Título: Indústria se prepara para aumentar margens e preços com dólar alto
Autor: D"Ercole, Ronaldo; Lino Rodrigues
Fonte: O Globo, 26/09/2011, Economia, p. 24

Empresários ainda estão à espera de novo patamar da moeda americana

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SÃO PAULO. A recente escalada da moeda americana, que subiu 5,54% ante o real somente na semana passada, preocupa a indústria nacional, mas alguns setores veem no dólar mais alto uma oportunidade para recuperar margens e competitividade perdidas com a apreciação do real nos últimos anos. De uma maneira geral, os empresários consideram cedo ainda para mudanças nas estratégias de negócios, como investimentos ou troca de fornecedores externos por nacionais. E não descartam a necessidade de aumentos de preços para repassar custos maiores mais adiante, especialmente nos setores que importam insumos e componentes, como os fabricantes de equipamentos de informática e telefonia.

- Ninguém vai subir preços em função dessa alta. Mas, assim como os preços baixaram quando o dólar caiu, vão aumentar com a alta. As empresas vão aguardar para ver em que patamar o dólar vai se acomodar, para então decidir sobre reajuste de preços - diz Humberto Barbato, presidente da Abinee, associação que reúne fabricantes de equipamentos elétricos e eletrônicos.

Júlio Gomes de Almeida, consultor econômico do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), concorda que o impacto mais imediato do dólar valorizado se dará sobre os custos, já que grande número de empresas nacionais, como as dos setores de máquinas e equipamentos, adicionou insumos importados a seus produtos valendo-se do real valorizado. Mas ele não vê tanto espaço para repasses de custos nos preços.

- Muitos setores estão fazendo isso, inclusive o de veículos, importando aço, autopeças. Essa estratégia não muda repentinamente, pois envolve negociações com fornecedores, linhas de crédito já aprovadas. Nem as empresas que deixaram de vender lá fora vão recuperar mercado agora, diante da retração na Europa e nos Estados Unidos - observa Almeida. - E será difícil repassar custos maiores para os preços, porque a concorrência continua forte. Para as empresas que estão querendo entrar no país, esse aumento do dólar é quase nada.

Mario Bernardini, diretor da Abimaq, que reúne a indústria de máquinas e equipamentos, vê espaço não só para repassar a alta dos custos em dólares como para recuperar margens. Como em média o setor usa 40% dos insumos importados, e estes representam em torno de 55% dos custos, uma alta de 15% do dólar exigiria repasse de 3% aos preços. O que permitiria aos fabricantes aumentar os preços em 7%, recuperando parte das margens e enfrentando os importados, cujos preços aumentariam perto de 15%.

- Não dá para dizer que (a alta do dólar) já afetou os custos, porque não se sabe ainda qual é o novo patamar de equilíbrio do real - diz Bernardini.

Luiz Aubert Neto, presidente da Abimaq, destaca que, independentemente de qual será o novo valor, o dólar ter deixado a faixa de R$1,50 já é positivo.

- O câmbio a R$1,50 estava sendo mortal para a indústria - diz. - Com o câmbio mais alto, a médio e longo prazos podemos recuperar mercados que perdemos aqui e lá fora.

Real mais fraco não reduziu compras na Zona Franca

De acordo com a Superintendência da Zona Franca de Manaus (Suframa), um dos maiores pólos de produção de eletroeletrônicos no país, as fortes altas do dólar ainda não alteraram o volume de compras de insumos importados dos fabricantes lá instalados.

- Não é possível afirmar que uma desvalorização maior do real será automaticamente repassada ao consumidor - diz Ana Maria Souza, coordenadora de Estudos Econômicos da Suframa.

André Rebelo, assessor econômico da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), concorda que as empresas devem esperar para ver "quanto da desvalorização atual do real será permanente e quanto é provisória", para só então avaliar o efeito sobre os custos. Rebelo também vê o câmbio se acomodando num patamar maior, mas adverte que esse processo será longo, "um caminho sinuoso e cheio de altos e baixos".

- Nesse novo câmbio, as indústrias vão refazer suas escolhas entre componentes nacionais e importados.