Título: Interior do estado tem 10% na extrema pobreza
Autor: Vasconcellos, Fábio
Fonte: O Globo, 25/09/2011, Rio, p. 23

Governo estadual estima que cerca de 320 mil famílias, ou seja, 1 milhão de pessoas, vivam em situação precária

Marcelo, Júlia, Fernando, Bruno, Bruna, Ronaldo e Washington. Na casa de apenas dois cômodos, os sete filhos de Luciana Rodrigues, de 32 anos, vivem como podem. E podem pouco. Falta alimentação adequada e, para os mais novos, até mesmo a fralda, que a mãe improvisa utilizando um saco plástico amarrado ao quadril das crianças. Com renda inferior a R$70 reais per capita, essa família do município de Sumidouro, na Região Serrana, é o retrato daqueles que vivem abaixo da linha de extrema pobreza no Rio.

Sem emprego, Luciana depende do benefício federal pago a pessoas incapacitadas por algum tipo de deficiência e que não podem ter renda - o caso de dois dos seus filhos - e os ganhos do marido, que faz bico na lavoura. Ele recebe R$35 por dia, quando consegue serviço.

- Dependemos da ajuda de vizinhos ou de doações que a igreja faz. A situação é muito difícil porque falta de tudo. Aqui, almoçamos arroz e feijão. Carne, eu não me lembro quando comemos - diz Juliana.

A situação da extrema pobreza no estado (com exceção da capital) atinge cerca de 320 mil famílias - cerca de um milhão pessoas ou aproximadamente 10% da população do interior, segundo uma estimativa da Secretaria estadual de Assistência Social e Direitos Humanos. A partir de dados do IBGE e do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, a secretaria está elaborando o mapa da miséria, que vai identificar os mais pobres em cada cidade. Para chegar a esses dados, o órgão utiliza como base o estudo da União, que tem como critério a renda inferior a R$70 per capita. Mas, no estado, o parâmetro usado será o R$100 per capita.

- Os R$70 per capita utilizados pelo governo federal para identificar as famílias em extrema pobreza não servem como critério para o Rio. Aqui temos uma pobreza metropolitana, com um custo de vida maior que o do Nordeste. Por isso estamos utilizando o critério de R$100. Por esse parâmetro, a nossa estimativa é que 320 mil famílias se encontrem hoje nessa situação - explica o secretário de Assistência Social, Rodrigo Neves.

São Francisco de Itabapoana tem o maior percentual

Pelo mapa do Ministério do Desenvolvimento, São Francisco de Itabapoana, no Norte Fluminense, tem o maior percentual de pessoas na extrema pobreza: 14,8%. Em seguida vêm Porciúncula (10,7%), Silva Jardim (9,1%), Sumidouro (8,6%) e Tanguá (7,4%). As regiões com os piores índices são o Norte Fluminense (6%), a Região Metropolitana (5%) e a Baixada Litorânea e a Costa Verdade, ambas com 4,4%. A Região do Médio Paraíba, segundo o critério do governo federal, tem menor percentual de pessoas na extrema pobreza: 2,7%. A capital aparece com 2,6%.

O secretário Rodrigo Neves diz que o Programa Renda Melhor, que o governo lançou este ano em quatro cidades da Região Metropolitana e que já atende 52 mil famílias, será ampliado para o estado a partir de janeiro. O programa complementa a renda dos beneficiados do Bolsa Família, que estão em extrema pobreza, até atingir R$100 per capita. Inicialmente, serão atendidos 20 municípios da Região Metropolitana e mais os 16 com os piores índices.

O programa utiliza a base do Bolsa Família, mas os municípios serão incentivados a identificar mais pessoas que estejam nessa situação. A capital não entra no plano porque já é atendida pelo programa Família Carioca, da prefeitura do Rio que complementa a renda das famílias mais pobres.

Não é difícil encontrar famílias em situação precária, apesar de receberem os recursos do Bolsa Família. Em Sumidouro, Juliana de Souza Azevedo, 22 anos, tem três filhos, o mais novo com um ano e cinco meses. Separada do marido, ela sobrevive com R$166 que recebe do programa federal. Pelo critério da secretaria, a família poderia receber um pouco mais, cerca de R$58 por pessoa.

- Essa é a única renda que tenho. O meu ex-marido, de vez enquanto, traz uma cesta básica. Mas não é suficiente. Estou com sete contas de luz atrasadas. Não sei o que faremos no próximo mês, quando deveremos ficar sem energia por falta de pagamento.

Mas há ainda casos de famílias que vivem com poucos recursos e não conseguem sequer a inscrição em programas sociais. Apesar de ocupar 31ª no ranking da extrema pobreza, segundo os critério do governo federal, Paraty, na Região da Costa Verde, é onde mora, numa casa de dois cômodos, Nilda de Oliveira Faria, de 32 anos. Moradora do bairro do Condado, ela tentou receber o Bolsa Família, mas não consegue fazer o cadastro porque não tem CPF. Sem emprego, Nilda depende da ajuda de vizinhos e dos trabalhos temporários que o marido consegue na construção civil.

- Tem um mercadinho aqui perto que deixa a gente comprar fiado, mas o dono não vende quando é acima de R$100. Quando o meu marido não consegue um dinheiro para a gente pagar a conta, recorro aos vizinhos. Hoje mesmo não temos leite e fraldas.