Título: BC reafirma aposta à espera de ajuste
Autor:
Fonte: O Globo, 22/10/2011, Opinião, p. 6

Na quarta-feira, reunida no Conselho de Política Monetária (Copom), a direção do BC, por unanimidade, executou mais um corte - o terceiro - de 0,5 ponto percentual na Selic, a taxa básica de juros, fixando-a em 11,5%. A aposta na queda da taxa foi, então, mantida. Circulam, porém, informações de que o Planalto ficaria satisfeito com um corte mais profundo. Ele não aconteceu e, em certa medida, surgiu a esperança de que não passa de um engano achar que o BC se tornou apêndice do Ministério da Fazenda com sua visão heterodoxa da economia brasileira à la décadas de 70 e 80.

Ao manter o curso nos juros, diante da ameaça de uma suposta grave recessão mundial, na prática o BC eleva a responsabilidade da Fazenda no combate à inflação.

Começa a ocorrer uma curiosa inversão de papéis entre BC e Fazenda em relação ao que aconteceu no período de Henrique Meirelles no banco e Guido Mantega já no ministério, no segundo governo Lula. No período, coube apenas ao Banco Central a tarefa de conter a inflação. E assim os juros subiram mais do que seria necessário caso a Fazenda desse alguma contribuição com uma política fiscal responsável. Agora, com o BC ativo nos cortes, a bola está com Mantega.

Não se duvida que a inflação anualizada, até por efeito estatístico, tende a uma relativa perda de fôlego. Bateu na estratosfera - 7,31%, bem acima do limite superior da metade de 6,5% -, e o BC continua a acreditar na volta aos 4,5%, centro da meta, em dezembro do ano que vem. Não parece factível, mas ninguém reconhece derrota na véspera.

A cada redução torna-se mais crucial a Fazenda contrariar sua filosofia e apertar os cintos. Não será fácil, e não só pela falta de convicção em uma política fiscal "ortodoxa". Também há dificuldades práticas diante, entre outros fatores, da propensão da máquina pública brasileira à gastança.

Antes de qualquer outra consideração, 2012 será ano eleitoral, temporada de aumento de despesas, segundo os costumes políticos locais. Coloca-se, então, um ponto de dúvida sobre a margem de contribuição de estados e municípios à formação do superávit primário - fundamental para o pagamento da conta de juros da dívida interna -, bem como à contenção da liquidez.

Além disso, já está contratado um razoável impacto nas contas previdenciárias e em programas assistenciais, a ser provocado por um reajuste na faixa de 14% no salário mínimo, conforme regra de indexação em vigor. Como, dos 28 milhões de segurados do INSS, quase 19 milhões recebem o benefício básico, será grande o volume de dinheiro a ser colocado em circulação. Calcula-se em R$13 bilhões o aumento da despesa previdenciária. Caberá à Fazenda compensar a despesa adicional, e num Orçamento engessado por despesas fixas e muito assistencialismo, área em que os cortes são politicamente difíceis.

Será um retrocesso se houver fracasso da Fazenda nesta missão, e o BC for obrigado a voltar a engatilhar a arma dos juros.