Título: Quem perdeu foi Francenildo
Autor: D'Elia, Mirella
Fonte: Correio Braziliense, 26/08/2009, Política, p. 6

Ex-caseiro vive de bicos. Palocci e demais citados na quebra de sigilo estão bem empregados. Decisão do STF sai amanhã

Palocci se livrou de 20 dos 21 inquéritos contra ele no STF. O que envolve o caseiro é o último da lista

Gustavo Moreno/CB/D.A Press - 5/4/06 Marcelo Netto, ex-assessor de Palocci, dirige escritório

Paulo de Araújo/CB/D.A Press - 31/1/04 Ex-presidente da Caixa, Mattoso virou consultor

Brasília e São Paulo ¿ À exceção do caseiro Francenildo dos Santos Costa, pivô da saída de Antonio Palocci do Ministério da Fazenda, os personagens do escândalo seguiram trajetórias bem-sucedidas. O Supremo Tribunal Federal (STF) decide amanhã se manda abrir ação penal contra o ex-ministro, seu ex-assessor de imprensa, Marcelo Netto, e o ex-presidente da Caixa Econômica Federal (CEF) Jorge Mattoso. Os três foram acusados pelo Ministério Público Federal (MPF) de participação na quebra do sigilo bancário do então caseiro, em 2006 (leia Memória).

Fora de um dos cargos mais poderosos do governo Lula, Palocci conseguiu eleger-se deputado federal. E não está escondido. Ontem, marcou presença em um evento do setor produtor de aço, em São Paulo. Aproveitou para elogiar a condução do governo Lula no combate à crise global. O ex-ministro é considerado peça-chave no tabuleiro político de 2010 ¿ cotado tanto para substituir José Múcio Monteiro no Ministério de Relações Institucionais quanto para disputar o governo de São Paulo. Fora a possibilidade, cogitada por setores do PT, de que entre na corrida ao Planalto em caso de falência da candidatura da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Ele teve arquivados 20 dos 21 inquéritos contra ele no STF. O de Francenildo é o último da lista.

Mattoso ocupou a secretaria de Finanças de São Bernardo do Campo (SP) a convite do prefeito Luiz Marinho (PT). Era visto como um chefe educado e competente. Mas ficou no cargo apenas quatro meses, alegando problemas pessoais. ¿Tive que sair da vida pública para resolver questões familiares¿, disse ao Correio. Atualmente, cuida da sua empresa de consultoria e tem vários clientes. Mora em São Paulo e não pretende vir a Brasília amanhã. ¿A não ser que seja estritamente necessário¿, ponderou. Ele disse estar bem assessorado juridicamente e que tem ¿fé que tudo vai se esclarecer¿.

O jornalista Marcelo Netto, que já atuou em diversas campanhas políticas, inclusive na do presidente Lula, em 2002, e passou por redações de jornais, revistas e emissoras de TV, é hoje diretor do escritório de Brasília da FSB Comunicações, uma das mais importantes agências de comunicação do país.

Aperto Já o ex-caseiro Francenildo, hoje com 27 anos, continua passando aperto para conseguir emprego com carteira assinada. Desde que acusou o então ministro de frequentar uma mansão em Brasília que serviria de ponto de encontro de lobistas, ficou conhecido em todo o país. Mas também pagou a fatura. Sobrevive de bicos e continua com um pensamento fixo: completar os estudos para voltar a morar na pequena Nazária, a 30km da capital piauiense. Depois de trabalhar em obras, ganha uns trocados limpando piscinas e jardins em mansões de Brasília. Ao Correio, Francenildo disse que está tranquilo diante da proximidade do julgamento, mas ainda não decidiu se vai estar no plenário do STF na hora em que os ministros baterem o martelo sobre o futuro político de Palocci (leia entrevista ao lado).

Advogado do ex-caseiro, Ulício Nascimento reagiu com irritação diante da possibilidade, amplamente cogitada por juristas, de rejeição da denúncia contra o ex-ministro. ¿Dizem por aí que haveria absolvição sumária, o que me deixa indignado. Há elementos para receber a denúncia¿, afirmou.

Memória República de Ribeirão

Francenildo dos Santos Costa deixou de ser um desconhecido caseiro para ganhar as manchetes de jornais em março de 2006, quando acusou o então ministro da Fazenda Antonio Palocci de estar ligado à ¿República de Ribeirão Preto¿ (SP). À CPI dos Bingos, afirmou que uma mansão alugada em Brasília seria usada para fazer lobby ¿ o que tinha sido negado pelo petista. Dias depois, teve o sigilo bancário quebrado e os dados publicados pela revista Época. Palocci caiu três semanas depois.

No extrato de Francenildo constava um depósito de R$ 25 mil, que chegou a ser mencionado como uma espécie de ¿financiamento¿ das acusações contra Palocci. O dinheiro foi, na verdade, depositado pelo pai biológico de Francenildo.

Inquérito da Polícia Federal (PF) concluiu que Palocci teria ordenado a quebra do sigilo. Ele teria pedido ao então presidente da Caixa Econômica Federal (CEF), Jorge Mattoso, para obter o extrato de Francenildo. A PF mencionou telefonemas que teriam sido trocados entre o então ministro e seu assessor de imprensa, Marcelo Netto, e ligações para a sucursal da revista, em Brasília, antes do vazamento.

Mattoso assumiu sozinho a responsabilidade pela extração de dados da conta de Francenildo. Segundo disse à época à PF, pediu a impressão do extrato do caseiro ao seu assessor, Ricardo Schumman. (MD e UC)

Três perguntas para Monique Renne/CB/D.A Press - 1/6/09

Francenildo dos Santos Costa, ex-caseiro

Você vai ao julgamento? Estou esperando o advogado decidir, depende dele. Mas acho que vou, sim.

Está ansioso? Não, estou bem tranquilo. Mais tranquilo do que estava antes.

Espera que Palocci seja considerado culpado? Tem que esperar o que a Justiça vai decidir, mas é isso que eu espero sim.