Título: Inflação dependerá mais do governo
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Fonte: O Globo, 27/11/2011, Opinião, p. 6

A última reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) no ano, marcada para esta semana, não deve gerar grande polêmica, pois dados recentes evidenciam que ocorreu uma desaceleração na economia, o que diminui os riscos de pressão inflacionária. Assim, reconheça-se que o BC acertou no cortar juros ao apostar no agravamento da situação externa.

Os índices de preços permanecem em patamar desconfortável, em torno do teto (6,5%, no acumulado em doze meses) da meta que deve ser perseguida pelo Banco Central. No entanto, para 2012 as projeções das instituições financeiras, recolhidas pelo próprio BC, apontam para uma trajetória de queda, refletindo esse quadro de desaceleração no Brasil e o fraco desempenho das economias mais avançadas. O Banco Central espera que a inflação caminhe para o centro da meta (4,5%) com uma política monetária que não dependa tanto de taxas básicas de juros muito elevados. De fato, não é possível que os juros possam ser mantidos em níveis bem acima das médias internacionais sem que surjam discrepâncias nos custos de capital e nos fluxos financeiros da economia brasileira.

Desse modo, para que a política monetária não se apoie somente em juros elevados o Banco Central precisa de forte colaboração do governo como um todo, pois, sendo o setor público isoladamente o maior agente econômico, o impacto dos seus gastos sobre a demanda de bens e serviços é enorme.

O setor público é deficitário no Brasil porque, por óbvio, o total das despesas supera o das receitas. Porém, ao se excluir os encargos financeiros da conta de despesas o resultado vem sendo positivo. Tal saldo, chamado de superávit primário, é hoje o caminho para se reduzir os desequilíbrios que desembocam em mais inflação. Em 2011, tudo indica que o superávit primário ficará acima de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), montante que os especialistas consideram essencial para que o endividamento público diminua relativamente.

Se a dívida pública se reduz como proporção do PIB, para financiá-la, o Tesouro precisa avançar menos sobre a poupança disponível na economia. A poupança que é liberada será então atraída para investimentos, que ampliarão as condições favoráveis e a capacidade de crescimento da própria economia, formando um ciclo de expansão sustentável.

Portanto, o ajuste macroeconômico deve ter como eixo o bom desempenho da política fiscal. A redução das taxas básicas de juros - e do componente financeiro do déficit público - será mais consequência do que causa desse processo. Após o desatino de 2010 - em função das eleições -, as autoridades econômicas perceberam que este ano precisariam recolocar a política fiscal de volta a esse eixo. E alguns resultados até já têm sido colhidos. Mas é preciso depender menos de aumentos de arrecadação e cortes nos investimentos para equilibrar as contas.

Se a austeridade fiscal for preservada como um dos principais pilares da política econômica em 2012, tal atitude certamente renderá novos frutos. E o Banco Central não ficará de mãos atadas, tendo de um lado a inflação escapando das metas que deve perseguir, e de outro, a necessidade de ajustar as taxas básicas de juros a valores mais próximos de padrões internacionais. É uma preocupação que o Copom não poderá deixar de ter no ano que vem.