Título: Emprego menor faz índice municipal recuar
Autor: Ribeiro, Fabiana; Melo, Liana
Fonte: O Globo, 06/11/2011, Economia, p. 31

Crise global afeta mercado de trabalho das principais cidades, o que faz desenvolvimento social cair pela 1ª vez em 4 anos

Fabiana Ribeiro, Liana Melo, Letícia Lins e Naira Hofmeister

RIO, IPOJUCA (PE) e PORTO ALEGRE. Foram os municípios mais industrializados do país, ou aqueles que concentram a maior parcela da mão de obra formal, as maiores vítimas da crise financeira de 2008. O mercado de trabalho encolheu 30% em 2009, afetando mais fortemente as cidades com maior grau de formalidade. Uma retração que fez o Índice Firjan de Desenvolvimento Municipal (IFDM) recuar pela primeira vez em quatro anos. Saiu de 0,7649, em 2008, para 0,7603 em 2009. O impacto da crise fica claro nas capitais do país: a vertente emprego e renda recuou em 14 delas. Nas regiões Sul e Sudeste, a única exceção foi Florianópolis.

Se, por um lado, o indicador de emprego e renda recuou 5,2% em 2009, as notas de educação e saúde subiram de um ano para o outro. Na educação, o índice atingiu 0,7506, numa alta de 2,6% frente a 2008. E na saúde, a alta foi de 0,9%, chegando a 0,8018.

Mas, diante de uma nova crise global, o IFDM impõe a questão: pode a atual turbulência causar os mesmos estragos que a crise de 2008?

- A crise atingiu o emprego formal. Dos 50 maiores mercados, 37 deles recuaram em emprego e renda. Mas o impacto foi mais agudo do que abrangente. Tanto que 69,1% das cidades aumentaram seu IFDM de 2009 - esclarece Guilherme Mercês, gerente de Estudos Econômicos da Firjan. - Hoje o cenário está diferente. O ano de 2009 foi de retração com perda de emprego. O de 2011 está sendo de desaquecimento da economia.

Só 235 municípios com alto desenvolvimento

Marcelo Neri, chefe do Centro de Pesquisas Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV), lembra que a crise de 2008 encontrou a economia brasileira superaquecida e com inflação. A crise atual, diz Neri, também encontrou a economia aquecida. Só que agora os efeitos da crise desaceleraram a economia, o que funcionou como um entrave à inflação.

Com base no tripé emprego, educação e saúde, Barueri, em São Paulo, ficou em primeiro lugar com a seguinte pontuação: 0,9303. O último lugar coube a São Félix de Balsas, no Maranhão, com 0,3413.

Pelo levantamento, o alto desenvolvimento é privilégio de poucos no Brasil. Apenas 235 cidades estão nessa categoria. A esmagadora maioria ostenta um IFDM moderado: 58,7%. Extremos que ratificam que o país, a despeito dos avanços econômicos e sociais, ainda é uma terra de contrastes.

- A distância entre os extremos torna evidente a divisão do país. A média dos cem maiores IFDMs é mais do que o dobro da média dos cem menores. Mas o país está menos desigual, especialmente quando observamos os avanços do Centro-Oeste - acrescenta Mercês.

Mas o Brasil estaria avançando num ritmo satisfatório?

- Ainda é longo o caminho para o Brasil se tornar um país de alto desenvolvimento. Se esse ritmo prosseguir o mesmo, somente no ano de 2037 é que o Brasil terá garantido à população pleno atendimento básico de saúde, ensino fundamental de qualidade e ampliação do mercado formal de trabalho - complementou Mercês. - O atraso do desenvolvimento do Nordeste frente ao Sudeste é de dez anos. Já o do Norte é o dobro.

O impacto da turbulência, entretanto, não foi o mesmo para as 5.564 cidades brasileiras. Apesar de mais concentrado nas metrópoles, a redução do emprego chegou também a pequenas cidades. A que mais sofreu com a retração no mercado de trabalho foi Caridade do Piauí, no Piauí, cuja nota no quesito emprego caiu 84,42%. Seu contraponto foi o município pernambucano de Ipojuca, que virou uma espécie de eldorado do emprego no Nordeste, sustentado pelo renascimento da indústria naval, mesmo no ano da crise.

Apontado no IFDM como o único a atingir a nota máxima na vertente emprego e renda, a culpa é do complexo industrial portuário de Suape. Um total de 114 empresas e 40 mil operários estão mudando o perfil da cidade, que, um dia, esteve associado à produção de açúcar.

- O pessoal que trabalha na cana e não tem qualificação está sendo aproveitado como servente e ajudante de pedreiro no complexo industrial portuário de Suape. Os proprietários de engenho precisam trazer trabalhadores rurais de outros estados - afirma Gerson Carneiro Leão, presidente do Sindicato dos Cultivadores de Cana de Pernambuco.

Educação básica melhorou em 80% das cidades

O avanço reflete a melhoria da educação básica em quase 80% dos municípios brasileiros. Nesse quesito, as cidades de São Paulo mantiveram a sua supremacia no ranking da educação.

- As mudanças verificadas hoje na educação começaram a ser plantadas nos anos 90 - afirma o pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) Marcelo Medeiros, comentando que o "país precisa acelerar as mudanças". - Não basta olhar para trás, precisamos mirar o futuro. Temos que superar a barreira da massificação do ensino e elevar a qualidade da educação no país.

Na avaliação de Medeiros, a educação está passando por um momento similar ao que está ocorrendo com a saúde. E o Rio Grande do Sul é um exemplo positivo de como é possível avançar com pouco dinheiro e muita criatividade.

Mesmo investindo abaixo do percentual mínimo na saúde (12% do orçamento), o estado vem melhorando seus indicadores sem ampliar os repasses. O segredo tem sido uma combinação de boa gestão e muita criatividade. Entre 2007 e 2010, por exemplo, a taxa de mortalidade infantil diminuiu de 12,7 óbitos por mil nascidos para 11,2 mortes de bebês a cada mil nascimentos.