Título: Motorista diz ter sido ameaçado duas vezes
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 23/10/2011, O País, p. 3

Célio Soares, que afirma ter entregue R$1 milhão ao ministro, acusa pessoas ligadas a ONGs

BRASÍLIA. O motorista Célio Soares, uma das principais testemunhas dos supostos desvios de dinheiro do Ministério do Esporte, afirmou ontem que recebeu ameaças de agressão de duas pessoas ligadas a Organizações Não Governamentais (ONGs) suspeitas de envolvimento em irregularidades. Uma das tentativas de coerção teria partido do irmão de um político petista de Brasília. A outra ameaça teria como origem um homem que teria relações com a ONG Instituto Liga de Futebol Society. Em entrevista ao GLOBO ontem, o motorista reafirmou ter levado R$1 milhão para o ministro do Esporte, Orlando Silva, que nega com veemência.

Soares está intimado para depor hoje na Comissão de Fiscalização e Controle da Câmara. O motorista disse que os dois responsáveis pelas ameaças estiveram na casa dele em Sobradinho, na semana passada. Como não encontraram o motorista, os dois teriam deixado com familiares recados ameaçadores. Desde então, Soares não anda sozinho. Só se movimenta em Sobradinho, cidade-satélite de Brasília, na companhia de amigos. Soares foi motorista de Fredo Ebling, ex-candidato a deputado federal pelo do PCdoB e um dos principais aliados de Orlando no partido.

- Um ficou lá em casa e falou para minha mãe que eu não sabia onde eu estava entrando. Que eu ia me lascar todinho. O outro também ficou lá meia hora me esperando. Falou para eu tomar cuidado por onde eu estaria entrando. Deixou esse recado com a menina que trabalha lá em casa - disse Soares, em entrevista gravada.

Célio diz que usou credencial para entrar na garagem do ministério

Esta é a primeira vez que Célio Soares rompe o silêncio que se auto-impôs após declarar à revista "Veja", há duas semanas, que tinha levado R$1 milhão para Orlando Silva na garagem do ministério. Numa longa conversa, o motorista reafirmou que recolheu e levou uma caixa de dinheiro para o ministro em novembro ou dezembro de 2008. Ele teria recolhido o dinheiro com dirigentes de ONGs beneficiadas pelo programa Segundo Tempo a mando de Fredo e, em seguida, transportado o dinheiro numa caixa de papelão até a garagem do ministério.

Ele relata que entrou na garagem do ministério com uma credencial fornecida por Fredo, parou o carro ao lado do carro oficial do ministro e, em pouco tempo, entregou a encomenda. O motorista do ministro teria ajudado a carregar a caixa do porta-malas de um carro para o outro. Segundo ele, a ajuda era necessária para evitar que o peso do dinheiro arrebentasse a caixa.

- Levei um R$1 milhão em notas de R$50, R$100. Parei do lado, desci, abri o porta-mala do carro, peguei o dinheiro. O motorista abriu o porta-mala do carro oficial. Fui eu quem botou com a ajuda do motorista - disse Soares.

Segundo ele, o motorista estava no banco de trás do carro e perguntou pela saúde de Fredo. O militante do PCdoB teria contraído uma virose e não pode comparecer ao compromisso com o ministro.

- Só perguntou se o Fredo estava melhor. Falei : "tá melhorando" - disse.

O motorista sustenta ainda que, a pedido de Fredo, recolheu o dinheiro com dirigentes de ONGs. Ele diz ter recebido R$200 mil do ex-jogador de futebol Toni Matos e de Hilton, ex-funcionário do Ministério do Esporte. Ele teria recolhido ainda outros R$300 mil com Geraldo Nascimento, apontado como um dos laranjas de seis empresas acusadas de fornecer notas fiscais falsas para dirigentes de ONGs.

Soares disse que recolheu o dinheiro próximo à sede da Associação Toni Matos, em Sobradinho. Ex-jogador ligado ao PCdoB, Matos tem vínculos com quatro ONGs financiadas com recursos do Ministério do Turismo. Procurado pelo GLOBO, o ex-jogador negou que tenha repassado dinheiro ao ministro.

- É tudo mentira. Não tem nada disso - disse Matos, segundo relato de uma funcionária da associação.

Procurados pelo GLOBO, os dois acusados por Célia pelas ameaças não foram localizados. Célio Soares tem 30 anos e seis filhos. Ele foi apresentado a Fredo em 2006 pelo policial João Dias Ferreira, delator de supostas fraudes no ministério. Soares trabalhou para Fredo entre 2007 e 2008. Hoje, Célio Soares faz bico para um sindicato de jogadores de Sobradinho.