Título: Política fiscal é risco para o BC
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Fonte: O Globo, 15/10/2011, Opinião, p. 6

Qual é a tendência da inflação brasileira nos próximos meses? Tal pergunta vem sendo respondida de maneiras muito diferentes nas últimas semanas. O Banco Central, em seus documentos oficiais, pronunciamentos e entrevistas dos diretores da instituição, prevê um ambiente deflacionário no mercado mundial, em função da falta de perspectiva para a crise que abalou as economias europeias, americana e japonesa.

De fato, não se deve subestimar o impacto dessa crise externa sobre a economia brasileira, pois existe a possibilidade de redução de demanda de muitos bens e produtos que hoje o país exporta a preços compensadores. Na visão do Banco Central, seria temerário continuar desaquecendo a demanda interna de maneira mais vigorosa, porque assim não haveria compensação para uma eventual retração dos mercados externos, e o Brasil poderia ser arrastado pela crise lá de fora, como aconteceu no segundo semestre de 2008.

Mas essa visão não é compartilhada por vários economistas e, especialmente, pelos analistas do setor financeiro. A inflação brasileira nos últimos meses ultrapassou o teto da meta (6,5%) estipulada para 2011, e existe o risco de que não recue a tempo de se cumprir esse compromisso da política econômica.

Os que divergem da visão do BC têm mais receio ainda em relação ao ano que vem, devido a fatores internos. A fórmula de reajuste do salário mínimo prevê para 2012 um aumento de 14%, o que deve manter pressionados os preços dos serviços, cuja variação tem se mantido bem acima da média dos demais itens que pesam no bolso dos consumidores.

Em torno dessa divergência sobre a trajetória da inflação brasileira estão as taxas básicas de juros. No fim de agosto, o Comitê de Política Monetária (Copom) resolveu reduzi-las em meio ponto percentual, o que causou grande polêmica, pois a decisão foi tomada após o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e a própria presidente Dilma Rousseff terem feito declarações sobre um suposto aperto da política fiscal, que levaria inevitavelmente o BC a baixar os juros.

A política fiscal, por uma série de motivos, continua sendo vista com desconfiança por críticos das diretrizes da atual equipe econômica. Foram tantos os artifícios usados em 2009 e 2010 para se chegar a um resultado próximo do almejado que, agora, a disposição do governo em alcançar as metas propostas está sob permanente questionamento;

Em relação a 2011, devido principalmente à contribuição do aumento de receitas e da redução do ritmo de investimentos públicos, são poucos os que não acreditam no cumprimento das metas de superávit primário nas finanças governamentais. Mas, como em 2012 é possível que essa contribuição não se repita, há quem ponha em dúvida a real disposição do governo federal de puxar o freio dos gastos correntes do Tesouro.

O Banco Central deve continuar a merecer um voto de confiança pela seriedade com que tem desempenhado sua missão em favor da estabilidade monetária no país, embora se possa discordar de suas recentes decisões. O risco é de o governo não conduzir uma política fiscal responsável e, assim, enfraquecer o BC.