Título: Palestinos cogitam lugar mais modesto
Autor: Godoy, Fernanda
Fonte: O Globo, 22/09/2011, O Mundo, p. 33

Sob pressão de Obama e Sarkozy, ANP sinaliza que pode esperar pelo Conselho de Segurança antes de recorrer à Assembleia Geral

MAHMOUD ABBAS durante o discurso de Obama

OBAMA (NO centro) sorri cercado pela secretária de Estado, Hillary Clinton, e pelo presidente da França, Nicolas Sarkozy, em uma reunião paralela na ONU: debates

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Pressionadas pelo discurso do presidente americano, Barack Obama, que afirmou na Assembleia Geral da ONU que "não existem atalhos" para a criação da Palestina fora das negociações diretas com Israel, e por uma proposta do presidente da França, Nicolas Sarkozy, autoridades palestinas indicaram que podem seguir um caminho mais modesto nas Nações Unidas.

- Há um ano, aqui desta tribuna, eu defendi a criação do Estado palestino. Eu acreditava então, e continuo acreditando, que o povo palestino merece ter seu Estado. Mas eu também disse que a paz genuína só pode ser alcançada entre os palestinos e os israelenses por eles mesmos - afirmou Obama. - A paz não virá por meio de declarações e resoluções na ONU. Se fosse tão fácil, já teria sido feito.

Na ausência de negociações, a solução intermediária seria pedir a elevação ao status de Estado observador, como o do Vaticano. Mas o novo pedido só seria apresentado depois da tentativa de aceitação como membro pleno, a ser feita amanhã, após o discurso do presidente da Autoridade Nacional Palestina (ANP) Mahmoud Abbas, na Assembleia Geral.

- Vamos tentar o Conselho de Segurança para valer, não estamos blefando. A decisão sobre a Assembleia Geral ainda não foi tomada, nem o será antes de o Conselho ter tempo para considerar nossa requisição - disse o porta-voz da delegação palestina, Nabil Shaath.

França sugere calendário de 1 ano

À noite, Abbas se reuniu com Obama. E o americano foi direto ao reafirmar que "vetaria qualquer medida no Conselho de Segurança para reconhecer a Palestina". Obama se encontrou também com o primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netahyahu - ausente do plenário durante os discursos de Obama e da presidente Dilma Rousseff- que não poupou elogios à defesa da segurança de Israel pelo americano. Tanto Abbas como Netanyahu tinham ainda conversas marcadas, separadamente, com a secretária de Estado, Hillary Clinton.

Obama tenta se equilibrar entre as pressões políticas internas e seus compromissos anteriores - a defesa da criação do Estado palestino, há um ano, na última Assembleia Geral; e as negociações de paz com base nas fronteiras anteriores à Guerra dos Seis Dias, em 1967, que ele defendeu publicamente em um discurso considerado histórico em maio, na Casa Branca. Ontem, em um recuo estratégico para evitar polêmicas, o presidente americano evitou mencionar diretamente as fronteiras de 1967, referindo-se apenas às "bases de negociação claras sugeridas em maio passado".

Para os palestinos, o discurso de Obama não trouxe surpresas, e a estratégia de recorrer à ONU já havia sido traçada com base na avaliação de que as dificuldades para a reeleição farão o presidente democrata evitar confrontos com a opinião pública e o lobby judaico americano.

- Sabemos que, por causa das eleições, há muita pressão doméstica nos EUA. Mas não estamos tentando nos filiar à máfia ou à al-Qaeda, e, sim, às Nações Unidas. Esta é uma alternativa pacífica - justificou Shaath.

Os palestinos estariam agora mais inclinados a seguir a sugestão do presidente da França, Nicolas Sarkozy, que ontem indicou o caminho para que a Palestina se torne Estado observador, como o Vaticano. Em um discurso que contrastou fortemente com o de Obama, Sarkozy disse que um veto ao reconhecimento do Estado palestino no Conselho de Segurança traz o risco de uma onda de violência no Oriente Médio. Usando como base uma proposta feita na semana passada pela chefe da diplomacia europeia, Catherine Ashton, o presidente francês propôs um cronograma de urgência para a retomada das negociações. Em um mês, haveria acordo sobre fronteiras; seis meses seria o prazo para um entendimento sobre questões de segurança e, finalmente, em um ano, estaria pronto o acordo definitivo.

- Vamos acabar com o debate infinito sobre parâmetros e começar as negociações, nessas bases. Vamos adotar um cronograma específico e ambicioso. Em 60 anos, não avançamos nem sequer um centímetro. Será que isso não nos obriga a mudar nossos métodos e calendários? - questionou Sarkozy.

A promoção a Estado observador daria aos palestinos acesso a instituições internacionais de financiamento e também ao Tribunal Penal Internacional (TPI), em Haia, e seria um passo importante, ainda que no plano simbólico para a formação do Estado da Palestina.

Em uma avaliação realista, a representação palestina na ONU reconhece que pode não alcançar os votos necessários para a aprovação de seu pedido no Conselho de Segurança, mesmo sem contar com o veto dos EUA. Nove países que estão atualmente no Conselho ou são membros permanentes já reconheceram o Estado da Palestina - Brasil, China, índia, Rússia, Líbano, África do Sul, Gabão, Nigéria e Bósnia-Herzegovina, mas os palestinos sabem que pressões podem tirar alguns desses votos. Dentre os países europeus, a tendência é de abstenção, e a Alemanha deve votar contra, assim como a Colômbia.