Título: Do escândalo da cueca a estrela em ascensão
Autor: Lima, Maria
Fonte: O Globo, 30/10/2011, O País, p. 20

Mais um escândalo do PT, o primeiro "dinheiro na cueca" protagonizado pelo deputado José Nobre Guimarães (PT-CE) e seu ex-assessor parlamentar petista José Adalberto Vieira da Silva, aos poucos, também vai virando piada de salão. Como o mensaleiro João Paulo Cunha (PT-SP), que foi reabilitado e dirige hoje a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a principal comissão da Câmara, o suposto dono dos US$100 mil transportados na cueca de Adalberto, no auge do escândalo do mensalão, em junho de 2005, é uma estrela em ascensão e galga, a passos largos, postos de comando na Casa.

Guimarães é vice-líder do governo e despacha em reuniões no gabinete do líder Cândido Vaccarezza (PT-SP). O próximo passo é assumir a liderança do PT na Câmara em substituição a Paulo Teixeira (PT-SP), em fevereiro.

Em seu segundo mandato de deputado federal, o irmão do ex-deputado José Genoino - como ainda é apontado por muitos no Congresso apesar de já ter estrela própria - não esconde o prestígio que adquiriu no comando de articulações para votação de matérias estratégicas para o governo.

Ele foi o relator da MP que instituiu o polêmico Regime de Contratação Diferenciada (RDC) para obras da Copa de 2014. E colaborou, entre outras matérias, com o projeto que definiu regras mais rígidas para crimes de lavagem de dinheiro, em parceria com o líder Vaccarezza, e que foi aprovado semana passada no plenário.

Quando o ex-presidente Lula e o PT viviam o auge das revelações diárias do mensalão, em 2005, o flagra do que ficou conhecido como o caso dos "dólares na cueca" foi mais um baque no governo. Foram denunciados pelo Ministério Público o então deputado estadual José Nobre Guimarães e o ex-auxiliar flagrado no aeroporto em São Paulo, no dia 8 de julho, com US$100 mil na cueca e mais R$209 mil numa mala.

A investigação aponta que o dinheiro, que seria usado em campanhas políticas no Ceará, era fruto de propina cobrada de um contrato de financiamento de R$300 milhões, fechado entre o BNB (Banco do Nordeste) e o consórcio Alusa/STN (Sistema de Transmissão do Nordeste). A ação ainda tramita na 10ª Vara Federal de Fortaleza. Mas, no Congresso, a previsão é a de um futuro próximo com mais poderes para Guimarães.

- O Guimarães é imbatível para assumir a liderança do partido. O processo (da eleição do líder) começa em dezembro, mas ele já está se articulando e tem o apoio da CNB e da Novo Rumo (correntes do PT), do presidente Rui Falcão. Ele tem uma presença muito forte na Câmara, dentro e fora do governo e também no PT - diz um dos caciques petistas que o apoiam na disputa interna que Guimarães ainda trava com o paulista Jilmar Tatto pelo cargo de líder.

Interlocutores no PT informam que o ex-presidente Lula estaria estimulando um acordo de revezamento na liderança - Guimarães agora e Tatto em 2013 - para tirar o paulista da disputa pela prefeitura de São Paulo. Todos na Câmara, até deputados da oposição, ressaltam uma característica de José Guimarães: é um parlamentar pragmático. E ele é defendido também pelo adversário na disputa pela liderança.

- Não tem dinheiro na cueca nenhum! Isso foi com um assessor dele, demitido sumariamente. Tem um acordo: o Guimarães fica de líder um ano, e eu, o outro ano - diz Tatto, negando, no entanto, acordo sobre eleições. - Mas vincular isso à eleição de São Paulo é sacanagem.

- O episódio do dinheiro na cueca é um assunto interditado para o Guimarães. Ele é uma pessoa muito afável, mas só quando esse assunto não está em pauta - diz o ex-companheiro de partido, deputado Chico Alencar (PSOL-RJ). - Ele desenvolve o perfil de um parlamentar com boas relações em todos os partidos, mas é linha-dura nas negociações de matérias do governo. É pragmático ao extremo! E encarna o perfil do novo petista não muito ideologizado (sic), que não tem nenhum problema em enterrar o passado histórico.

"Coisa mais sem nexo do mundo"

Guimarães também lidera reuniões semanais ora em restaurantes ora em apartamentos dos participantes de um grupo chamado no passado de G13, que reúne petistas de alto calão no Congresso. Articula, negocia e dá entrevistas sobre os projetos em discussão, mas não gosta mesmo de ser abordado sobre escândalo do dinheiro na cueca.

Ele foi processado no Conselho de Ética da Assembleia Legislativa do Ceará, para perda de mandato, mas foi absolvido. E chegou a ter bens bloqueados, mas em 2006 o desembargador federal Napoleão Nunes Maia, do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em Recife, concedeu liminares retirando do processo dos dólares na cueca seu nome e os de diretores do BnB.

Na época Guimarães se defendeu dizendo que a denúncia era a "coisa mais sem nexo do mundo, um fato absolutamente absurdo e um atentado ao estado democrático de direito". Afirmou que o objetivo da denúncia era prejudicar a ele e incriminar o PT. O deputado não foi encontrado pela reportagem do GLOBO na sexta-feira.