Título: Nas mãos de Dilma
Autor: Astrini, Marcio; Adario, Paulo
Fonte: O Globo, 06/12/2011, Opinião, p. 7

Desmantelar o Código Florestal é uma das maiores ambições da bancada ruralista no Congresso há muito tempo. Historicamente, a sanha contra a lei de florestas sempre encontrou obstáculos, seja pela difícil justificativa para o grande público, dada sua óbvia falta de nobreza, seja pela reação que o tema causava no governo federal, temeroso do prejuízo político com a opinião pública nacional e internacional. Mas, no governo Dilma, as coisas mudaram.

O plano ruralista começou a prosperar quando seus autores decidiram importar, de outro público, a justiça que lhes faltava. O truque foi esconder a anistia a grandes criminosos ambientais, a facilitação ao desmatamento e a diminuição da proteção florestal atrás da foto do agricultor familiar e do necessitado rural, verdadeiros merecedores de tratamento especial na lei. Assim, o embuste para sustentar o discurso estava armado. Mas faltava o principal: furar a histórica barreira do Executivo.

O que prometia ser o maior problema revelou-se como a parte mais fácil. No Planalto, a batalha anticódigo encontrou uma apatia e logo passou a festejos entre governo e ruralistas. O texto do "novo" Código foi reprovado por diversos segmentos da opinião pública. Juristas apontam-lhe ilegalidades e agressões à Constituição. A ciência o coloca no rol dos potenciais causadores de desastres ambientais. Em recente nota, a CNBB o avalia como "opção por modelo de desenvolvimento que desrespeita limites".

As críticas não estão na tratativa dispensada a pequenos e pobres agricultores, ou no sadio desejo de regularizar propriedades produtivas. Tais iniciativas são bem-vindas e necessárias. O problema do texto encontra-se onde o benefício para a regularização é tamanho que esfacela as regras gerais, ofertando descontos à lei por meio de critérios sem justificativas, a ponto de igualar reais merecedores àqueles que destruíram florestas apostando na impunidade. Baseado no enfraquecimento da legislação, seu triste saldo não apresenta qualquer ganho para a preservação ambiental e transforma o que ontem era desmatamento criminoso em um grande negócio.

A presidente Dilma deverá receber um texto recheado de más intenções e que colocará à prova suas promessas de campanha, sua palavra empenhada em vetar anistia a desmatamento e os compromissos internacionais já assumidos.

MARCIO ASTRINI é coordenador da campanha do Código Florestal do Greenpeace. PAULO ADARIO é diretor da Campanha Amazônia do Greenpeace.