Título: Brasília, capital do esporte?
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 21/10/2011, O País, p. 4

Na gestão de Agnelo, ministério repassou R$62 milhões

BRASÍLIA E BELO HORIZONTE. O Ministério do Esporte irrigou os cofres do governo e de entidades de Brasília, base política do ex-ministro e atual governador do DF, Agnelo Queiroz, favorecendo apadrinhados do PCdoB e de partidos aliados, suspeitos de desviar verbas. Na gestão de Agnelo, a capital federal foi a segunda cidade do país mais beneficiada com convênios, atrás apenas do Rio, cujo volume de repasses foi alto por conta da preparação do Pan-Americano 2007. Os cofres continuaram abertos nos anos seguintes, sob o comando de Orlando Silva.

Nas duas gestões, é como se Brasília tivesse se transformado na segunda capital do esporte do Brasil, bem à frente de São Paulo, maior cidade do país. Com Agnelo na direção da pasta e ainda no PCdoB - ele se transferiu para o PT em 2008 -, instituições do DF receberam R$62,9 milhões de janeiro de 2003 a março de 2006, menos apenas que as do Rio (R$80,6 milhões). São Paulo teve 16,2 milhões.

Com Orlando, o favorecimento a instituições candangas continuou: R$106,4 milhões foram transferidos; o Rio recebeu R$558,4 milhões. A capital paulista surge em terceiro (R$69,2 milhões) e Fortaleza, em quarto (R$64,7 milhões). Os dados foram levantados pelo GLOBO, com base nos 13.604 convênios firmados desde 2003 pela ministério. Desde então, 17,7% do valor conveniado no DF foi para o governo local (R$30 milhões). O restante (R$139,3 milhões) foi distribuído entre 124 entidades e ONGs do DF.

Oitava instituição que mais recebeu recursos em Brasília, o Sindicato de Clubes e Entidades de Classe Promotoras de Lazer (SinLazer) tem como vice-presidente Antônio Ailton Batista de Oliveira, militante veterano do PCdoB e candidato a deputado distrital nas últimas eleições. Nos documentos do ministério, obtidos pelo GLOBO, ele figura como responsável por dois convênios de R$3,3 milhões. Num deles, R$1,6 milhão foi liberado para oficinas com cinco mil crianças carentes. Mas só 25% foram atendidas, como admite o ministério. Embora exigido no contrato, não foi ofertado transporte. E, apesar do financiamento público, houve cobrança dos beneficiados para aquisição de material esportivo. O sindicato nega irregularidades.

Filiado ao PP, o pastor David Alves de Castro amealhou para a Igreja Batista Gera Vida Internacional R$1,215 milhão, valor que põe a entidade entre as 23 mais favorecidas. Tudo foi repassado, como registra o Portal da Transparência do governo, e o Ministério Público Federal constatou fraudes. Dois dias após firmar licitação para entregar cada lanche a R$0,75 a unidade, a empresa fornecedora pediu reajuste para R$0,94. Mas a entidade foi generosa: aumentou o valor para R$1,50.

Na ação, a Procuradoria da República no DF registra que, embora só 10% dos cinco mil jovens previstos no convênio tenham sido atendidos, a entidade pagou à empresa valor suficiente para alimentar quase todos (R$597,3 mil). Foram apresentados ainda comprovantes de pagamento a profissionais que trabalharam como voluntários.

O Tribunal de Contas da União (TCU) constatou em auditoria que a Federação dos Trabalhadores no Comércio (Fetracom) - 12ª mais beneficiada no DF, com R$2,05 milhões - atendeu menos de 10% das cinco mil crianças previstas. Empresas de parentes da presidente, Geralda Godinho Sales, foram contratadas como fornecedoras. Ela foi nomeada administradora de Riacho Fundo II, região administrativa de Brasília, em 1º de janeiro.

Procurado, o Ministério do Esporte informou que responderia hoje aos questionamentos do GLOBO. O pastor David Alves de Castro e representantes da Igreja Batista Gera Vida Internacional não foram localizados ontem.

O SinLazer explicou que seu convênio foi executado a contento, mas houve problemas operacionais, como na contratação de monitores. A entidade informou que, devido a contratempos, R$700 mil foram devolvidos ao Esporte.

- Dificuldades houve, mas executamos o projeto. E, para o que não foi feito, devolvemos os recursos. Não há nenhuma possibilidade, mesmo que remota, de desvio de verbas - sustenta o diretor administrativo do sindicato, Helvécio Ferreira.

Ele disse que a fiscalização do ministério, terceirizada a uma universidade, errou, vistoriando núcleos esportivos que não integravam o projeto. Segundo o diretor, uma auditoria foi contratada para aferir a regularidade do convênio e contestações encaminhadas à pasta.

Antônio Ailton, vice-presidente do SinLazer filiado ao PCdoB, negou que tenha sido favorecido pela filiação partidária e que tenha participado da gestão do projeto:

- O nosso sindicato aqui era pluralista. Tinha gente do PMDB, do DEM - exemplifica.