Título: CNJ: Padre Severino tem que acabar
Autor: Otavio, Chico
Fonte: O Globo, 13/10/2011, O País, p. 3

Relatório mostra que unidade funciona em conflito com a lei

Está saindo de cena um símbolo da linha-dura no tratamento de jovens em conflito com a lei no Rio de Janeiro. Se seguir as recomendações do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), o governo fluminense fechará até o fim do ano o Instituto Padre Severino, na Ilha do Governador. Em 57 anos de existência, a unidade coleciona um histórico de superlotação, maus-tratos, rebeliões e fugas, mas nenhuma denúncia até então fora capaz de desativá-la.

O fim do Padre Severino é uma das recomendações do relatório produzido pelo programa "Justiça ao jovem", do CNJ, sobre as condições de seis unidades destinadas à execução de medidas socioeducativas a jovens em conflito com a lei no Rio. Iniciada no ano passado, a campanha é nacional. Todos os estados foram visitados por equipes do programa, que só não concluíram ainda o relatório de São Paulo.

Das seis unidades fluminenses visitadas em maio deste ano, o relatório diz que o Padre Severino foi a única onde reiteradamente houve reclamação dos adolescentes contra a violência praticada por agentes de segurança, inclusive com o uso de gás de pimenta. O CNJ também constatou a superlotação do instituto (embora a unidade ofereça 120 vagas, apresentava 271 adolescentes internados no período da visita), má conservação das instalações, alimentação de qualidade ruim e insuficiência no número de funcionários.

A única atividade oferecida pelos adolescentes nessa unidade, segundo o relatório do CNJ, seria o ensino formal, e, mesmo assim, sem carga horária suficiente. Os alojamentos ficavam em duas alas, com no máximo oito vagas. No entanto, alguns chegavam a comportar até 16 adolescentes, obrigando muitos jovens a compartilhar a cama. Na inspeção, a equipe do CNJ constatou infiltrações nas instalações e problemas com a circulação do ar.

Mas os problemas no Padre Severino não são uma particularidade do Rio. No relatório sobre a Paraíba, que acaba de ser divulgado, o programa concluiu que a imposição de castigos físicos aos adolescentes tem se mostrado uma prática regular no estado. De acordo com o relatório, 60% dos adolescentes internados no Centro de Atendimento ao Adolescente (CEA) de João Pessoa se queixaram de violência.

Com base em visitas feitas em novembro do ano passado a seis unidades paraibanas, assim como à Vara da Infância e Juventude (onde tramitam os processos), o CNJ verificou que outro problema considerado "preocupante" pela equipe do "Justiça Jovem" foi a internação provisória em Campina Grande, que ocorre de forma adaptada num edifício planejado para ser anexo de uma delegacia de polícia.

O Padre Severino também não foi o único condenado à desativação pelo programa. Em Santa Catarina, por exemplo, foi sugerido o fechamento das unidades São Lucas (São José) e Pliat (Florianópolis), "onde os jovens são objeto de violência física e psíquica", descreve o relatório. Para a equipe que visitou o estado, os educadores "vivenciam a cultura da dominação e da intimidação".

Como o CNJ não tem poder para fechar as unidades críticas, opta por fazer as recomendações ao Poder Executivo e encaminhar cópias do relatório aos Tribunais de Justiça e aos Ministérios Públicos de cada estado visitado.

O "Justiça ao Jovem" nasceu de outro programa do CNJ, os "mutirões carcerários". Ao visitar as cadeias destinadas a adultos, juízes e técnicos do Conselho aproveitavam para vistoriar as unidades de adolescentes. Ao assumir a Presidência do CNJ, em abril do ano passado, o ministro Cezar Peluso (também presidente do Supremo Tribunal Federal) resolveu formalizar o trabalho e lançou o programa.

As visitas seguem um método próprio e produzem uma série de dados. As recomendações de fechamento de unidades têm sido atendidas pelos governos estaduais.

Na ocasião da visita ao Rio, o diretor do Padre Severino, Alexandre de Jesus Pinheiro, disse à equipe do CNJ que o instituto será desativado até o fim do ano. Para isso, encontram-se em andamento as obras para a construção de novas instalações, mais modernas e no mesmo terreno onde a unidade funciona atualmente. Outros estabelecimentos destinados a internação provisória, segundo ele, estão em construção em outros locais.

Alexandre Pinheiro procurou destacar os avanços no tratamento aos menores, como acesso a médico, dentistas e psiquiatras e participação em várias atividades.

O Degase (Departamento Geral de Ações Socioeducativas) disse ao GLOBO que vai se manifestar hoje.