Título: Extraoficial e dissimulado
Autor: Pariz, Tiago; Brito, Ricardo
Fonte: Correio Braziliense, 16/08/2009, Política, p. 6

Além dos atos secretos, administração do Senado já usou outro recurso para escamotear decisões, publicando informes com tiragem reduzida apenas para circulação interna

O ex-diretor-geral Agaciel Maia foi um dos responsáveis pela publicação dos boletins extraoficiais. Antonio Carlos Magalhães e Ronaldo Cunha Lima também tiveram envolvimento no caso

A arte de esconder decisões administrativas do Senado ganhou uma nova categoria na semana passada: os atos extraoficiais. Fazem parte desse grupo decisões tomadas entre 1997 e 1998 sobre movimentação de servidores, concessão de gratificações e aviso de licitações apenas para consumo interno da Casa. Os atos extraoficiais constaram de boletins administrativos de pessoal, chamados BAPs, com tiragem reduzida. O Ministério Público Federal não reconhece a validade deles por entender que todo ato da administração pública tem de estar no Diário Oficial do Senado Federal (Dosf).

A reportagem encontrou, em dois momentos, os tais atos extraoficiais, que aparecem em 50 boletins. O primeiro período identificado ocorreu no segundo semestre de 1997. Nesse período foram 14 boletins e 189 atos, tomados em sua maioria pelo ex-diretor-geral Agaciel Maia, pelo ex-presidente do Senado Antonio Carlos Magalhães (DEM-BA) e pelo ex-primeiro-secretário Ronaldo Cunha Lima (PSDB-PB). O segundo período abrange os meses de agosto a outubro de 1998. São outros 36 boletins, nos quais foram tomadas 260 decisões.

Os atos extraoficiais eram, na prática, secretos. No fim da década passada, o Senado não se valia da rede interna de computadores para divulgá-los. As decisões eram publicadas na ocasião por meio de boletins impressos na gráfica, com tiragem de 650 exemplares cada. Somente em 2001, o Sistema de Processamento de Dados do Senado (Prodasen) passou a publicar os boletins em sua rede interna. O alerta de que havia decisões não publicadas no Dosf fora repassado, na última semana, pelos técnicos que trabalharam na identificação dos novos atos secretos.

Em 14 de agosto de 1998, por exemplo, um ato do primeiro-secretário Ronaldo Cunha Lima criou três comissões especiais de licitação para cuidar da contratação de serviços, execução de obras e compra de equipamentos. Entre os 30 indicados, estão Aloysio Brito Vieira e Dimitrius Hadjinicolaou, que chegaram a ser investigados pelo Ministério Público Federal por fraudes em licitações no Senado. Aloysio e Dimitrius são ligados ao ex-primeiro-secretário Efraim Morais (DEM-PB). Curiosamente, consta nesse boletim uma promessa de publicação no Diário Oficial do Senado Federal prevista para o mesmo dia. Virou letra morta.

Nova leva Na última sexta-feira, o Correio já havia identificado, num intervalo de duas edições do Dosf, 396 decisões administrativas tomadas por Agaciel Maia que não foram publicadas. Constam em 46 boletins administrativos. Dez deles eram secretos e foram revelados somente na semana passada, quando veio a público a existência de mais 468 decisões sigilosas. Desde meados de julho, já se conheciam outros 663 atos secretos, dos quais 119 foram revalidados pelo presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).

O atual primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (DEM-PI), determinou a abertura de investigação para identificar os responsáveis pela inclusão dos novos atos secretos, classificados por ele como ¿molecagem¿. Na quinta-feira à noite, o chefe do Serviço de Publicação de Boletim Pessoal, Franklin Paes Landim, admitiu ter inserido na rede interna da Casa os novos atos secretos a pedido de Ralph Siqueira, ex-diretor de Recursos Humanos.

Ralph, que trabalhou na equipe responsável por identificar a primeira leva das decisões sigilosas, deixou o cargo em junho, quando substituiu o antecessor João Carlos Zoghbi na função. Franklin e Ralph devem depor na semana que vem na comissão de servidores designada por Heráclito.