Título: Desemprego baixo e greves em alta
Autor: D"Ercole, Ronaldo
Fonte: O Globo, 15/10/2011, Economia, p. 37

Mobilização aumenta com falta de mão de obra e ganhos na economia

SÃO PAULO. O desemprego no seu menor nível histórico tem sustentado uma onda de greves pouco vista no Brasil. Já no início do ano, pararam cerca de 80 mil operários da construção civil, um setor reconhecidamente pouco mobilizado, diante da dinâmica das obras. Uma revolta localizada em Rondônia se transformou num movimento nacional. E as greves não pararam mais. Metalúrgicos, funcionários dos Correios, professores, bancários... E a ameaça continua. Petroleiros e metalúrgicos com data-base em novembro se preparam para greve.

Além do desemprego baixo, o crescimento de 7,5% da economia no ano passado sustenta o fôlego dos movimentos grevistas e aumenta as reivindicações dos trabalhadores. Mas o cenário favorável da economia começa a se esvair. Especialistas advertem que o aumento das incertezas decorrentes da crise internacional e os sinais já evidentes de desaceleração no mercado interno devem endurecer as negociações e acirrar as greves nos próximos meses.

- Há um imprevisibilidade maior em relação ao futuro nas empresas e isso tende a aumentar os conflitos, porque os trabalhadores continuam com alto poder de barganha - diz o sociólogo Adalberto Cardoso, do Instituto de Estudos Sociais e Políticos (IESP), da Uerj.

Ganho maior do mínimo serve como referência

Ele destaca, ainda, o efeito do mínimo, que tem subido mais que os salários na iniciativa privada (apesar de neste ano o reajuste ter se limitado à inflação), e gerou uma percepção nos sindicatos de que suas bases estavam perdendo renda.

- Esse processo de recomposição do mínimo induz os sindicatos a buscar ganhos semelhantes.

Das grandes categorias profissionais, além dos bancários que conseguiram 9% de reajuste e devem aprovar amanhã a retomada ao trabalho, ainda estão em negociações salariais os petroleiros (que reúne os 70 mil empregados diretos da Petrobras, além de outros 300 mil terceirizados) e os metalúrgicos de São Paulo (260 mil trabalhadores), que têm data-base em novembro. E para pressionar as empresas, os sindicatos de ambas as categorias já declaram estar em estado de greve.

Ganho de R$11,5 mil de PLR e abono de R$4.200

Negociações bem-sucedidas, que incluíram greve, são um estímulo às novas negoações. Os metalúrgicos da fábrica da Volkswagen do Paraná, por exemplo, cruzaram os braços por 37 dias entre maio e junho, e conseguiram elevar a Participação nos Lucros e Resultados (PLR) para até R$11,5 mil, além de um abono de R$4.200. Diante da ameaça dos funcionários de parar sua fábrica, que também fica em São José dos Pinhais, na grande Curitiba, a Renault aceitou um acordo para o PLR e bonificações que resultarão em ganho adicional de R$60 mil aos trabalhadores no período.

Para o consultor sindical José Guilherme Vargas Neto, mesmo com os reveses, é uma conjuntura positiva aos trabalhadores.

- Os sindicatos vão para as negociações com a percepção de que podem avançar nas suas reivindicações. Apesar das dificuldades circunstanciais, da desaceleração econômica, a conjuntura ainda é favorável - diz Vargas Neto.

No ABC paulista, mesmo sem fazer greve, os metalúrgicos das montadoras fecharam acordo de dois anos, com reajuste de 10% agora, repondo inflação mais 2,55% de aumento real neste e no próximo ano. O trabalhadores das autopeças e fundições da região tiveram mais trabalho, fizeram greves durante as negociações, mas levaram o mesmo que os colegas das montadoras.

- No ABC, as greves se intensificaram em autopeças e fundição. Nesses setores os acordos foram só de um ano, mas todos os grupos ganharam 10% de reajuste - diz Paulo Caires, presidente da Confederação Nacional dos Metalúrgicos.

José Silvestre, coordenador de relações sindicais do Dieese, diz que, embora o país vá crescer menos este ano, o mercado de deve gerar um número de vagas parecido com o de 2010.

- Mas algumas negociações já indicam um recuo no nível de ganho real. O primeiro semestre foi ainda muito bom, mas deve cair o nível de ganho neste segundo semestre".