Título: A crise nas cidades
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 15/12/2011, Economia, p. 31

"Commodities" em queda frearam a alta da participação de municípios médios no PIB

Fabiana Ribeiro, Mariana Durão, Paulo Justus e Aloysio Balbi

Ao derrubar os preços das commodities no mercado internacional, a crise financeira global de 2008 e 2009 - iniciada com a quebra do banco Lehman Brothers - afetou diretamente o desempenho das cidades brasileiras que dependiam da venda de matérias-primas, especialmente agrícolas e minerais. Tanto que, em 2009, Campos dos Goytacazes, no Estado do Rio de Janeiro, que tem a economia sustentada pelo petróleo, foi a cidade que mais perdeu participação no Produto Interno Bruto (PIB, conjunto de bens e serviços produzidos no país) nacional: de 1% em 2008 para 0,6% em 2009. Também sofreu os efeitos da turbulência financeira a cidade de Vitória, no Espírito Santo. Afetada pelos preços em baixa do minério de ferro, a fatia da capital capixaba no PIB saiu de 0,8% para 0,6% de um ano para outro, conforme o PIB dos municípios, divulgado ontem pelo IBGE.

Campos e Vitória são o retrato da mudança provocada pela crise na distribuição da riqueza do país. Os dados mostram que a tendência de ganho de participação das cidades médias (de 100 mil a 500 mil habitantes) foi interrompida. Em 2008, representavam 28,2% do PIB, para, em 2009, caírem para 27,4%. Já as cidades com mais de 500 mil habitantes viram sua presença evoluir de 41,8% para 42,7%. Ainda assim, as cidades médias aumentaram sua cota no PIB em 1,3% na última década. Já a participação das maiores minguou em 3,1%. A expectativa, a despeito da nova turbulência global, é que municípios de médios voltem a elevar seu peso no PIB.

- As economias das cidades sentiram os reflexos dos preços em queda de commodities minerais e agrícolas. As cidades menos dependentes do mercado externo e com produção para o mercado doméstico foram as menos atingidas - disse Sheila Zani, técnica do IBGE, citando ainda a perda de participação de Macaé no PIB nacional (de 0,4% para 0,2%).

Municípios de Minas perdem por café

Segundo José Cezar Castanhar, professor da Fundação Getulio Vargas (FGV), o levantamento do IBGE é um ponto fora da curva, num efeito claro da depressão global. Mas, com a recuperação da cotação das commodities, o desempenho das cidades médias deve melhorar no ano seguinte.

- Não se pode esquecer, porém, que muitos investimentos se concentram nas cidades maiores. Especialmente com a Copa e Olimpíadas - disse Castanhar, acrescentando que as cidades médias, geralmente mais conectadas com o mundo externo e às commodities, são mais vulneráveis a crises econômicas.

O economista Ranulfo Vidigal, mestre em Políticas Públicas e Desenvolvimento pela UFRJ, acredita que o cenário de retração do PIB de Campos em 2009 já estaria se invertendo:

- O ano de 2009 foi o auge da crise americana e o barril de petróleo na cotação em real teve queda de 31%. Mas Campos se manteve bem colocado, inclusive no setor da indústria, ficando na frente de cidades importantes como Betim e Guarulhos.

A lista de cidades que perderam espaço com a crise segue em direção aos municípios paulistas de Barueri, Guarulhos, São Bernardo do Campo e Santos e, ainda, Betim (MG). A perda foi causada por retrações na indústria, comércio e, no caso de Barueri, em função do ganho de participação de São Paulo.

Em Barueri, a fabricante de embalagens Jaguaré viu seus pedidos despencarem na época, principalmente por causa dos efeitos da crise nas indústrias de autopeças e eletrônica.

- A indústria vinha numa evolução boa em 2008 e a crise pegou todo mundo despreparado. Cortamos 15% dos funcionários - diz Eder Regis Marques, gestor da empresa.

Vilã para a maioria, a derrubada de preços de petróleo e minério ajudou alguns municípios, como Duque de Caxias. A cidade abriga a Refinaria Duque de Caxias (Reduc) e, com a redução nos custos das matérias-primas, elevou a participação no PIB de 0,6% para 0,8% de 2008 para 2009.

- Diante da crise, o governo tomou medidas para preservar emprego e crédito que favorecem mais as cidades maiores - disse Sheila.

Entre as cidades menores, perderam posição no ranking de participação no PIB os municípios mineiros de Albertina (da posição 3.554 para 5.162) por causa da queda do comércio atacadista do café, Catas Altas (de 1.423 para 3.018) pela queda no valor da produção do minério e Prudente de Morais (de 2.488 para 3.645) pelo recuo na produção de cal e gesso, e o fechamento de empresa ligada à produção de ferro. Mas houve avanços, como em Monções (de 4.502 para 1.818), Brejo Alegre (de 4.334 para 2.373) e Borá (de 5.037 para 3.679), graças à produção de açúcar e álcool.