Título: Uribe contra-ataca
Autor: Vaz, Viviane
Fonte: Correio Braziliense, 29/08/2009, Mundo, p. 30

Presidente colombiano cobra apoio efetivo dos vizinhos contra ¿o terrorismo e o narcotráfico¿ e defende acordo militar com os Estados Unidos. Lula questiona eficácia do combate militar às drogas.

O Conselho de Defesa da União de Nações Sul-Americanana (Unasul) falhou ontem em sua prova de fogo de manter os problemas de segurança da região como assunto restrito aos seus chefes de Estado. Na cúpula realizada ontem em Bariloche, na Argentina, o presidente colombiano, Álvaro Uribe, insistiu no acordo militar que permitirá a presença de tropas americanas em sete bases militares de seu país. Pressionado pelos vizinhos desde as primeiras notícias sobre o acerto, Uribe declarou que a parceria ¿está fechada¿, mas pode ser discutida com o Conselho de Defesa da Unasul, ¿porque somos totalmente abertos¿.

Minutos antes, o presidente venezuelano, Hugo Chávez, tinha pedido que o texto pudesse ser visto por todos os presidentes da Unasul, e que Barack Obama respondesse às inquietações da América Latina sobre a estratégia dos EUA para a região. ¿Leio essa pérola do documento (do Comando de Mobilidade Aérea dos EUA): `Buscamos um ponto na América do Sul que possa ser utilizado tanto para operações antidrogas quanto para operações de mobilidade¿¿, recitou Chávez, lendo uma tradução do texto publicado no site da Força Aérea americana. O venezuelano também destacou, da página 22 do documento, o trecho em que os autores afirmam que, a partir da base colombiana de Palanquero (veja o mapa), poderiam cobrir metade do continente com um avião de guerra C-17, sem precisar de reabastecimento e sem risco de detecção por radares.

Uribe devolveu a crítica pedindo que sejam revisados todos os acordos militares dos países da região, seja com vizinhos ou com potências de outras regiões, além das denúncias de tráfico de armas. Sobre a intercepção aérea, o colombiano indicou que vários satélites mostram um enorme deslocamento de voos ilegais do espaço aéreo da Colômbia em direção a outros países. ¿Justamente para evitar isso queremos a integração¿, completou.

Mas a proposta de integração que ele sustenta se distancia do projeto inicial desenhado pelo colega Luiz Inácio Lula da Silva. ¿Quero, de maneira muito carinhosa, dizer ao companheiro Uribe que se as bases estão estabelecidas na Colômbia desde 1952 e ainda não solucionaram o problema (do narcotráfico), acho que devemos repensar que outras coisas podemos fazer¿, discursou Lula. O presidente brasileiro enfatizou que os militares não devem combater o narcotráfico, ¿porque devem fazer outras coisas¿, e sugeriu que o tema fosse discutido pela Unasul no âmbito do Conselho de Combate ao Narcotráfico, proposto pelo Brasil.

Farpas

Uribe e Chávez não conseguiram resistir a um encontro de quase sete horas sem trocar acusações. Elas vieram quase no fim da reunião. O primeiro recordou que o vizinho rendeu tributo a um líder guerrilheiro das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), morto em março de 2008, e qualificou o fato como apologia de um ¿chefe torturador de cidadãos¿. Chávez rebateu dizendo que não responderia ¿às montanhas de mentiras que saem da Colômbia¿ contra seu governo. Uribe ainda alfinetou os colegas, Lula inclusive, ao cobrar dos sócios da Unasul que apontem as Farc como grupo terrorista. ¿Preocupa-nos muitíssimo que ainda sejam dadas (às Farc) conotações políticas às quais renunciaram há muitos anos, e que de vez em quando surja a tese, totalmente inaplicável, de reconhecer o status de força beligerante (para a guerrilha colombiana)¿, destacou.

Ao fim da cúpula, o presidente boliviano, Evo Morales, propôs que todos assinassem um documento para estabelecer que os presidentes sul-americanos não aceitam nenhuma base militar estrangeira na região. A ideia foi concretizada no segundo ponto da declaração final. O último item, introduzido por sugestão da anfitriã, Cristinha Kirchner, instrui os chanceleres e ministros de Defesa a realizarem mais uma reunião extraordinária, em setembro, para discutir uma doutrina de segurança comum.

"O acordo com os Estados Unidos foi aperfeiçoado e está fechado¿

Álvaro Uribe, presidente da Colômbia

"Se as bases estão na Colômbia desde 1952 e não resolveram o problema, acho que devemos repensar¿

Luiz Inácio Lula da Silva, presidente do Brasil

Proposta em Honduras

O presidente de fato de Honduras, Roberto Micheletti, completou ontem dois meses no poder, como chefe do governo instalado após a deposição de Manuel Zelaya, expulso do país em 28 de junho. A novidade é que Micheletti declarou que aceita deixar o cargo se Zelaya renunciar também. Segundo o artigo 242 da Constituição hondurenha, o próximo na linha de sucessão ¿ o atual governante presidia o Legislativo ¿ é o presidente da Suprema Corte de Justiça, Jorge Rivera.

A oferta de Micheletti incluiria uma anistia para o presidente deposto, acusado de crimes como corrupção e abuso de poder. Arturo Corrales, membro da comissão negociadora do governo interino, informou que o plano de anistia deverá ser ainda aprovado pelo Congresso. Corrales também conta com a insistência da Organização de Estados Americanos (OEA) em reconduzir Zelaya ao poder. ¿O senhor Insulza (secretário-geral da OEA) acha difícil que isso (o acordo das renúncias) seja aceito¿, declarou.

No entanto, mesmo sem o reconhecimento da comunidade internacional, o governo interino já está preparando as eleições presidenciais. ¿Falamos com os comandantes que vai haver segurança e proteção para todos os cidadãos que vão votar em 29 de novembro¿, declarou o governante a uma emissora de rádio da capital, Tegucigalpa. ¿Faço um apelo à população para que vote, que eleja um novo presidente, e assim possamos dar garantias ao mundo inteiro de que estamos atuando com democracia e responsabilidade¿, completou Micheletti.

O chefe de Estado eleito assumiria em 27 de janeiro de 2010, mas um movimento popular que respalda Zelaya anunciou uma campanha contra as eleições. Os militantes esperam convencer todos os países a não reconhecer os resultados, nem um novo governo.

Enquanto isso, Zelaya permanece na capital nicaraguense, Manágua. Ontem, ele adiou pelo segundo dia consecutivo uma entrevista coletiva convocada na embaixada hondurenha. Segundo um comunicado lido pela primeira secretária da representação diplomática, Elizabeth Sierra, a conferência será realizada hoje pelo ¿presidente constitucional de Honduras, Manuel Zelaya Rosales, ao se completarem dois meses de resistência do hero ico povo hondurenho¿.