Título: O melhor caminho
Autor:
Fonte: O Globo, 19/12/2011, Opinião, p. 6
TEMA EM DISCUSSÃO: Imposto sobre fortunas
O Brasil tem uma das mais elevadas cargas tributárias do mundo - 36% do valor de tudo o que é produzido vão para os cofres do Estado. É recorde no bloco das nações emergentes, mas a caça ao dinheiro do cidadão continua. O Estado brasileiro já gasta quase 40% do PIB - portanto, mais do que arrecada, e por isso a dívida pública não para de crescer -, e como o céu parece o limite há quem no Executivo e no Legislativo tenha obsessão por criar novos impostos. Afinal, a propensão ao gasto é uma tendência firme desde a estabilização da economia, em 1994. Seja com FH ou Lula, a carga de impostos não parou de ficar mais pesada. Mesmo quando não se criam gravames ou se elevam alíquotas, a modernização constante da máquina arrecadadora, cada vez mais informatizada, consegue manter a coleta tributária em ascensão, à frente da inflação.
Os objetivos alegados para se apertar o torniquete no bolso do contribuinte são sempre muito defensáveis. Combate à pobreza, redução das desigualdades de renda e, sempre, a saúde pública. Esta chegou a ter um imposto específico, a CPMF, e nem por isso melhorou de qualidade. O dinheiro entrava no caixa único da União e desaparecia, como costuma acontecer. Até que o Senado, em 2007, acabou com o imposto - e nem por isso o sistema público de saúde ficou pior.
Tentou-se ressuscitar a CPMF sob o disfarce de CSS (Contribuição Social para a Saúde). Não conseguiram, e a ideia naufragou de vez com a aprovação da regulamentação da Emenda 29 sem ela. A obsessão por mais impostos, porém, permanece. Agora, a tentativa é de ressurreição do imposto sobre "grandes fortunas", volta e meia acenado como fonte promissora de financiamento dos lépidos gastos públicos.
Numa visão rasteira, nada mais justo do que taxar donos de enormes patrimônios e transferir o dinheiro para enfermarias superlotadas e hospitais mal aparelhados do SUS.
A volta do imposto na versão "contribuição" é uma iniciativa no campo tributário destinada ao fracasso, pois taxar patrimônio, dessa forma, é inócuo. Os ingleses socialistas do século XIX tentaram. Não deu certo, a ponto de a Inglaterra ter suprimido o gravame. Mas como "taxar fortunas" é politicamente correto e tem longa história no campo das esquerdas, o imposto entrou na Constituição de 1988.
Mas, desde que o senador Fernando Henrique Cardoso apresentou um projeto de regulamentação, nada de novo aconteceu. Até surgir a tentativa atual de uma "contribuição", eufemismo de imposto, mas com vantagens para a União, que não precisa compartilhá-lo com estados e municípios.
Há vários problemas com este imposto. Um é o custo de arrecadação. Por ser um imposto declaratório, é necessária custosa máquina de fiscalização, porque o risco de evasão é grande. O "lucro" da taxação tende a encolher, até um dia em que se descobre que o Estado gasta mais na fiscalização do que a cifra arrecadada. Foi assim que muitos países abandonaram o imposto, além da Inglaterra. Outro aspecto é o incentivo à corrupção. Como se trata de um gravame dependente da fiscalização, o poder do fiscal é enorme. Inclusive para vender facilidades.
Grandes beneficiários do imposto são os países que não o adotam, para onde são transferidas parte ou toda fortuna de quem se sente ameaçado pela taxação. Dinheiro brasileiro irá criar empregos, gerar renda em outros recantos do planeta. Certeiro tiro no pé. Isso porque deseja-se evitar o melhor caminho: aplicar com eficiência os muitos bilhões já destinados ao SUS.