Título: Conflitos rondam 24 hidrelétricas na Amazônia
Autor: Melo, Liana
Fonte: O Globo, 30/10/2011, Economia, p. 38/39
Ambientalistas, indígenas, ribeirinhos e promotores de Justiça se unem contra usinas. Governo considera que disputa é normal
Antes mesmo de sair do papel, os grandes projetos de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) já nascem maculados por conflitos socioambientais. Indígenas, ribeirinhos, ambientalistas, ONGs de direitos humanos, promotores e até prefeituras viraram uma espécie de pedra no sapato do governo, que elegeu o setor elétrico como força motriz da Amazônia Legal. O objetivo é dobrar a participação da região na geração elétrica do país, pulando de 10% para 20% em 2020.
Em maior ou menor intensidade, as 24 usinas hidrelétricas programadas para a região, que envolvem investimentos de, no mínimo, R$30 bilhões, estão envolvidas em conflitos. Deste total, metade está em construção e outras 12 em fase de outorga. O exemplo mais emblemático é o da hidrelétrica de Belo Monte, a maior usina em construção no país e carro-chefe do PAC. Só que as usinas de Teles Pires, Colíder, Sinope e São Manoel também estão na mira dos adversários das novas hidrelétricas.
- São tantos os interesses econômicos envolvidos em Belo Monte que fica difícil até saber contra quem estamos lutando. Não sabemos direito quem são os verdadeiros réus - admite o procurador Felício Pontes, do Ministério Público Federal (MPF), em Belém, e autor de cinco das 12 ações movidas contra o empreendimento. - Se o governo obedecesse a Constituição e cumprisse a legislação ambiental, talvez tivéssemos menos oposição.
Se depender de Pontes, a intenção do governo de turbinar a geração elétrica no país em mais 51.111.651 kW não será tarefa fácil. O inimigo comum é o PAC Energia, cuja estimativa de investimentos é de R$1,092 trilhão e somente em geração de energia elétrica estão previstos recursos da ordem de R$136,6 bilhões.
- É muito difícil ter unanimidade em qualquer projeto. Acho normal existirem grupos contra e a favor. Seria estranho se fosse diferente - avalia o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Maurício Tolmasquim, minimizando o fato de Belo Monte ter ganho expressão internacional, na última semana, ao virar tema de uma reunião na Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), da Organização dos Estados Americanos (OEA), para discutir violação de direitos humanos.
Projetos atingem 132 terras indígenas na Amazônia
Dados do Conselho Tutelar de Altamira, onde está o canteiro de obras da usina, indicam que, nos últimos seis meses, a violência sexual contra crianças e adolescentes aumentou 138%. E a usina não é a única hidrelétrica a atingir terras indígenas. Já são 132 aldeias espalhadas pela Amazônia Legal afetadas por 127 projetos de energia elétrica, segundo levantamento do Conselho Indigenista Missionário (Cimi).
- A ocupação liderada pelos indígenas em Belo Monte, na última semana, foi a apenas a primeira de uma série - afirma Saulo Feitosa, secretário-adjunto do Cimi, apostando em novas ocupações.
No caso da usina de São Manoel, no Rio Teles Pires, na divisa entre o Pará e o Mato Grosso, o governo terá que traduzir os estudos de impacto ambiental da usina para as línguas indígenas dos povos afetados pela obra. A decisão foi tomada depois de os índios kayabis e mundurukus fazerem reféns funcionários da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e da Fundação Nacional do Índio (Funai).
LEIA AMANHÃ na Logo, a página móvel, o relato de um sociólogo sequestrado por índios na Região Amazônica