Título: Hora de desconcentrar receitas da União
Autor:
Fonte: O Globo, 23/10/2011, Opinião, p. 6

A disputa pelos royalties e participações especiais decorrentes da produção de petróleo e gás natural no litoral do Estado do Rio de Janeiro e Espírito Santo (futuramente também em volumes mais significativos na costa de São Paulo) tem como esteio a concentração de receita tributária nos cofres da União.

Tal concentração sempre teve como justificativa o desequilíbrio regional no país. Ao concentrar os recursos, o governo federal, em tese, poderia redistribuí-los de maneira mais justa, contribuindo assim para uma redução gradual desse desequilíbrio.

Na prática, a eficácia desse processo ficou a desejar.

Obras federais são importantes e de fato podem facilitar o desenvolvimento das regiões mais pobres, mas, não fosse o próprio esforço regional, com atração de investimentos privados (que, por sua vez, viabilizaram investimentos públicos estaduais e municipais), o desequilíbrio teria se acentuado.

É mais do que razoável que o Brasil comece a fazer o caminho inverso e siga no rumo da desconcentração dos recursos federais.

A redivisão das receitas de royalties e participações especiais não ajudará nessa desconcentração. É provável que até a agrave, pois estados como o Rio de Janeiro e o Espírito Santo correm o sério risco de perder receitas fundamentais para os investimentos públicos em curso ou programados.

Por conta dos royalties, a fatia do Rio de Janeiro no Fundo de Participação dos Estados e Municípios é diminuta. Como bem frisou o senador Francisco Dornelles (PP-RJ), o argumento em favor da redivisão dos royalties serve também para uma mudança nos critérios do Fundo de Participação.

O Estado do Rio de Janeiro é o segundo arrecadador de tributos federais (R$118,1 bilhões no ano passado, só perdendo para os R$228,4 bilhões do Estado de São Paulo). Os repasses do Fundo de Participação de Estados e Municípios, acrescidos de alguns outros, não correspondem a mais do que 2,4% do valor arrecadado em 2010. Para efeito de comparação, esse percentual foi de 3,4% em São Paulo, 28,9% em Minas Gerais, 76% na Bahia, 220% na Paraíba e 668% no Amapá. Somente o Distrito Federal teve percentual de repasses mais baixo (0,9%) que o do Rio, mas deve-se levar em conta que a União arca diretamente com parte considerável das despesas de serviços básicos da capital.

O senador Dornelles defende uma proposta que destina pelo menos 20% do arrecadado como fatia do estado no Fundo de Participação. No caso do Rio, esse critério significaria um acréscimo de receita anual da ordem de R$23,6 bilhões.

A mudança nos critérios de distribuição do Fundo de Participação não é só oportuna como necessária porque o Supremo Tribunal Federal já decidiu que os vigentes não são mais válidos, e precisam ser alterados em 2012. Pela proposta do senador Dornelles, o novo critério seria uma combinação dessa fatia de 20% com uma participação proporcional à renda por habitante de cada estado e município (quanto mais baixa, maior seria essa fatia adicional). É o primeiro passo na direção de uma reforma tributária que leve à desconcentração dos recursos hoje nas mãos da União.