bactéria Enterococcus resistente a vancomicina (VRE), atingiu 300 pacientes.

- Teve hospital que tomou medidas duras, como escalar um vigilante para ficar na portaria e só permitir acesso de profissionais, inclusive médicos e enfermeiros, depois que lavassem as mãos - lembra Jaime Brito, chefe da Agência Pernambucana de Vigilância Sanitária.

Segundo Brito, os 360 hospitais de Pernambuco, entre públicos e particulares, somam índices de infecção de 10% a 15%, percentual limite de tolerância estipulado pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

- Infelizmente, os profissionais não lavam tanto as mãos como deveriam. Eles sabem que esse é o melhor meio de evitar as infecções, mas há resistência.

Para a Associação de Defesa dos Usuários, Seguros, Planos e Sistemas de Saúde, os problemas de higienização da rede não se limitam à falta de limpeza das mãos. A associação denuncia sujeira em banheiros, cozinhas e até enfermarias dos hospitais públicos do estado. A visita mais recente ocorreu no Agamenon Magalhães, do SUS, onde foram encontrados até insetos como baratas nos recipientes de comida entregues a pacientes. A sujeira foi documentada em fotografias.

* Especial para O GLOBO