Título: Orçamento pró-Dilma
Autor: Verdini, Liana; Gonçalves, Daniel
Fonte: Correio Braziliense, 01/09/2009, Econoia, p. 14

Governo deixa crise para trás, projeta crescimento de 4,5% em 2010, turbina as receitas e garante aumento a funcionalismo em ano eleitoral

Luciano Pires

José Cruz/ABr Paulo Bernardo entrega proposta a Sarney, que prevê investimentos de R$ 97 bilhões pelas estatais

O Orçamento preparado para o último ano de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva vê a crise econômica pelo retrovisor e blinda áreas consideradas estratégicas. Enviado ontem ao Congresso Nacional, o relatório traça cenários otimistas para 2010, como inflação baixa, juros estáveis, receitas e investimentos públicos em alta. Dentro da previsão oficial de gastos, as prioridades são as políticas sociais, as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e os reajustes prometidos ao funcionalismo federal.

A elaboração da proposta tomou como referência dados recentes que indicam a recuperação dos principais setores produtivos, além da retomada sustentável do consumo e do emprego. O ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, disse que o texto é realista. ¿Ficamos tentados a botar 5% para o Produto Interno Bruto (PIB), até porque muita gente já está falando nisso por aí, mas achamos melhor ficar nos 4,5% mesmo¿, explicou.

Além da recuperação do crescimento, a peça orçamentária prevê que o dólar ficará em R$ 2,01, a taxa básica de juros (Selic) se manterá em 8,75% e o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ¿ a inflação utilizada pelo sistema de metas ¿ encerrará o período em 4,33%. Segundo Bernardo, as transferências de recursos da União para os estados também devem melhorar. Em um ano eleitoral, essa é uma sinalização importante para os partidos que pretendem apoiar a candidatura da ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, à Presidência da República.

A perspectiva de que o pior já passou motivou o governo a turbinar as previsões de receitas e despesas primárias: em 2010, a intenção é arrecadar R$ 853 bilhões e gastar R$ 802 bilhões. O aumento dos investimentos federais e aqueles bancados pelas empresas estatais segue a mesma lógica. A estimativa é injetar R$ 46 bilhões ¿ R$ 7 bilhões a mais do que em 2009 ¿ em recursos fiscais, e desembolsar outros R$ 97 bilhões em novos investimentos por meio das empresas públicas, acima dos R$ 79,4 bilhões definidos para 2009.

Salários

Os gastos com os servidores estão assegurados. Na complexa equação entre receitas e despesas esperadas para o próximo ano, o Palácio do Planalto preservou os recursos destinados ao crescimento nominal com a folha de pagamento. De acordo com o ministro Paulo Bernardo, tudo foi considerado e as contas públicas permanecerão sob controle. ¿Mantivemos os gastos com pessoal assim como fizemos em 2009. Como proporção do PIB essa conta vai ficar estável. Não vai haver esse aumento todo¿, completou.

A ampliação das despesas com o funcionalismo é o que mais preocupa os analistas de mercado. Os reajustes salariais autorizados em 2008 ¿ e que beneficiam cerca de 1,8 milhão de servidores ¿ têm impacto estimado em R$ 29 bilhões neste ano e de R$ 40 bilhões em 2010. Cerca de 60 carreiras do Executivo federal já receberam parcelas do reajuste nos contracheques. Novos percentuais estão previstos para incidir sobre as remunerações dos servidores no próximo ano. De olho na sucessão de Lula, o Palácio do Planalto está disposto a brigar no Congresso pela manutenção dos reajustes.

Dentro do Orçamento 2010 estão reservados aproximadamente R$ 23 bilhões ao PAC. O programa Minha Casa, Minha Vida conta com pelo menos R$ 10 bilhões em subsídios. Orientados pelo governo, os partidos da base aliada vão proteger essas verbas contra qualquer tentativa de corte. Bernardo admitiu que a tarefa não será fácil, especialmente por causa do clima de enfrentamento instalado no Senado e pela proximidade das eleições presidenciais. ¿Sempre que tem eleição o pessoal fica mais agitado para votar, mas não vejo motivo para não votar¿, reforçou.

O relator-geral, deputado Geraldo Magela (PT-DF), disse que o Orçamento deverá ser votado até 22 de dezembro. Magela pretende se reunir com os colegas nas próximas semanas para definir o plano de trabalho a ser seguido. O parlamentar reforçou que a disposição é aprovar o Orçamento dentro dos prazos para evitar o desgaste provocado pelo início antecipado do debate eleitoral. Magela destacou ainda que as despesas prioritárias são ¿intocáveis¿ dentro do projeto original enviado pelo Executivo.

Parâmetros

IPCA - 4,33% Taxa Selic - 8,75% Câmbio (R$/US$) - 2,01 PIB - 4,5% Investimentos das estatais - R$ 97 bilhões Investimento fiscal - R$ 46 bilhões Receita primária - R$ 853 bilhões Despesa primária - R$ 802 bilhões

Fonte: Ministério do Planejamento

Servidor engole ganho com juros

Vicente Nunes José Cruz/ABr - 24/1/08 Arno Augustin vem garantindo que o superávit primário será cumprido

O aumento dos gastos com pessoal nos primeiros sete meses deste ano superou em R$ 1,2 bilhão toda a economia que o governo teve no mesmo período com a queda dos juros da dívida pública. Dados divulgados pelos secretário do Tesouro Nacional, Arno Augustin, mostram que a folha de salários dos servidores inchou R$ 13,9 bilhões, passando de R$ 72,6 bilhões entre janeiro e julho de 2008, para R$ 86,5 bilhões em igual prazo deste ano. Já os gastos com juros recuaram R$ 12,7 bilhões, de R$ 107,8 bilhões para R$ 95,1 bilhões.

O governo vinha contando com a ajuda da redução dos juros para amortecer seu ímpeto gastador. Mas, segundo os analistas, o que se está vendo é um certo exagero em despesas com o funcionamento da máquina. Nas contas dos especialistas, o aumento dos servidores até julho foi pouco perto do que está por vir, pois, somente com as categorias às quais foram prometidas correções salariais, o impacto nos cofres do Tesouro neste ano será de R$ 29 bilhões.

Não é à toa, na avaliação da economista-chefe do Banco Fibra, Maristella Ansanelli, que está crescendo a preocupação com as contas públicas. Para o economista-chefe da Corretora Convenção, Fernando Montero, com o aumento de gastos e queda da arrecadação, o governo só cumprirá a meta de superávit primário neste ano, de 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB), se recorrer aos R$ 15 bilhões que estão depositados no fundo soberano.