Título: Dilma cedeu para aprovar Comissão da Verdade
Autor: Camarotti, Gerson; Braga, Isabel
Fonte: O Globo, 23/09/2011, O País, p. 9

Dos EUA, presidente chegou a gritar com governistas, que conversaram com ela por telefone num banheiro da Câmara

Gerson Camarotti, Isabel Braga e Roberto Maltchik

BRASÍLIA e NOVA YORK. A contragosto, a presidente Dilma Rousseff foi obrigada a ceder às pressões do DEM para impor restrições à lista de pessoas que ela mesma deverá escolher para integrar a Comissão da Verdade. De Nova York, exaltada, Dilma mandou o ministro José Eduardo Cardozo (Justiça) assumir a responsabilidade por quaisquer mudanças que a obrigassem, mais tarde, a vetar artigos do projeto que deve reabrir capítulos nebulosos da ditadura.

O acordo só ocorreu depois que o presidente da Câmara, Marco Maia (PT-RS), foi assertivo: o impasse poderia levar a votação para 2012. Toda a conversa ocorreu no diminuto banheiro do gabinete da presidência da Câmara.

Ao ser consultada, Dilma não gostou da nova restrição para que, entre os sete integrantes do grupo, não houvesse pessoas que "não tenham imparcialidade". A presidente insistia em votar o texto original, sem modificações. Foi então que Cardozo, numa postura incomum entre os integrantes do primeiro escalão, decidiu enfrentá-la e manter o acordo com o DEM.

- Você assuma a responsabilidade dessa decisão - gritou Dilma ao telefone, deixando o ministro abatido.

Ontem, os principais interlocutores políticos da presidente garantiram que, mesmo que fosse o seu desejo, não haveria espaço para tentar retomar no Senado a redação que saiu do Palácio do Planalto. A Comissão da Verdade será votada nos próximos dias, e o relator deve ser o senador Aloízio Nunes Ferreira (PSDB-SP), que integrou a resistência ao regime militar.

Reviravoltas quase abortaram votação

O debate acalorado no banheiro foi o lance mais inusitado de uma noite de reviravoltas que quase abortaram a votação. Apertados no cubículo, estavam Cardozo, o presidente da Câmara, a ministra da Secretaria dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, e o assessor especial da Defesa, ex-deputado José Genoino. O barulho vazou para o lado de fora, mesmo com a porta trancada.

- Foi inusitado. Em função da falta de espaço, meu banheiro chegou a ser usado por seis pessoas. É a busca por privacidade - disse Maia.

Mais tranquila, a presidente Dilma Rousseff disse ontem que a aprovação do projeto é importante para o Brasil e até para a imagem do país no mundo.

- Acredito que é importante a aprovação da Comissão da Verdade, É importante para o Brasil, é importante para a posição do Brasil diante do mundo. Sempre fui a favor da Comissão da Verdade - disse Dilma, que, na última terça-feira, participou ao lado do presidente dos EUA, Barack Obama, de reunião sobre transparência dos governos.

Os ministros não iriam ao Congresso. Estavam concentrados no gabinete de Cardozo, no Ministério da Justiça. Chegaram a sugerir que a negociação ocorresse na casa do presidente da Câmara e só entraram em campo quando perceberam que a articulação poderia azedar. A culpa, avalia o governo, foi do líder do PPS, Roberto Freire (PE), que passou a defender mudanças no texto em plenário. Apesar da tensão, um negociador relatou que o acordo tinha que ser cumprido, mesmo com a contrariedade presidencial.

- Essas mudanças até melhoraram o texto. Se não votássemos ontem, o fogo iria se alastrar. Teríamos sérios problemas. Não de janela regimental, mas de condições políticas para atender todos os envolvidos: parentes de vítimas, partidos de esquerda e os militares - explicou, na condição do anonimato.

O PSOL e a deputado Luiza Erundina (PSB-SP), favoráveis à revisão da Lei da Anistia para punir agentes do Estado que cometeram crimes de tortura, rebelaram-se contra o acordo do governo com o DEM. As sete emendas apresentadas pelo grupo foram rejeitadas, e a represália se dará durante o funcionamento da comissão.

- Vamos encaminhar todo o trabalho da comissão para o Ministério Público. Nós e os movimentos de direitos humanos vamos acompanhar os trabalhos muito de perto - afirmou o deputado Chico Alencar (PSOL-RJ).

Além de Cardozo, o acordo com a oposição contou com a participação dos ministros da Defesa, Celso Amorim; de Direitos Humanos, Maria do Rosário; de Relações Institucionais, Ideli Salvatti; e da Casa Civil, Gleisi Hoffmann.

COLABOROU: Cristiane Jungblut

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