Título: No Pará, desânimo na reta final do plebiscito
Autor: Carvalho, Cleide
Fonte: O Globo, 09/12/2011, O País, p. 14
Nas ruas, é fraco o clima de campanha; militantes separatistas agora estão divididos sobre a criação de Carajás
BELÉM. Belém chega à reta final do plebiscito para a divisão do estado do Pará, marcado para domingo, sem clima de campanha. O feriado de Nossa Senhora da Conceição, comemorado ontem, deixou a cidade vazia. Nas ruas, há um clima de cisão entre os defensores da criação de Carajás e do Tapajós. Militantes afirmam que a população da Região Metropolitana de Belém, apontada como o fiel da balança nesse plebiscito, consegue compreender a criação do estado Tapajós por causa da longa distância até a capital e por razões históricas, mas não aceitam a ideia de separar Carajás, onde estão os grandes projetos de mineração da Companhia Vale do Rio Doce.
Entre os panfletos distribuídos perto da estação rodoviária da capital, alguns mostram o Pará dividido em apenas dois: o próprio Pará e Tapajós, sem Carajás. "Fique à vontade para decidir o que achar melhor. Mas, se tiver dúvidas sobre a possibilidade de escolher votar somente para a criação do estado de Tapajós, saiba que isso é possível", diz o folheto.
Entre Belém e Santarém, quatro dias de barco
Há, de fato, quem concorde apenas com a criação de Tapajós, como o funcionário público Damião Simão, que se ressente das longas distâncias entre Belém e Santarém, possível capital de Tapajós. Para ir, é preciso fazer uma viagem de barco que dura quatro de dias. Já o caminho de volta, por causa da correnteza, leva três dias.
- Meu trabalho exige visita a outros municípios. Um dia, eu estava em Salvaterra, no Marajó. Um homem estava passando mal há mais de 24 horas, e o ônibus não passava na estrada de terra. O local ficava a 30 km do centro da cidade. Nosso carro, que tinha tração, foi o primeiro a aparecer, e uma menina veio nos chamar e pedir para levá-lo ao hospital. Levamos, mas ele morreu no caminho. Tinha apenas 55 anos. Se no Marajó, que é mais perto, é assim, imagine no Tapajós - relatou Simão.
Acuados numa capital que, segundo as pesquisas, rechaça a ideia de dividir o Pará em três e considera oportunista a criação de dois novos estados, os defensores do "sim" à criação do Tapajós e de Carajás realizaram juntos, durante todo o dia de ontem, uma vigília ecumênica na Praça do Operário, em frente à estação rodoviária. Padres católitos e pastores evangélicos se revezaram no microfone para rezar, cantar e conclamar as pessoas a apertarem o número 77 na urna eletrônica. O 55 corresponde ao voto para que o Pará não seja dividido.
- Há muito ressentimento no povo de Belém. Em determinado momento, a campanha ficou muito agressiva. Sequer conseguimos distribuir panfletos. Fizemos um ato ecumênico para mostrar que queremos uma campanha de paz. Hoje é dia de Nossa Senhora - disse Socorro Pena, professora da Universidade Federal do Oeste do Pará, que ficará no estado do Tapajós, caso a tese separatista saia vencedora.
O maior empenho dos envolvidos na campanha a favor de Tapajós, ontem, era viabilizar transporte para que os moradores dos municípios mais distantes pudessem iniciar a viagem para votar no domingo. Na avaliação da Frente Pró-Tapajós, na região, o voto é, em maioria, 77, mas o sonho pode ser enterrado pelos escolha da Região Metropolitana de Belém.
A campanha pelo "não" à criação dos dois estados também mantém as ruas em silêncio. No shopping Boulevard, um quiosque vendia, anteontem, camisetas com a bandeira do Pará a R$10, além de camisetas e bottons. Poucas pessoas paravam para olhar.
- Eu sou contra, as pessoas estão representando interesses de fora, de pessoas que não são paraenses. Temos que deixar o estado do tamanho que está. O governo tem que trabalhar para dar condições às pessoas que moram nesses municípios e jamais dividir o estado. Temos riquezas, muita coisa boa a ser usufruída, mas não por outras pessoas - afirmou Edilson Barbosa, também funcionário público.
"Sabemos que o problema é de gestão"
Laura Almeida, assistente social e militante da causa contra a divisão do Pará, diz que os argumentos não convencem e, por isso, é melhor deixar como está.
- Não conseguiram um critério que me convença para mudar o estado. Sabemos que o problema é de gestão. Dividir não vai tornar melhor ou ter avanço significativo - avaliou.
Segundo representantes dos comitês contra e a favor da criação dos dois estados, a campanha estava sendo feita ontem com carros de som em bairros da periferia de Belém e em cidades mais distantes.