Título: Governo mostra a conta da gestão Lina
Autor: Pires, Luciano; Bancillon, Deco
Fonte: Correio Braziliense, 28/08/2009, Economia, p. 13

Balanço da Receita Federal revela queda na arrecadação de 27,9% nos primeiros sete meses deste ano

Fazer a comparação da arrecadação de 2009 com a de 2008, que foi um ano de bonança, é quase patético Lina Vieira, ex-secretária da Receita Federal

A Receita Federal divulgou ontem um balanço das autuações de grandes contribuintes durante os sete primeiros meses deste ano. O retrato do período revela que houve aumento na quantidade de ações abertas contra infratores, mas queda no volume de recurso arrecadado. Técnicos do Fisco que acompanham de perto a dança das cadeiras em postos-chave do órgão interpretam o gesto como uma tentativa de legitimar o discurso oficial, já que o governo apoiou-se no fraco desempenho arrecadatório da Receita para justificar a demissão da ex-secretária Lina Vieira.

De janeiro a julho, 1.194 empresas foram advertidas ¿ 12,8% a mais do que no mesmo período do ano passado (1.058 companhias). Esse aperto, no entanto, não significou ganho de caixa: R$ 16,06 bilhões entraram nos cofres em 2009, contra R$ 22,29 bilhões nos sete primeiros meses de 2008 ¿ queda de 27,9%. Há 10 dias, em depoimento no Senado, Lina contestou a tese de que as receitas da União caíram além do normal durante sua administração.

Aos parlamentares, a ex-secretária disse que o recuo é ¿mito¿. Lina afirmou que ao longo de 10 dos 11 meses em que esteve à frente da Receita a economia brasileira sofreu com os efeitos da crise mundial e as políticas anticíclicas baixadas pelo Palácio do Planalto. ¿Fazer a comparação da arrecadação de 2009 com a de 2008, que foi um ano de bonança, é quase patético¿, resumiu no Senado. O estudo feito pela Receita Federal ignora as turbulências que atingiram quase todos os setores produtivos, os pacotes de incentivo, as desonerações fiscais e as alterações das datas de recolhimento de impostos.

Exonerações

Em mais um dia de baixas, o Diário Oficial da União publicou ontem que mais cinco servidores deixaram os cargos de confiança. Luiz Sérgio Fonseca Soares, superintendente da Receita na 8ª Região Fiscal de São Paulo, saiu e para o seu lugar foi nomeado José Guilherme Antunes de Vasconcelos. Foram exonerados ainda um auditor-fiscal da área de fiscalização, uma funcionária que atuava no segmento de cooperação fiscal e integração da Receita, além de um delegado da Receita e de um coordenador-geral de processos estratégicos.

O movimento demissionário em massa, que ganhava adeptos dia a dia, pode estar se revertendo. Funcionários que haviam manifestado interesse em deixar seus cargos estão voltando atrás. Conforme técnicos da Receita, o fenômeno se deve à atuação direta do novo secretário Otacílio Cartaxo, que conseguiu convencer os insatisfeitos a ficar. O contra- ataque do governo foi direcionado às regiões onde houve troca de comando. Os servidores que permanecem em seus postos receberam sinal verde de Cartaxo para continuar exercendo o trabalho sem qualquer ingerência política. ¿Em Minas Gerais, esse movimento (de demissionários) caiu a zero. Ou seja: todos os que tinham entregue os cargos voltaram atrás e decidiram fechar com o novo superintendente¿, disse um servidor do Fisco.

No Rio Grande do Sul, onde também houve mudanças no organograma, as baixas confirmadas desde terça-feira foram compensadas pela permanência de cinco entre 11 técnicos que tinham inicialmente colocado os cargos à disposição. ¿Lá, o superintendente teve um pouco mais de trabalho, porque cada um dos servidores tem uma razão para ficar ou para sair. Mas o saldo foi bastante positivo¿, explicou o servidor. Segundo ele, em Porto Alegre, as dúvidas se restringem ao delegado regional e a cinco chefes de divisão, que ainda não sinalizaram que decisão vão tomar.

Planalto desafia ex-secretária Paulo H. Carvalho/CB/D.A Press - 6/8/09 Romero Jucá, líder do governo, diz que última visita foi em outubro

A guerra de versões envolvendo o suposto encontro da ex-secretária da Receita Federal Lina Vieira com a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, teve ontem mais um capítulo. O líder do governo do Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), revelou em um discurso no plenário que Lina esteve no Palácio do Planalto quatro vezes entre outubro de 2008 e maio deste ano. E, segundo ele, não há registros de visitas de Lina nos meses de novembro e dezembro do ano passado.

Jucá reforçou aos colegas senadores que as datas e os horários que constam no sistema de segurança do Planalto não coincidem com o período no qual a ex-secretária afirma ter ocorrido a reunião. Conforme versão de Lina Vieira, a ministra Dilma teria pedido para que o Fisco ¿agilizasse¿ as investigações nas empresas da família Sarney. No Senado, Lina disse que não se sentiu pressionada. A ministra Dilma nega o encontro.

O líder do governo fez um histórico das vezes em que Lina Vieira esteve no Palácio do Planalto. O sistema de monitoramento, de acordo com Jucá, indica visitas em 9 de outubro de 2008 (entrada às 10h13 e saída às 11h29), 22 de janeiro de 2009 (entrada às 17h59 e saída às 20h57), 16 de fevereiro de 2009 (entrada às 16h57 e saída às 18h35), e em 6 de maio de 2009 (entrada às 17h05 e saída às 20h33). Jucá atacou a oposição, que acusa o governo de queima deliberada de possíveis provas. ¿Deixo a bola para a doutora Lina e ela, se quiser, que diga a data que, em tese, teria havido uma reunião que não houve¿, afirmou Jucá.

Em nota divulgada na semana passada, o Gabinete de Segurança Institucional informou que as imagens que registram entradas em áreas externas do Planalto são apagadas a cada 30 dias. No edital de concorrência, a empresa que faz o monitoramento se compromete a guardar o material por pelo menos seis meses. Jucá desmentiu a informação. De acordo com o senador, o prazo diz respeito ao controle de crachás, placas de veículos e identificações dos visitantes feitas pelos seguranças do Planalto. (LP e DB)

RETOMADA DO DEBATE O secretário da Receita Federal, Otacílio Cartaxo, quer discutir com os servidores a Lei Orgânica do Fisco. A proposta, que ainda está na forma de anteprojeto, vem sendo debatida internamente há um ano. O texto reorienta uma série de atividades e reforça o papel institucional do órgão. Cartaxo promete concluir o processo de nomeação dos novos ocupantes de cargos de confiança e retomar as negociações com os auditores em torno de um texto que seja consensual.(LP)