Título: Sem Infraero, o discurso privatizante era suicida
Autor: Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 14/10/2011, Economia, p. 23

ADYR DA SILVA

O ex-presidente da Infraero Adyr da Silva avalia que a disputa pelos três terminais aeroportuários que serão concedidos à iniciativa privada (Garulhos, Viracopos e Brasília) será uma verdadeira "carnificina". Ele diz que seria ingenuidade acreditar que a Infraero ficaria de fora do processo e que sua influência será grande nos consórcios.

O lance mínimo para vencer o leilão dos três aeroportos que serão concedidos à iniciativa privada será de R$2,9 bilhões. O senhor avalia que esse valor atrairá muitos investidores?

ADYR DA SILVA: Não tenho dúvida de que os leilões terão um ágio muito maior que o de São Gonçalo do Amarante (no leilão do terminal potiguar, ocorrido em agosto, o ágio foi de 228%). Será uma disputa bilionária, uma carnificina.

Na minuta do edital dos leilões, que ainda está em consulta pública, está previsto que os investidores que fizeram os estudos para modelagem da concessão não poderão entrar na disputa. O que o senhor acha disso?

SILVA: Não concordo com esse ponto. Por que as empresas que se debruçaram de forma mais minuciosa sobre os dados da concessão não devem participar? As outras que não estudaram os dados para propor o modelo não o fizeram porque não quiseram. Mas certamente muitos pontos do edital serão revistos. No caso de São Gonçalo do Amarante, 20 itens foram revistos.

O fato de a Infraero poder ter 49% do consórcio vencedor (incluindo os 4% dos empregados da estatal) não dá um caráter muito estatal a uma iniciativa que tem por objetivo privatizar os terminais?

SILVA: O que aconteceu foi que, quando o ministro (ministro-chefe da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt) teve de se defrontar com a responsabilidade, viu que precisava da Infraero, pois é ela que tem experiência em administrar aeroportos no Brasil. Ele viu que o discurso privatizante, da forma como estava sendo feito, era suicida. A Infraero será a sócia individual majoritária no consórcio, pois dificilmente uma única empresa terá uma fatia maior do que a dela. Além disso, a Infraero vai coordenar a Autoridade Aeroportuária. Seria muita ingenuidade achar que a Infraero ficaria de fora do processo. Ela terá uma influência muito grande.

Uma das críticas dos investidores é que eles terão de repassar entre 2% e 10% da receita bruta anual dos aeroportos para a Infraero...

SILVA: Se você tira as principais fontes de receita de uma empresa, ela vai viver de quê? Vão tirar as joias da coroa da Infraero, mas ela terá de administrar mais de 60 aeroportos ainda. Ele precisará de recursos para fazer isso. Era precisar criar um mecanismo para corrigir a perda de receita.