Título: Um novo tratado para a UE
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Fonte: O Globo, 25/11/2011, Economia, p. 27
Alemanha vence queda de braço e costura com França reforma que prevê punição a endividados
Do El País*
Não. Foi o que disse ontem a chanceler Angela Merkel depois de se reunir em Estrasburgo com o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e o novo premier italiano, Mario Monti. Não aos eurobônus. Não aos empréstimos ilimitados do Banco Central Europeu (BCE). E sim à união fiscal e aos castigos para os países indisciplinados. Merkel e Sarkozy anunciaram que apresentarão em breve uma proposta para reformar os tratados da União Europeia (UE) para reforçar a união monetária e fiscal, com sanções aos países desobedientes. Essa proposta será levada aos demais sócios do bloco antes da próxima cúpula, no dia 9 de dezembro. Para Merkel, só há um caminho para estabilizar a moeda comum e recuperar a confiança no euro:
- Uma união fiscal com mais integração política.
A chanceler fez com que Sarkozy, que vinha defendendo uma maior atuação do BCE nos mercados da dívida, afirmasse após a reunião:
- O BCE não está em debate, e não há porque falar da instituição, porque ela é independente.
- Acreditamos em um euro forte, que seja visto como uma moeda estável em todo o mundo, e faremos o impossível para defendê-lo - afirmou Merkel, acrescentando que esta é a razão para reformar os tratados.
Para a chanceler, os problemas atuais se devem à "debilidade da construção política europeia". Merkel continuou inflexível em sua posição contrária aos eurobônus, que, afirmou, "igualariam as taxas de juros de todos os países, o que nos impediria de saber onde estão os problemas". Frente à firmeza da maior economia da Europa, França e Itália tiveram de ceder. Após a reunião, Monti afirmou que os três concordaram que "a prioridade é uma boa saúde da zona do euro".
- Podemos ser teimosos ou recuar - disse Sarkozy. - A França tem uma cultura e a Alemanha, outra, tentamos nos entender o melhor possível, e falo todos os dias com Merkel. Mas acham realmente que concordamos em tudo?
Bancos veem "nova recessão" na Europa
Mas os mercados não gostaram das declarações de Merkel. O retorno sobre os bônus de dez anos alemães atingiu 2,19% - há dois meses, estava em 1,64%, segundo a agência Bloomberg. Sua diferença para os títulos do Tesouro americano (1,88% ao ano) está no maior patamar em 30 meses, sinal de que os investidores estão se desfazendo dos papéis alemães, até há pouco considerados um porto seguro.
- O Titanic e a moeda única não podem continuar em sua forma atual - disse à Bloomberg Stuart Thomson, administrador de recursos da Ignis Asset Management.
A preocupação com a saúde da economia europeia foi reforçada ontem por um relatório do Instituto de Finanças Internacionais (IIF, na sigla em inglês), segundo o qual a situação na zona do euro piorou no último mês, recuando para "uma nova recessão". O IIF, associação que reúne cerca de 400 banqueiros, prevê que a economia europeia vai encolher 1% em 2012. No trimestre corrente, a retração será de 2%.
"A situação na zona do euro deu um forte giro negativo no mês passado. A economia entrou no que consideramos uma nova recessão", afirmou o IIF em um relatório sobre as perspectivas econômicas mundiais para 2011 e 2012. Segundo o instituto, essa nova recessão vai ampliar os déficits orçamentários e enfraquecer ainda mais os ativos financeiros na zona do euro.
A Alemanha, considerada o motor da economia da região, cresceu 0,5% entre junho e setembro, informou ontem o governo, acima do 0,3% registrado no trimestre anterior.
O IIF afirmou que o programa de redução da dívida grega "está espantando os investidores" e que vários países, inclusive a Itália, foram "dolorosamente lentos na hora de adotar reformas". Em posição contrária à de Merkel, ressaltou que só o BCE poderá oferecer um "apoio realista" nas próximas semanas. O relatório ainda alertou que "a debilidade na zona do euro pode estender-se ao resto do mundo".
A intransigência da chanceler alemã ainda foi alvo de críticas da revista "Economist" que chegou às bancas britânicas ontem. Esta diz que Merkel precisa decidir entre ameaçar economias com a exclusão do euro e tranquilizar os mercados prometendo salvar a moeda única, ou "vai descobrir que fizeram a escolha por ela".
Mas o sinal de que Merkel sairia vencedora da reunião de ontem veio antes mesmo de esta começar: o governo francês ofereceu como lanche aos cem jornalistas credenciados salsichas com repolho.
(*) Com agências internacionais