Título: Para a oposição argentina, vitória só em 2015
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 20/10/2011, O Mundo, p. 36

Derrota iminente para Cristina leva políticos a já pensarem na próxima campanha à Presidência, daqui a quatro anos

BUENOS AIRES. Enquanto a presidente argentina, Cristina Kirchner, dedicou grande parte de sua campanha a inaugurar obras públicas e seu candidato a vice, o ministro da Economia Amado Boudou, tocou guitarra em programas de TV e shows com seu grupo preferido, O La Mancha de Rolando, os quatro principais candidatos da oposição passaram o último mês e meio dando entrevistas, participando de comícios no interior e tentando melhorar o desastroso resultado das primárias de 14 de agosto passado. Com a presidente como grande favorita na eleição de domingo, seus adversários não conseguiram discutir propostas. Passaram boa parte do tempo brigando e fragmentando ainda mais o cenário antikirchnerista.

- Vamos nos consolidar como a principal força da oposição e eleger o presidente em 2015 - afirmou o deputado e candidato da União para o Desenvolvimento Social (Udeso, sublegenda da União Cívica Radical), Ricardo Alfonsín, num arroubo de sinceridade.

Alfonsín, que nas primárias ficou em segundo lugar e no próximo domingo poderia cair para o quarto, admite que esta é uma eleição perdida. Já a surpresa das primárias e provável segundo colocado nas presidenciais, o candidato da Frente Ampla Progressista (FAP), Hermes Binner, tentou mostrar otimismo:

- Isto (a FAP como projeto político) não termina no dia 23.

Viuvez fortaleceu politicamente a presidente

Analistas preveem uma das piores eleições para a oposição desde a redemocratização da Argentina - pesquisas apontam que Cristina pode superar 52% dos votos. Há um ano, quando o ex-presidente Néstor Kirchner ainda era vivo, acreditava-se que o governo podia ser derrotado. O revés sofrido pela Casa Rosada nas legislativas de 2009 criou um clima de otimismo que desapareceu após a morte de Kirchner, em outubro de 2010. Figuras como o vice-presidente, Julio Cobos, e o chefe de governo portenho, Mauricio Macri, assimilaram o fortalecimento de Cristina e devem esperar até 2015.

- Se o ex-presidente estivesse vivo e fosse candidato, a situação da oposição seria outra - diz Jorge Giacobe, da Giacobe e Associados.

Num país que há oito anos cresce, em média, 8%, e diante de uma presidente que transformou a viuvez numa oportunidade de reconciliar-se com parte da sociedade, a oposição mergulhou numa profunda crise que, após as primárias, nas quais Cristina obteve 50,2% dos votos, só piorou. Alianças seladas previamente naufragaram, e as disputas entre opositores ocuparam o noticiário. O debate de propostas, em contrapartida, foi quase nulo.

- Temos uma oposição patética, que não soube capitalizar o triunfo de 2009 - opina Sergio Berensztein, da consultoria Poliarquia.

Deputado e candidato a governador da província de Buenos Aires, o empresário e peronista dissidente Francisco De Narváez trocou sua parceria com Alfonsín por um acordo com o peronista Alberto Rodríguez Saá, atual governador da província de San Luis, a única das 24 províncias argentinas na qual Cristina não foi a mais votada nas primárias. El Alberto, como é chamado, prometeu construir casas e instalar wi-fi em todo o país.

A campanha do ex-presidente Eduardo Duhalde, que deve ficar em quinto lugar no domingo, é um dos maiores fracassos da oposição. Após as primárias, nas quais obteve 12,1% dos votos, ele perdeu espaço na mídia e apoio dos eleitores. O socialista Binner foi o mais atacado pelos candidatos da oposição, que chegaram a dizer que o líder da FAP respaldaria uma reforma constitucional que incluiria a reeleição indefinida de Cristina.

- Essa é uma discussão de outra galáxia - respondeu Binner.

Ontem, Cristina encerrou sua campanha no Teatro Coliseo.

- Peço aos homens com responsabilidade que sejam inteligentes - disse.