Título: Merkel e Sarkozy propõem novo tratado europeu
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Fonte: O Globo, 06/12/2011, Economia, p. 27
Para salvar o euro, líderes querem que sejam punidos os países onde o déficit público for superior a 3% do PIB
Do El País*
PARIS. Entre beijos, sorrisos e gestos de cumplicidade, o presidente francês, Nicolas Sarkozy, e a chanceler alemã, Angela Merkel, anunciaram ontem no Palácio do Eliseu que chegaram a um acordo para "salvar o euro", "reforçar e harmonizar" a integração fiscal e orçamentária da Europa. Para isso, será preciso estabelecer um novo tratado para a União Europeia (UE) até março. A mudança - que inclui sanções aos que não cumprirem a chamada regra de ouro, ou seja, o equilíbrio de suas contas públicas, e reuniões mensais dos chefes de Estado e de governo durante a crise - pode incluir os 27 países do bloco ou apenas os 17 integrantes da zona do euro, com os demais aderindo voluntariamente.
- Queremos sanções automáticas para o caso de não respeitarem a regra dos déficits inferiores a 3% (do Produto Interno Bruto) - disse Sarkozy, ressaltando que o Tribunal de Justiça europeu "não poderá anular nem declarar ilegal um orçamento". - Mas poderá dar sua opinião sobre se a regra de ouro nacional se ajusta ao tratado. Assim, respeitaremos a soberania nacional e a estabilidade da moeda.
- Não podemos fazê-lo dentro dos tratados existentes - afirmou Merkel, destacando a necessidade de "modificações estruturais" nos tratados da UE.
Os detalhes do acordo franco-germânico serão enviados por carta amanhã ao presidente do Conselho Europeu, Herman Van Rompuy, para que sejam discutidos numa cúpula com os demais sócios do bloco na sexta-feira em Bruxelas, encerrando uma semana crucial para a UE. Merkel e Sarkozy disseram que impulsionarão um novo tratado que obrigará os Estados a aprovar em suas Constituição um limite mais severo para o déficit orçamentário e para dívida - a regra de ouro - modificando a forma de governo para que os orçamentos nacionais fiquem mais equilibrados.
Mudanças propostas estão entre as mais radicais
As mudanças propostas estão entre as mais radicais desde que a Europa deu início a uma integração econômica, após o fim da Segundo Guerra Mundial (1939-1945). Elas farão com que os Estados deixem sua soberania econômica subordinada à disciplina coletiva determinada pelos tecnocratas de Bruxelas.
- Queremos ter certeza de que os desequilíbrios que levaram a zona do euro à situação atual não ocorram novamente - afirmou Sarkozy. - Por isso, queremos um novo tratado, para deixar claro aos povos da Europa que as coisas não podem continuar como estão.
França e Alemanha querem que a reforma, que permitiria de forma indireta que o Tribunal de Justiça europeu vigie e multe os países que não cumprirem tais exigências, esteja pronta para ser ratificada por cada país em março. Para respeitar o calendário eleitoral francês a eventual aprovação do tratado ocorreria após o pleito presidencial, em julho.
Ainda que Paris e Berlim não excluam a ampliação do tratado para toda a UE, acreditam ser mais factível e realista limitá-lo aos 17 países do euro.
- Preferimos um acordo a 27 - disseram Merkel e Sarkozy. - Mas estamos prontos para aprová-lo entre os 17 países do euro, deixando-o em aberto para os que também quiserem se unir.
A chanceler alemã também destacou que as bases do pacto foram "consultadas" com os demais membros da UE. Já o presidente francês foi o encarregado de anunciar os seis pontos que pretende aprovar.
O primeiro é o reforço das sanções para os que desrespeitarem o limite de déficit público de 3% do PIB. Quem não cumprir, será castigado pelo Tribunal de Justiça europeu, a não ser que uma maioria qualificada de 85% opte pelo contrário.
O segundo é uma "regra de ouro reforçada e harmonizada", em que cada país deve vigiar para que orçamento nacional se ajuste ao tratado.
O terceiro elemento é uma mensagem ao setor privado, aos mercados: o calote grego jamais voltará a acontecer.
França cede e diz não a eurobônus
O quarto prevê que o lançamento do mecanismo de Estabilidade Financeira - de ajuda a países em dificuldade - será antecipado de 2013 para 2012. As decisões serão tomadas por uma maioria qualificada de 85%. Hoje, são definidas por 80%.
De acordo com o quinto ponto, o conselho de chefes de governo e de Estado será economicamente responsável pela zona do euro. E durante toda a crise, ele se reunirá mensalmente. Na ordem do dia, estarão sempre "a competitividade e o crescimento", segundo palavras de Merkel. Este ponto, desejado pela França, representa um golpe para a Comissão Europeia, o órgão executivo do bloco.
O sexto e último ponto refere-se à confiança na independência do Banco Central Europeu, não havendo comentários sobre suas atividades.
Para chegar ao pacto anunciado ontem, França e Alemanha cederam. Assim, ambos se mostraram "absolutamente de acordo que os eurobônus não são uma solução para a crise" . Os eurobônus eram defendidos por Paris e rejeitados por Berlim.
- Mutualizar a dívida agora não faz sentido - afirmou o presidente francês. - França e Alemanha contribuiriam para pagar a dívida dos outros sem poder controlar suas dívidas.
Já a chanceler justificou a opção de um novo tratado com dois elementos: "a urgência de recuperar a confiança na viabilidade da zona euro" e a "necessidade de fazer modificações estruturais e jurídicas".
(*) Com "New York Times" e agências internacionais