Título: Contra perdas de R$125 bilhões
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 10/11/2011, Economia, p. 23
Milhares de pessoas devem ir às ruas hoje para evitar garfada de projeto que reduz royalties fluminenses
ORio de Janeiro realiza hoje uma megamobilização em defesa das receitas do petróleo do estado e seus municípios durante passeata que sairá da Candelária, às 15h, com representantes da sociedade civil, da classe política e do setor produtivo. Mais de cem mil pessoas são esperadas no protesto. Foi decretado ponto facultativo para os servidores estaduais e municipais depois das 14h, exceto para hospitais, Guarda Municipal, agentes de trânsito e escolas, os chamados serviços essenciais. A iniciativa tenta barrar na Câmara a proposta de redivisão das receitas do petróleo aprovada pelo Senado, que amplia para R$125,6 bilhões até 2020 as perdas fluminenses com legislações desfavoráveis ao Rio, como as do ICMS sobre petróleo e energia e do Fundo de Participação dos Estados (FPE).
O levantamento, inédito, foi feito a pedido do GLOBO pela secretaria de Fazenda do Estado e pelo economista José Roberto Afonso. O rombo ao qual chegaram é quase duas vezes o orçamento anual total da União para a Saúde.
Sozinho, o texto do senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) gera um prejuízo de R$48,8 bilhões com os royalties aos cofres fluminenses, que já estarão perdendo R$64 bilhões pelas regras do ICMS para o petróleo e outros R$13 bilhões pelo sistema de rateio do FPE, condenado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
- Estão querendo jogar o Rio para baixo novamente. O estado vem de um processo de esvaziamento muito grande e está melhorando a olhos vistos. O Rio não vai aceitar o que estão querendo fazer - afirmou o senador Lindbergh Farias (PT-RJ).
Texto muda rateio em áreas licitadas
O projeto aprovado no Senado no dia 19 de outubro superestima a arrecadação futura e muda o rateio das receitas em áreas já licitadas. No caso da Participação Especial (PE), os estados produtores, que hoje têm 40% das receitas, passariam a 34% em 2012 e a apenas 20% em 2020. Para os municípios produtores, a redução seria dos atuais 10% para 5% e 4%, respectivamente.
Para os royalties, estados e municípios, que recebem 26,25% do bolo cada hoje, passariam a 20% e 4%, respectivamente, em 2020. Só o Rio e suas cidades perde ano que vem mais de R$3 bilhões caso as mudanças virem lei.
Desse modo, os estados não produtores já passariam a receber a partir de 2012 uma parcela de 20% do total dos royalties, em vez do atual 1,75%. O percentual chegará a 27% até 2020. Os mesmos percentuais seriam atribuídos no mesmo período aos municípios não produtores, que hoje recebem 7% do total. Com a redivisão da PE, estados e municípios não produtores, que hoje nada auferem, passariam a ganhar 9,5% em 2012 e 15% em 2020.
As perdas promovidas pelo projeto se somam aos prejuízos históricos do Rio com o que deixa de receber pelo ICMS e pela equação definida logo depois de promulgada a Constituição de 1988 para a distribuição dos recursos federais entre os entes da federação pelo FPE.
Os royalties servem como compensação pelas áreas exploradas e pela perda de receitas do ICMS. Com as mudanças na Constituição de 88, instituiu-se que a cobrança do tributo estadual se daria no local de destino do produto e não de origem. Ou seja, o Rio só recebe o ICMS do petróleo quando o consome.
Isso não acontece com a produção de outros setores da economia brasileira, como o da soja e carne no Mato Grosso, ou o de automóveis em São Paulo. Segundo o senador Lindbergh Farias, o Rio, que recebia 3,2% da arrecadação de ICMS sobre petróleo até 1989, passou a ganhar 1,53% a partir de então.
Nos últimos meses, os produtores se disseram abandonados pelo Planalto e acusaram os negociadores do Executivo, em especial a ministra das Relações Institucionais, Ideli Salvatti, de agir em prol dos não produtores. Encurralados nos corredores do Parlamento, os produtores aumentaram a pressão para que o Planalto se envolva de cabeça na discussão e realizam hoje uma grande mobilização nas suas capitais.
Uma grande manifestação está planejada também para a capital capixaba hoje e deve reunir pelo menos dez mil pessoas na Praça dos Namorados, em Vitória, a partir das 14h. O projeto que está sendo discutido no Congresso impõe ao estado - segundo maior produtor do país - uma perda de receitas de R$4 bilhões até 2015 apenas em royalties e participação especial.
O senador Vital do Rêgo (PMDB-PB) prevê um "levante nacional" de prefeitos cobrando a votação do veto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à chamada Emenda Ibsen, caso sua proposta não seja votada na Câmara dos Deputados em 2011. Ele teme que esse instrumento seja utilizado para "fins procrastinatórios" e que a votação não aconteça antes do recesso, que começa em 22 de dezembro.
Sem acordo, opções são veto e Supremo
Os senadores da base aliada já apresentaram propostas alternativas, que o governo não aceitou. Entre elas estão o aumento da alíquota dos royalties de 10% para 20% nos campos que vierem a ser licitados. Além disso, o líder do PP no Senado, Francisco Dornelles (RJ), defende a revisão dos valores pagos a título de PE, que estariam defasados. Hoje, somente 14 dos 300 campos em produção pagam o tributo.
- Desde 1997, não há correção de valores. Hoje as petroleiras pagam o menor imposto do mundo. Não existe país no mundo onde o petróleo pague tão pouco imposto - afirmou Dornelles.
Lindbegh defende ainda a cobrança de um imposto de exportação sobre o petróleo. Dornelles afirma que a estratégia do Rio é apresentar novamente um projeto próprio na Câmara, para buscar a negociação. Se esta batalha for perdida, há dois caminhos a frente: pedir à presidente Dilma Rousseff que vete a proposta ou, se isso der errado, recorrer ao STF.