Título: Um avanço na tentativa de salvar o euro
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Fonte: O Globo, 10/12/2011, Opinião, p. 6
AUnião Europeia, um projeto geopolítico iniciado no pós-guerra, tem muitas datas relevantes na sua história. Ontem, incluiu entre elas 9 de dezembro de 2011, ao conseguir, depois de longa noite e madrugada de negociações, a adesão quase absoluta dos 27 membros do bloco ao Pacto de Estabilidade e Crescimento. O acordo, em torno de uma espécie de Lei de Responsabilidade Fiscal, com fixação de limites para dívida e déficit públicos, com a previsão de punições para os relapsos, é indiscutível vitória de Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, nesta ordem.
A chanceler alemã resistiu até o fim, e, em algum momento, contra o próprio Sarkozy, a propostas de ajuda aos países problemáticos - além de Grécia, Espanha, França, Portugal e Irlanda -, sem maiores exigências de contrapartida de controle fiscal. Manteve-se firme, Sarkozy aderiu - até porque a França passou a ser vista como candidata também à insolvência -, e a dupla de líderes da zona do euro, Alemanha e França, conseguiu a adesão quase unânime ao pacto - importante para sinalizar ao mercado a intenção firme de uma ação coordenada e constante no continente para equilibrar as contas públicas. É o primeiro passo para que a zona do euro venha a ser, do ponto de vista fiscal, algo semelhante a um país. Falta muito, mas é o início.
David Cameron, o "eurocético" primeiro-ministro inglês, única voz discordante, foi o grande derrotado. Ele não aceita a possibilidade de haver regulações no sistema financeiro dentro do pacto. Um dos centros financeiros mundiais, o país teme decisões no setor. Mas, assim, a Inglaterra se isolou na comunidade. Do ponto de vista prático, não afeta o pacto, porque o país não faz parte do euro, mantém a própria moeda, a libra. Mas é negativo do ponto de vista político haver uma dissidência do tamanho da Inglaterra. Surge o risco de "duas Europas".
Houve acordo entre os 17 membros da zona do euro. Dos nove membros da UE restantes, Hungria, República Tcheca e Suécia aderiram no final do encontro, enquanto Dinamarca, Letônia, Polônia, Lituânia, Romênia e Bulgária primeiro consultarão os respectivos parlamentos.
O Pacto é a transformação dos parâmetros do Tratado de Maastrich, de 20 anos atrás, em metas compulsórias. Assim, o déficit público máximo de 3% do PIB e o limite de 60% do PIB para a dívida pública terão de ser perseguidos para valer, sob pena de penalidades, suspensas apenas em votação com quórum qualificado dos estados-membros. Há, ainda, à frente um longo trabalho de detalhamento de como o pacto funcionará na vida real. Enquanto isso, existem ameaçadores problemas do cotidiano. O acordo lança bases para o médio e o longo prazos, com inegáveis reflexos no curto. Embora os mercados tenham dado demonstrações de algum otimismo, existem problemas de solvência urgentes a serem administrados, mesmo que o BC europeu haja reduzido os juros básicos para 1%.
Como se fosse para alertar a reunião de cúpula de Bruxelas, ontem mesmo a agência de risco Moody"s rebaixou a avaliação dos maiores bancos franceses (Société Generale, BNP Pariba e o Crédit Agricole). No encontro, anunciou-se a confirmação em dez dias de mais 200 bilhões para aumentar o calibre da ajuda do FMI. Mas ainda existem incertezas na administração do dia a dia. A UE, no entanto, começou a criar condições para, enfim, poder dar certo como um bloco de moeda única.