Título: Uma realidade à frente do Código Florestal
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Fonte: O Globo, 22/10/2011, Opinião, p. 6

Projeto com uma década de tramitação no Congresso, o Código Florestal ainda promete desavenças. A versão aprovada na Câmara, sob a relatoria do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), contrariou ambientalistas, governo e se encontra no Senado para reparos.

Há pontos de fato espinhosos, como a anistia a crimes ambientais, algo inaceitável. Existem, porém, avanços. Um deles é a possibilidade de o proprietário com uma reserva legal inferior à estabelecida pelo Código compensar a falta da cobertura florestal na mesma região.

Um problema sério é o tempo para a aprovação final da lei. O prazo ideal é antes do final do ano, pois o decreto com pesadas multas sobre proprietários que descumpram o Código foi suspenso para permitir uma nova versão da lei e volta a vigorar a partir de dezembro.

Até lá, feitas alterações no Senado, o projeto terá de retornar à Câmara, onde não poderá ser mexido: os deputados o aprovam ou o substituem pelo projeto anterior. Tudo isso até a virada do ano.

Se vencer a versão da Câmara, é quase certo que haverá vetos por parte da presidente Dilma Rousseff. A briga, então, continuará entre ambientalistas e ruralistas.

Enquanto isso, está em curso um projeto de sustentabilidade em que os objetivos de ambos os lados têm sido atingidos: o produtor rural produz, sem críticas dos ambientalistas. Pelo contrário, eles trabalham ao lado dos fazendeiros e, juntos, têm conseguido desenvolver um modelo de sustentabilidade que alguns consideram existir apenas na teoria ou em sonhos.

O local da experiência bem-sucedida é emblemático: o Pará, até há pouco tempo um dos estados-símbolo da destruição da Amazônia. Este projeto teve início no município de Paragominas, uma espécie de sinônimo de motosserra e queimadas. Até que, com a participação do governo, do Ministério Público e de ONGs, fazendas começaram a ser cadastradas, também para efeito de controle por satélite do desmatamento, e frigoríficos passaram a se comprometer a adquirir gado apenas de pecuaristas dentro da legalidade.

Funcionou, e o modelo foi estendido aos 144 municípios do Pará. Em 2009, eram 600 as propriedades cadastradas; hoje, 40 mil, 89% de todas as propriedades. E assim o desmatamento já caiu 40%, algo como mil quilômetros quadrados, uma área do tamanho da cidade de Belém. Com três anos de projeto, a destruição da floresta retrocedeu 90% em Paragominas.

Fica provado, na prática, que é possível a convivência de atividades produtivas e a preservação. Mesmo atividades em alta escala. Não é apenas o extrativismo que é compatível com a manutenção da floresta em pé. A própria pecuária praticada no Norte do país é rudimentar, de baixa produtividade, e pode ser explorada em áreas muito menores - sem necessidade de derrubar árvores -, com maior rentabilidade.

Não é a primeira vez que o Brasil real demonstra estar muito à frente da burocracia e dos políticos de Brasília. Pois, enquanto eles se engalfinham, muitas vezes em debates estéreis, o país da produção e dos empreendedores encontra as verdadeiras soluções.