Título: Síria põe Rússia e Turquia em rota de colisão
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Fonte: O Globo, 30/11/2011, O Mundo, p. 31

Chanceler turco se diz pronto para qualquer cenário e estuda plano para escoar exportações. Moscou condena projeto de embargo

ANCARA e DAMASCO. Somente ontem 18 pessoas morreram em ações do Exército da Síria, segundo relataram grupos de direitos humanos à rede de TV al-Jazeera. E a insistência do governo Bashar al-Assad em ignorar os apelos internacionais pelo fim da violência - mesmo sob pesadas sanções decretadas pela Liga Árabe - abriu ontem uma nova frente de batalha diplomática. Desta vez, envolvendo a Rússia e a Turquia. O governo de Moscou pediu o fim dos ultimatos a Damasco e descartou aderir a qualquer embargo de armas ao país. Já a diplomacia de Ancara se disse pronta para "qualquer cenário" no país vizinho, embora tenha ressaltado que prefere não vislumbrar uma intervenção militar. Além de mencionar a possibilidade de criar uma zona-tampão na fronteira, os turcos anunciaram, inclusive, estar estudando uma rota alternativa, via Iraque, para escoar suas exportações sem a necessidade de passar pelo território sírio.

- Esperamos que uma ação militar não seja necessária. O regime sírio tem que encontrar uma forma de paz com seu próprio povo - declarou o chanceler turco, Ahmet Davutoglu.

Patriota defende desmilitarização da Síria

As retóricas acaloradas fizeram o ministro brasileiro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, defender uma desmilitarização na Síria e a manutenção da Liga Árabe no comando das negociações.

- Uma intervenção militar tem que ser autorizada pelo Conselho de Segurança, que está muito dividido quanto à situação na Síria. Até porque não está claro o que uma intervenção militar poderia realizar de positivo - avaliou o ministro.

Analistas locais afirmam que o governo do premier Recepp Tayyip Erdogan deve tentar evitar ao máximo ações militares, mas uma zona-tampão na Síria para evitar um eventual fluxo de refugiados em direção à Turquia pode ser uma opção viável. Existe até um precedente - na primeira Guerra do Golfo, em 1991, a Turquia invadiu o norte do Iraque e declarou uma zona-tampão após a fuga de cerca de 1,5 milhão de refugiados curdos-iraquianos rumo a seu território.

"Se tropas turcas podem violar a soberania síria, sem permissão de Damasco e montar guarda lá? Pode apostar", escreveu o colunista Soner Çagaptay, do jornal "Hurriyet", lembrando, no entanto, que tal manobra drástica ocorreria, provavelmente, diante da eclosão de confrontos em Aleppo, a cerca de 40 km da fronteira com a Turquia. A cidade, maior pólo industrial da Síria, porém, ainda é um dos maiores bastiões de apoio ao governo Assad.

A Arábia Saudita também reforçou o bloco anti-Assad ao pedir a todos os seus cidadãos que deixem o país. Mas, na contramão, o chanceler russo, Sergei Lavrov, não só pediu o fim dos ultimatos ao regime como chamou de injustas as propostas de um embargo de armas à Síria. E criticou o modelo de intervenção usado na Líbia.

- Impor uma proibição contra todas as entregas de armas é bem desonesto. Sabemos como funcionou na Líbia. O embargo se aplicava apenas ao Exército líbio, e a oposição recebeu armas, enquanto países como a França e o Qatar se pronunciaram publicamente sobre isso sem constrangimento.

O Gabinete sírio se reuniu para debater as sanções impostas pela Liga Árabe. O governo de Damasco - cuja política econômica se focou nos últimos anos em um projeto de autossuficiência agrícola - alega estar pronto para sobreviver por muito tempo. Com o escudo político da Rússia e a proteção econômica dos vizinhos Irã, Iraque e Líbano.

Junta militar espera 70% de participação no Egito

Após o segundo dia de votação em nove províncias, o Egito começou na noite de ontem a apurar os votos da primeira rodada das eleições parlamentares. Segundo o Conselho Superior das Forças Armadas (SCAF), o índice de comparecimento pode superar os 70%. Os primeiros resultados estão previstos para serem divulgados ainda hoje.

Manifestantes no Iêmen pedem julgamento a Saleh

Apesar das promessas de um novo governo interino, centenas de milhares de iemenitas foram às ruas de Sanaa e de várias cidades do país para exigir que o ditador Abdullah Saleh seja julgado pela violenta repressão militar a manifestantes pró-reformas e por atos de corrupção. Sem se intimidar, o novo premier, Mohammed Basindwa, se reuniu com opositores e prometeu formar um Gabinete de coalizão "em alguns dias".