Título: Os insatisfeitos se revezam
Autor: Feuerwerker
Fonte: Correio Braziliense, 30/08/2009, Política, p. 4

O STF é infalível? Longe disso. Só que o Brasil está muito mais bem servido com o atual Supremo do que estaria com um tribunal de última instância composto pelos críticos habituais do STF.

Talvez algum bacharel em direito ou cientista social devesse, num trabalho acadêmico, enveredar pela análise do viés ideológico deste Supremo Tribunal Federal (STF). Ele foi majoritariamente (7 em 11) indicado por Luiz Inácio Lula da Silva, um presidente de esquerda. Entretanto, por mais que esprema a cabeça, eu não consigo chegar a uma conclusão definitiva e irrespondível. Mesmo olhando para algumas decisões da Corte que tiveram grande repercussão política e social.

Vamos pegar oito delas: mensalão, Palocci, células-tronco, Raposa Serra do Sol, Lei de Imprensa, diploma de jornalista, importação de pneus usados, Daniel Dantas. Em quantas o STF foi ¿de esquerda¿, e em quais foi ¿de direita¿? Quando o Supremo ¿dobrou-se aos poderosos¿ e onde ¿cedeu ao populismo¿? Se você tem tempo, uma bolsa de pós-graduação e acha o tema relevante, boa sorte.

Mas se a dificuldade para classificar ideologicamente este Supremo é um obstáculo intelectual, em outro aspecto é um ótimo sinal. Mostra que a Corte talvez constitua um espaço real de construção democrática. Uma instância para dirimir pacificamente divergências tão agudas quanto econômica, política e socialmente motivadas. O que não deixa de ser um alívio. Pelo menos para quem prefere a democracia à ditadura.

O STF é infalível? De jeito nenhum. Só que o Brasil está muito mais bem servido com este Supremo do que estaria com um tribunal de última instância composto pelos críticos habituais do STF. Que Deus nos proteja desta segunda opção.

O tribunal deve pairar acima das críticas? Óbvio que não, mas convenhamos: do que a turba gostaria mesmo seria um STF que decidisse automaticamente a partir da pressão da imprensa, dos decibéis da rua ou da vontade e conveniência do poder. O tribunal tem agido assim? Não, e o melhor sintoma é precisamente o revezamento dos insatisfeitos. Uma hora uns, outra hora outros.

Interessado em identificar potenciais ditadores? Procure pelos donos da verdade. Aliás, o número deles vem crescendo conforme a radicalização e a luta sem limites se consolidam no modus operandi da política pátria. Aqui, um problema: se a verdade tem cada vez mais donos, também é fácil verificar que eles, infelizmente, nunca estão todos de acordo entre si.

E então, como resolver? No braço? No grito? Na desqualificação?