Título: A chance contra a Tuberculose
Autor:
Fonte: O Globo, 19/12/2011, Opinião, p. 7

HÉLIO MAGARINOS TORRES FILHO

De todas as doenças que afetam a humanidade, a tuberculose é uma das mais antigas e também a que mais desafia médicos e pesquisadores. Diferentemente de outras doenças, não possui nenhum tipo de vetor intermediário, como acontece através do mosquito na malária e na dengue. É completamente incalculável a quantidade de vítimas que a doença fez e continua a fazer em todo o mundo, entre as quais, poetas como Castro Alves, Casimiro de Abreu, Manuel Bandeira, além de artistas, grandes médicos e cientistas, que perderam a vida ao estudá-la.

Após ser introduzido no corpo humano, o Mycobacterium tuberculosis pode permanecer em estado de latência por muitos anos, manifestando-se como doença apenas quando ocorre algum desequilíbrio que afeta os mecanismos de defesa.

Estima-se que uma pessoa infectada seja capaz de contaminar pelo menos dez outras, dependendo do período entre o início da doença e o recebimento da medicação adequada. Dentre as pessoas contaminadas, apenas duas em cada dez desenvolvem doença ativa. Calcula-se que um terço de toda a população mundial se encontre infectado pelo bacilo da tuberculose e que, a cada segundo, ocorra um novo caso.

O Brasil, apesar de ter apresentado progressos em relação à diminuição de novos casos, ainda figura entre os 22 países detentores de 80% de todos os casos do mundo, ocupando a décima nona posição (quanto maior a posição, melhor). O Ministério da Saúde anunciou que houve redução na taxa de novos casos entre 2008 e 2010, o que representa aproximadamente 3 mil novos casos a menos no período; na quantidade de casos totais, a doença ainda representa um grave problema de saúde pública, atingindo cerca de 38 a cada 100 mil pessoas. Há 20 anos, esta mesma taxa era de 56 casos a cada 100 mil habitantes.

A tuberculose é a terceira maior causa de morte por doenças infecciosas e a primeira entre pacientes com Aids. O Estado do Rio de Janeiro ocupa a primeira posição no Brasil em número de casos: 71,8 a cada 100 mil habitantes. A favela da Rocinha é a campeã de incidência de tuberculose no país. A taxa de incidência da doença na comunidade é de 300 por cem mil habitantes, enquanto que a de toda a capital é de 90 por cem mil e a do país, 33 por cem mil.

Pelo fato de ser transmitida de pessoa para pessoa, através de tosse ou espirros, a principal arma para o combate à doença é o diagnóstico precoce. Entretanto, o diagnóstico laboratorial vem desafiando médicos e pesquisadores. Uma das principais dificuldades recai no fato de que o agente causador da doença apresenta características que fazem com que o resultado definitivo do teste possa levar até 45 dias, tempo suficiente para que ocorra a transmissão da doença para outras pessoas.

Há cerca de dois anos, foi lançado nos Estados Unidos um novo método diagnóstico considerado uma poderosa arma para o combate à doença. O moderno exame (GeneXpert) traz vantagens em relação aos testes até então disponíveis e requer procedimentos manuais mínimos, fornecendo resultados em menos de 2 horas. Além de indicar a presença ou não do bacilo da tuberculose, o exame aponta se pode se tratar de uma cepa resistente a mais de duas drogas. Um estudo publicado no “New England Journal of Medicine” destacou que é possível detectar 90% dos casos de tuberculose em amostras de escarro. O governo brasileiro anunciou o início de estudos e a instalação de equipamentos em hospitais, laboratórios e unidades de atendimento à saúde. Com esta poderosa arma nas mãos temos, finalmente, depois de vários anos, uma grande oportunidade para reduzir a incidência da doença, não apenas no Brasil, mas mundialmente, já que o diagnóstico rápido, logo no início da doença, é a melhor forma de evitar a disseminação.

HÉLIO MAGARINOS TORRES FILHO é presidente da Sociedade Brasileira de Patologia Clínica no Rio e diretor médico do Laboratório Richet.