Título: Para evitar a falência
Autor: Eichenberg, Fernando
Fonte: O Globo, 30/11/2011, Economia, p. 23

American Airlines, terceira maior do mundo, recorre à recuperação judicial. Ações despencam 84%

AAMR Corp, controladora da American Airlines (AA) - que já foi a maior companhia aérea dos EUA - entrou ontem com pedido de proteção contra falência em uma corte de Nova York. Ao recorrer ao chamado Capítulo 11, a empresa ganha tempo para reestruturar sua dívida de quase US$30 bilhões, que inclui um altíssimo custo trabalhista. A companhia, terceira maior do ranking global em número de passageiros transportados, é a última das grandes aéreas americanas a recorrer à recuperação judicial. Segundo analistas, sua relutância a deixou menos ágil do que seus competidores. Apesar disso, a empresa garantiu que AA e American Eagle - seu braço regional - operarão normalmente, como fizeram Delta e United Airlines ao usarem o mesmo instrumento jurídico. As ações da American recuaram ontem 83,95%.

Além de anunciar sua recuperação judicial, a AMR nomeou Thomas Horton como presidente do conselho e presidente-executivo da companhia, em substituição a Gerard Apley, que foi afastado e se aposentou. A empresa tem ativos avaliados em US$24,72 bilhões, enquanto suas dívidas totalizam US$29,55 bilhões. Em caixa, a companhia tem US$4,1 bilhões.

"Nosso conselho decidiu que era necessário dar este passo agora para restaurar a lucratividade da companhia, sua flexibilidade operacional e sua força financeira", afirmou Horton, em comunicado. Os custos trabalhistas têm sido uma grande dor de cabeça para a AMR. Os salários e benefícios pagos são, em geral, mais elevados que os das rivais que se reestruturaram na última década. Segundo Horton, a AMR é a única grande aérea a ter um fundo de pensão dos trabalhadores. "Planejamos iniciar negociações adicionais com todos os nossos sindicatos para reduzir custos trabalhistas para níveis competitivos", afirmou o executivo.

Analistas veem uma "boa notícia"

Aquela que já foi a maior companhia aérea dos EUA começou a perder terreno quando empresas de baixo custo, como a Southwest Airlines, ganharam espaço. As grandes aéreas responderam com redução de suas tarifas. Mas, com a intensificação da competição, a AMR pegou mais empréstimos, comprometendo seus bens e ficando altamente endividada.

Em 2008, 2009 e 2010, a AMR registrou prejuízo anual, afetada pela crise global. No ano passado, a perda foi de US$471 milhões. Nos nove primeiros meses deste ano, chega a US$982 milhões. E os temores quanto ao futuro fizeram suas ações despencarem 83,95% na Bolsa de Nova York ontem. O papel - que no ano já desabou 96,10% - fechou a US$0,26. Já o valor de mercado da companhia, que em 1997 era de US$11,724 bilhões, ontem era de US$87,15 milhões.

Como parte de um esforço para cortar custos, a American havia anunciado este ano um pedido de US$38 bilhões à Airbus e à Boeing para a renovação de sua frota de mais de 600 aviões - com idade média de 15 anos -, adquirindo 460 aeronaves menores e mais econômicas. Segundo a empresa, o pedido está mantido.

Mas a reestruturação pode influenciar os negócios da Embraer. O grupo americano é importante cliente da fabricante de aviões brasileira, especialmente por meio da American Eagle. Das 281 aeronaves da American Eagle, 216 são jatos da Embraer, segundo informações que constam do site da empresa. Procurada, a Embraer disse que "ainda vai avaliar os efeitos do pedido de concordata" da AMR.

A recuperação judicial já era esperada por analistas do setor. Para alguns, como John Kasarda, diretor do Instituto de Empresas Privadas da Kenan-Flagler Business School, da Universidade da Carolina do Norte, a medida chegou mesmo com atraso.

- A American se colocou em desvantagem em relação as suas maiores concorrentes por não ter solicitado antes proteção contra falência. Por isso, o anúncio não foi algo imprevisto, mas necessário. Não havia escolha. Foi a única grande companhia aérea que não passou por esse processo no rastro da recessão de 2001-2002 - disse.

Kasarda não vê catastrofismo na atitude da companhia e prevê mudanças que possibilitarão seu fortalecimento.

- A empresa vai certamente se reestruturar para manter seus custos sob controle, vai se recuperar e vai voltar a ser mais competitiva. É só ver o que ocorreu com a United e a Delta Airlines, que passaram por processos semelhantes. Ficaria realmente muito surpreso se a AA desaparecesse.

Jan Brueckner, do Departamento de Economia da Universidade da Califórnia e membro do Instituto de Estudos de Transporte, partilha da opinião do colega e analisa a recuperação judicial como "uma boa notícia para o setor e para os passageiros aéreos":

- Será bom para os consumidores. A AA vinha segurando a situação já por um tempo. Será bom para os EUA e para a indústria ter novamente uma companhia mais competitiva. A situação geral do setor nos EUA é boa. Creio que será o último evento desse tipo.

Segundo relatório de agosto da Federal Aviation Administration, do Departamento de Transportes dos EUA, entre 2006 e 2009, a aviação comercial foi responsável por entre 4,9% e 5,2% do Produto Interno Bruto, com a geração de até US$1,3 trilhão anual na atividade econômica, e entre 9,7 milhões e 10,5 milhões de empregos.

(*) Com Danielle Nogueira, New York Times e agências internacionais